O Cada Minuto está nesta semana apresentando uma série de cinco matérias produzidas pelas graduandas em Comunicação Social – Jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal) Larissa Fontes e Laura Teresa Barbosa. A série integra Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) composto por reportagem sobre a homofobia em Alagoas.
Nesta quinta (22), na quarta matéria da série, o leitor poderá o leitor poderá conferir depoimentos de algumas vítimas alagoanas. O TCC é orientado pelo Prof. Msc. Clayton Santos.
Homofobia em AL: casos chocam a população
Nada justifica um assassinato, principalmente quando é cometido por puro preconceito. Com um crescente número de homicídios de homossexuais, Alagoas tem alguns crimes que ganharam uma repercussão maior na mídia, porque além de serem crimes com muitos requintes de crueldade, as vítimas eram pessoas que por algum motivo tinham destaque diante da sociedade.
Uma tragédia mundial em Coqueiro Seco – O caso Renildo
O primeiro desses crimes teve repercussão internacional e aconteceu na cidade de Coqueiro Seco. Em 20 de janeiro de 1993, o vereador Renildo José dos Santos assumiu-se bissexual em algumas rádios; diante do ocorrido, dias depois, a Câmara Municipal suspendeu suas atividades por um prazo de trinta dias, alegando que ele estava praticando atos incompatíveis com o decoro parlamentar.
Terminado o período de suspensão, Renildo não foi readmitido e teve que pleitear ordem do juiz para que pudesse reassumir. Sentindo-se ameaçado, enviou um ofício à Secretária de Segurança Pública de Alagoas solicitando proteção de sua vida.
Contudo, na madrugada de 10 de março, Renildo foi arrancado de sua casa e sequestrado por quatro policiais e inimigos políticos. Levado para um local ermo, Renildo foi vítima de uma das mais cruéis sessões de tortura. Após ser violentamente espancado, teve suas orelhas, nariz e língua decepados, as unhas arrancadas e depois cortados os dedos. Suas pernas foram quebradas. Ele foi castrado e teve o ânus empalado. Levou tiros nos dois olhos e ouvidos e, para dificultar o reconhecimento do cadáver, atearam fogo em seu corpo e degolaram-no. O corpo foi encontrado no dia 16 de março. A cabeça, separada, estava boiando num rio.
Treze anos mais tarde, aconteceu o julgamento do crime. Nele, foram considerados culpados o fazendeiro José Renato Oliveira e Silva, o militar Luiz Marcelo Falcão (hoje capitão da PM) e o ex-militar Paulo Jorge de Lima.
Em homenagem a Renildo, foi instituído, em março de 2001, pelo GGAL em parceira com o Fórum Permanente Contra a Violência e a Articulação de Jovens de Alagoas, o Prêmio Renildo José dos Santos de Direitos Humanos, que tem por objetivo agraciar várias personalidades destaques na luta pela preservação dos direitos humanos.
Crime contra o celibato – O assassinato do Padre de Murici
Outro caso que chamou a atenção da sociedade alagoana foi o assassinato do padre Hidalberto Henrique Guimarães, pároco da Igreja Nossa Senhora das Graças, em Murici. O corpo de Hidalberto foi encontrado em sua casa em Maceió, no bairro do Tabuleiro do Martins, com facadas e golpes a pauladas.
Dois rapazes foram acusados do crime. De acordo com o depoimento de um deles, Rafael Timóteo da Silva, 19, depois de beberem cerveja num bar, o padre lhe teria oferecido R$ 15 para que fizesse um programa. Daí teria havido discussão, seguida de luta corporal e do assassinato. Antes de deixarem a cena do crime, os dois rapazes furtaram um aparelho DVD e um tênis pertencentes ao padre, em seguida, os dois teriam ido para casa, no bairro de Ponta Grossa, em um ônibus.
De acordo com a necropsia, no corpo do padre havia cerca de 20 golpes de arma branca, além de vários hematomas, que podem ter sido ocasionados por briga corporal ou tortura. Além disso, os assassinos ainda teriam tentado degolar a vítima. A brutalidade choca ainda mais.
Ganhador do Miss Gay é morto logo após premiação
Jovem de 19 anos, Osvan Inácio dos Santos residia na cidade de Arapiraca, e na noite do dia 15 de setembro de 2007, ganhou o título de Miss Gay da cidade. Após o evento, Osvan deveria voltar para a casa de um amigo, mas não o fez; os amigos estranharam sua falta, mas achando que ele teria saído com alguém, não se preocuparam.
Na manhã do dia 16, os amigos receberam a notícia de que um corpo havia sido encontrado num local deserto. O laudo cadavérico verificou que a vítima havia sido violentada sexualmente e espancada até a morte - antes de morrer, ela sofreu traumatismo craniano -, além disso, constatou também que havia ferimentos em seu órgão genital. De acordo com testemunhas, Osvan foi abordado por dois homens, no momento em que saía do Bar Flamenguinho, mas ninguém sabia a identidade deles.
O integrante do grupo Sohmos LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Travestis, Transexuais e Transgêneros), da cidade de Arapiraca, Claudenir Martins, afirma que, segundo o delegado, Cícero Torres, o caso de Osvan foi tratado como crime comum e engavetado.
Modelo mata designer – A morte de Flavius Lessa
Um dos mais recentes casos que chocou a sociedade alagoana foi o assassinato do designer Flavius Durval Lessa Braga, de 47 anos, em 04 de março de 2011. Encontrado dentro de seu carro, nas proximidades da fábrica da Coca-Cola, no bairro do Benedito Bentes, o corpo apresentava um corte no pescoço.
As primeiras indicações seriam de que ele teria sofrido um golpe de faca, mas posteriormente - quando o modelo Frederico Safadi, 19, assumiu a autoria do crime – constatou-se que o golpe foi deferido com uma lata de refrigerante.
Fred Safadi, como era conhecido no mundo da moda, contava com a produção artística de Flavius, e estava em constante ascensão nesse meio. Além da relação profissional, os dois mantinham um relacionamento amoroso e o crime, segundo informações do advogado de Fred, teria sido motivado pelo fato da vítima querer divulgar o relacionamento, caso Fred tentasse terminá-lo, bem como, arruinar sua carreira.
No dia do crime, Fred contou com a ajuda do filho de seu padrasto. O menor teria asfixiado a vítima, usando o cinto de segurança do veículo, enquanto Frederico desferia nela um corte com uma lata de refrigerante amassada. O réu confesso, que teve a prisão decretada poucos dias depois do assassinato, encontra-se preso até hoje; já o menor, foi encaminhado ao juizado da infância.
Além desses quatro famosos casos, existem outros que também chocam e mostram à sociedade que isso não é algo distante da realidade alagoana. Contudo, parte dos casos que acontecem com pessoas de alguma notoriedade, muitas vezes não entra nas estatísticas de crimes homofóbicos, isso porque as vítimas não tinham assumido sua orientação sexual publicamente e os familiares, mesmo sabendo de sua homossexualidade, acabam negando-a diante das autoridades responsáveis pelo caso, prejudicando o rumo das investigações.
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