Pedro, o Gari, ainda emociona

25/03/2013 13:42 - Geral
Por Candice Almeida

Há pouco mais de um ano fui ao Hemoal, como de costume, doar minha bolsa de sangue para contribuir com o período da Semana Santa, quando os estoques normalmente ficam mais baixos por causa da alta demanda que períodos de feriado prolongado acabam acarretando.

Enfim...

Amanhã faz exatamente um ano que Pedro Bernardo foi atropelado por um motorista bêbado nas primeiras horas da manhã de uma segunda-feira. No dia 26 de março de 2012, Pedro estava trabalhando, como gari, recolhendo o lixo das casas e prédios na Av. Dona Constância, quando foi atingido por um carro em alta velocidade e foi imprensado contra os fundos do caminhão de lixo.

Pedro teve sua perna esquerda amputada, a direita por muito pouco e até hoje ainda não pode colocar sua prótese porque a perna direita continua com os “parafusos” e não pode suportar o peso do corpo de Pedro com uma prótese por muito tempo.

Soube do caso por meio da televisão mais de uma semana depois, e uma amiga – Luciana Beserra – me perguntou se não poderíamos fazer uma campanha de doação de fraldas para o gari. O programa de tv disse que havia necessidade de fraldas e que pela gravidade do acidente ainda não havia previsão de alta.

Era noite do dia 5 de abril, véspera da semana santa, quando recebemos a primeira doação. Sequer havíamos começado a campanha e a primeira doação chegou por meio do twitter. Numa mensagem privada, uma personalidade política me disse que poderia dor o equivalente a mais de 20 pacotes de fraldas, a pessoa não quis se identificar, mas deu ânimo à ideia.

Na mesma hora divulguei que já havíamos recebido aquela oferta e daí por diante a solidariedade só aumentou, foi incrível. Começou uma corrida de pessoas a nos procurar para fazer suas doações porque no dia seguinte já viajaríam e nós – Lua e eu – gostaríamos de visitar Pedro na manhã do dia seguinte que já era “quinta-feira santa”.

Como pretendido estivemos no Hospital do Açúcar bem cedo e cheias de doações. Conhecemos Pedro e Genivaldo, cunhado, e só depois a Carminha chegou, esposa. A família é de União dos Palmares, Pedro só vinha a Maceió para trabalhar e Genivaldo, irmão de Carminha, mora em Maceió e acabou sendo o esteio deles nesse momento tão difícil.

Aliás, a dedicação e abnegação de Genivaldo, Patrícia e suas filhas foi lindo e inspirador, coisa para aprendermos e jamais esquecermos.

Daí para frente a campanha só cresceu, as doações vieram de todos os lugares, Pedro ganhou de tudo, cama especial, cadeira de rodas, cadeira para banho, fraldas, material de higiene, material para limpeza e troca de curativos, roupas, alimentos e carinho, muito carinho. Pedro sempre agradeceu muito a todos que o ajudaram, a campanha que começou com duas ganhou o reforço de uma multidão.

Nunca achamos que fosse fácil mobilizar pessoas para ajudar um desconhecido, mas surpreendemente a ajuda para Pedro veio muito naturalmente, inclusive dinheiro foi doado, pessoas que não tinham tempo ou não sabiam o que comprar mandavam dinheiro, e tudo foi revertido para eles, no início compramos o que faltava, mas depois passamos a dar-lhes o dinheiro porque Pedro era o provedor e por conta do acidente não podia mais trabalhar, todo o trâmite até que fosse amparado pela previdência levou um tempo e o dinheiro foi essencial para a família.

O tempo foi passando, Pedro sempre demonstrou sua determinação e garra, surpreendeu os médicos e técnicos da saúde por sua capacidade de resignação e de recuperação, em pouco tempo já conseguia sair da cama para a cadeira de rodas, desta para a cadeira de banho e tudo o que lhe fosse possível para incomodar o mínimo possível.

