Alagoas: Dos capangas aos "justiceiros", duas décadas de crimes cometidos por “policiais”

26/06/2011 17:45 - Josivaldo Ramos
Por Redação
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por Josivaldo Ramos

A história recente de Alagoas é marcada por crimes, impunidade e a ligação intrínseca de agentes do poder constituído com o crime organizado. O blog do Josivaldo Ramos apresenta um breve retrospecto das últimas duas décadas de crimes em Alagoas, resgatando a memória de crimes emblemáticos, elencando alguns dos maiores criminosos do estado, além de destacar organizações criminosas formadas, sempre, com a participação efetiva de autoridades, quando não do próprio Estado.

“Vultos” do crime

Cabo Gonçalves – José Gonçalves da Silva Filho, ex-cabo da Polícia Militar de Alagoas, foi expulso da Polícia Militar de Alagoas por envolvimento em crimes por encomenda. Cabo Gonçalves foi assassinado em 1996, próximo a um posto de combustíveis, na Via Expressa, na periferia de Maceió. Ele foi executado com vários tiros de pistola e metralhadora. Antes de morrer, quando esteve preso, Gonçalves acusou o Coronel Cavalcante de realizar vários crimes, a mando do deputado João Beltrão e outros políticos do Estado.

Cabo Ferreira ou Ferreirinha– Assim nominado o policial José Carlos da Silva Ferreira, ex-escrivão da policial Civil do Estado de Alagoas, considerado como o primeiro líder do grupo de extermínio Ninjas de União, é suspeito de envolvimento no homicídio do tributarista Sílvio Viana, além de ser um dos responsáveis pela “guerra da policia civil”, onde vários policiais, também envolvidos em crimes, foram executados. Cabo Ferreira foi assassinado em dezembro de 2004, com 12 tiros de pistola 380, quando saía da faculdade, na Vila Redenção, localidade conhecida como “Bolão”, no Bom Parto. Embora o inquérito tenha chegado à justiça, o mesmo não trás nenhum acusado do crime, na descrição do réu está: Autor desconhecido. A polícia alega que não havendo flagrante do crime, nem testemunhas oculares, com capacidade de reconhecer os assassinos, é impossível identificar os mesmos, justamente por conta do envolvimento da vítima com incontáveis crimes.

Fininho – Assim chamado o franzino Policial Militar Emanuel Guilhermino da Silva, considerado um dos maiores assassinos da história de Alagoas, aquém se atribui a participação em mais de 120 homicídios, conhecido como um dos braços armados do deputado estadual João Beltrão, foi assassinado em 2007 em um posto de combustíveis, no Bairro do Prado, em Maceió, poucos meses após ter deixado o Presídio Baldomero Cavalcante. Até hoje o inquérito não foi remetido à justiça. A polícia não tem aquém atribuir o crime, justamente pelo possível envolvimento da vítima em uma diversidade de crimes.

Capitão Rocha Lima – nascido Antonio Marcos da Rocha Lima, o oficial da Polícia Militar de Alagoas, segundo informações divulgadas pela própria PM-AL, em 18 anos de Policia Militar o Rocha Lima, já respondeu a 20 procedimentos administrativos, a seu desfavor, sendo entre estes 03 Conselhos de Justificação, por motivos que vão de estupro, desordens em locais públicos, associação ao tráfico e extorsão, a determinações judiciais da 17ª Vara Criminal, por formação de quadrilha. A assessoria da PM aponta que o capitão já passou mais de 90 dias na prisão, além de que freqüenta lugares impróprios para um oficial de polícia, acompanhado de pessoas associadas a prática de crimes.

Coronel Cavalcante – Manoel Francisco Cavalcante, ou simplesmente Cavalcante é considerado o maior arquivo vivo do estado de Alagoas, atribui-se a ele a liderança da chamada gangue fardada, acusada de vários crimes, desde roubo de cargas a assassinatos nas décadas de 80 e 90. Cavalcante ficou 14 anos preso fora de Maceió e passou por pelo menos dois episódios, onde quase morreu dentro da penitenciária. O ex-coronel acusou os deputados estaduais Antônio Albuquerque e João Beltrão (que teve a prisão decretada pela justiça) e também o ex-deputado federal Francisco Tenório da autoria intelectual do assassinato do cabo Gonçalves.

Cabo Luiz Pedro – Famoso por, supostamente, incentivar invasões de loteamentos, Luiz Pedro foi nomeado policial em 1993, contudo “deixou” a polícia e ingressou na política, gozou de afastamento eleitoral por ter sido eleito deputado estadual em 2003 e vereador por Maceió em 2009, atribui-se a Luiz Pedro diversos homicídios ocorridos nas regiões habitadas sob as invasões lideradas por ele. Contudo é o assassinato do servente Carlos Roberto Rocha dos Santos que mais pesa contra o Cabo; isto porque, o pai da vítima manifesta publicamente e por diversas vezes que foi o, hoje parlamentar, que assassinou seu filho.

Casos emblemáticos

Caso Ricardo Lessa - Delegado da polícia Civil do Estado de Alagoas, Ricardo Lessa era irmão do ex-governador Ronaldo Lessa e na época do crime era o diretor do Departamento de Polícia da Capital (Depoc). Conta a história que o delegado Ricardo Lessa, responsável pelo combate inicial a “gangue fardada” teria mandado um recado ao então coronel Cavalcante. Pouco tempo depois veio à reação: o delegado foi metralhado praticamente na porta de casa quando se dirigia a seu automóvel. Ricardo Lessa foi morto em 9 de outubro de 1991, em Bebedouro. No mesmo atentado, também foi assassinado o policial civil Antenor Carlota, que era segurança de Lessa. Recentemente a justiça de Alagoas julgou a revelia dois ex-policiais.

Caso PC Farias – Paulo Cesar Farias era considerado o maior conhecedor dos esquemas de corrupção que levaram ao impeachment de Collor e apontado pela Polícia Federal como o responsável pela movimentação de dezenas de contas no Exterior abastecidas pelo “propinoduto” instalado no governo federal. Em 23 de junho de 1996, dias antes de depor em uma CPI que investigava a relação de empreiteiras com o Palácio do Planalto, PC e sua namorada foram mortos na casa do empresário na praia de Guaxuma, litoral de Maceió. Policiais militares do estado de Alagoas, que na época do crime eram seguranças de PC irão a júri popular 15 anos após o crime. (fonte: Revista Isto É).

Caso Silvio Viana – O coordenador de Arrecadação Tributária da Secretaria da Fazenda de Alagoas foi morto com vários tiros no dia 28 de outubro de 1996, em Ipioca, Maceió-AL. A seguir um trecho da Revista Isto É de 2006: “O assassinato de Sílvio Viana é um caso emblemático da impunidade e da fragilidade das instituições do Estado”, disse a ISTOÉ o juiz Marcelo Tadeu. “O Garibalde é a última testemunha viva.” Garibalde afirma que os ex-soldados conhecidos como Fininho e Cigano, hoje presos por outros crimes no quartel da PM de Alagoas, foram os verdadeiros matadores do fiscal Sílvio Viana. Os dois outros pistoleiros responsáveis, os policiais Ferreirinha e Valter, foram assassinados. “Queima de arquivo”, crava Garibalde. Ele dá o nome de outro delegado que manda matar em Alagoas. “Quem praticava os crimes sob orientação do Cavalcante era a equipe do delegado Valdir de Carvalho.”

Caso Dimas Holanda – O bancário Dimas Holanda foi assassinado em uma rua do Conjunto Santo Eduardo, em Maceió no ano de 1997. Segundo informações veiculadas na imprensa Dimas Holanda teria sido assassinado após o deputado João Beltrão descobrir que a vítima estava tendo um caso com uma suposta amante do parlamentar, Clécia de Oliveira, ex-miss União dos Palmares (AL). Beltrão não foi inicialmente denunciado pelo Ministério Público, porém na época já havia indícios do envolvimento do deputado. A denúncia inicial aponta que os autores materiais Eufrásio Tenório Dantas, “Cutita”, Daniel Luiz da Silva Sobrinho, Paulo Nei, Valdomiro dos Santos Barros, José Carlos Silva Ferreira, o “Ferreirinha” e Valter Dias Santa Filho, o “Valter Doido” foram recrutados pelo deputado estadual para matar o bancário. Eles teriam usado um veículo de propriedade do parlamentar para executar a vítima.