Pedro nunca aparentou tristeza ou revolta, muito pelo contrário, dizia querer ficar bom logo para poder doar o que lhe foi doado à mais. Visitá-lo era uma alegria, acompanhar sua recuperação e sua força de vontade era inspirador. Pedro e Carminha voltaram para União e veem duas vezes por semana para Maceió, para fazer o tratamento na Adefal, há todo esse tempo nunca soube de Pedro ter esmorecido e perdido a fé. Acabamos nos distanciando naturalmente, muito trabalho por aqui e ele em outra cidade, mas as ligações acontecem e eu estou devendo uma visita a ele na Adefal.

E é interessante como sempre que nos falamos Pedro é o mesmo querido, fala pausada, baixa e clara, contrastando com a espontaneidade e extroversão de Carminha, e ambos dão sempre notícias e querem saber de todos por aqui, em especial os que iam até a casa de Genivaldo, enquanto estiveram por aqui, todos são citados nominalmente – Verinha, Yuri, Aline...

Falta pouco para Pedro, enfim, tirar os “parafusos” da perna direita e poder usar sua prótese de forma definitiva, mas nada disso teria sido possível sem a ajuda de todos que foram solidários e abnegados, que foram abertos às dores de um desconhecido, que assumiram sua responsabilidade social, enquanto seres humanos, superando os limites impostos pela correria do dia a dia e pelos parcos recursos financeiros doando o pouco que lhe era possível.

Até hoje me surpreendo com tudo o que foi possível através das redes sociais e que ultrapassou todos os muros do virtual para se transformar em doações reais, em relacionamentos reais e em gratidão real.

Agradeço por mim, por Lua, por todos que se envolveram pessoalmente, mas principalmente por Pedro e Carminha, que se não fosse cada um dos gestos e orações que receberam teriam tido um caminho muito mais difícil a percorrer.

Nesta terça Pedro deve vir a Maceió – Adefal –, quem quiser vê-lo poderá ir até lá no período da manhã, eu, infelizmente, continuarei devendo minha visita, estarei trabalhando no interior, mas recomendo aos que precisam se reenergizar, e de um ótimo exemplo de superação e de generosidade, que o conheçam.

 

O caso

Pedro Bernardo foi atropelado por João Paulo. Logo após o atropelamento uma equipe de televisão chegou ao local e filmou a prisão do acusado em flagrante, por conta de sua desenvoltura em frente às câmeras ficou conhecido como "João Painho", ele ficou preso por alguns dias mesmo com fiança arbitrada.

João Paulo nunca ajudou Pedro. Algum tempo depois e diante de toda repercussão que o caso alcançou ainda ligou para a família de Pedro, mas sua forma grosseira e pouco educada de abordar Pedro e a família acabou fazendo com que tudo fosse tratado com o advogado.

João Paulo continua respondendo pelo processo em liberdade, chegou a ser preso outra vez por causa de problemas com a irmã e o sobrinho, mas por conta desse atropelamento não.

 

Doação

Ah, por que comecei esse texto falando da minha doação de sangue? Porque coincidentemente Pedro e eu temos o mesmo tipo sanguíneo, somos “O+”, e há a possibilidade real de Pedro ter recebido sangue meu, antes mesmo que eu o conhecesse ou soubesse que nossos caminhos se cruzariam. Depois do acidente ele foi levado para o Hospital Geral do Estado (HGE) e só depois, por intervenção de um benfeitor, conseguiu sua tranferência para a área do SUS do Hospital do Açúcar, como faço minhas doações prioritariamente no Hemoal e o sangue de lá vai prioritariamente para o HGE, gosto de pensar que meu sangue pode ter ido para ele. =)

E você, já fez sua doação? Aproveite que o Hemoal está em campanha para a Semana Santa e doe o que lhe sobra, doe o que não lhe faz falta, doe sangue, doe vida...

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