Caso Taine – “Em 30 de agosto de 2007, aos 12 anos, José Alexystaine Laurindo (Taine) foi perseguido, algemado, levou coronhadas, posto em um camburão e torturado física e psicologicamente por um delegado, dois guardas municipais e quatro policiais civis na delegacia da cidade Matriz de Camaragibe (Alagoas) porque foi consertar a corrente de sua bicicleta com uma pedra. Jogando-a aleatoriamente, acertou o carro da guarda municipal. O Ministério Público de Matriz de Camaragibe isentou um policial civil e o delegado, por falta de provas. Dois dos policiais conseguiram, em acordo entre Ministério Público e a Justiça da cidade, uma transação penal: pagamento de um salário mínimo, dividido em duas parcelas, pelo crime. A acusação de tortura recaiu sobre dois policiais- julgados e condenados em abril de 2011.” (Transcrição do blog Alagoas, deixa a paz em mim – Jornalista Odilon Rios)

Caso Johnny Wilter – Johnny Wilter da Silva Pino, um jovem estudante universitário, natural de União dos Palmares, encontrava-se na carona de uma motocicleta, em 25 de maio de 2008, quando o condutor, possivelmente inabilitado para conduzir o veículo, tenta furar uma suposta blitz policial. O comandante da suposta blitz policial dispara duas vezes contra os jovens, atingindo fatalmente Johnny Wilter; em sua defesa o Capitão Eduardo Alex alega que os jovens dispararam contra sua guarnição. A suposta arma utilizada pela vítima nunca foi encontrada. O caso ganhou repercussão nacional; o oficial tem conseguido procrastinar ao máximo a realização do júri popular. Defensores dos direitos humanos classificam o crime como execução sumária, já a defesa alega estrito cumprimento do dever legal; em meio às teses encontra-se uma família de luto e que luta.

Tortura de pedreiro em União – Na periferia de União dos Palmares, 10 de junho de 2010, um pedreiro, Antônio dos Santos, 48 anos, possivelmente embriagado, ouvia músicas em alto volume, a polícia é chamada para conter o pedreiro, policiais excedem na medida, torturam e o matam, depois compram um caixão e entregam a família alegando que a o mesmo foi vítima de morte natural. O caso ganhou repercussão em todo estado; a família da vítima realizou diversas manifestações em frente ao 2º Batalhão da Polícia Militar; durante o velório, a família conduziu o corpo pelas ruas da cidade, parando em frente à delegacia, sede do 2º BPM e até adentraram o Fórum da cidade em clamor por justiça. Dias depois quatro PMs foram presos, Militão Sapucaia da Silva Junior, José Teixeira de Siqueira, Marco Antônio Francisco Silva e Hemerson Gouveia Modesto de Alves. Contudo um ano após o crime ninguém mais está preso e o processo encontra-se parado há cerca de quatro meses.

Organizações criminosas

Gangue Fardada – Assim ficou conhecida uma organização criminosa que atuou em Alagoas nas décadas de 80 e 90, sob o comando de figuras políticas; atribui-se a “gangue fardada” os mais diversos crimes: assassinato, sequestro, extorsão, assalto a banco, roubo de cargas, entre outros delitos. Contudo são os crimes de encomenda, executados por policiais como forma de repressão a quem tentasse impedir os interesses políticos dos mandantes da “gangue fardada”, que mais repercutiram. Entre os policiais envolvidos destacam-se: ex-coronel Manoel Francisco Cavalcante (Acusado de liderar o grupo), tenente Silva Filho, cabo Cícero Felizardo (Cição), cabo Everaldo Pimentel (pai de Eloá Pimentel) e cabo Daniel de Oliveira.

Ninjas de União – Grupo de extermínio com atuação na zona da mata alagoana, formado na década de 90, por policias do 2º Batalhão da Polícia Militar do estado de Alagoas, se auto intitulavam como justiceiros, pois iniciaram em União dos Palmares uma série de matança de pessoas com reiteradas passagens policiais. Contudo foi no final da última década do século XX que o grupo ficou conhecido internacionalmente, quando desembarcou no Brasil a enviada da Organização das Nações Unidas (ONU) para assuntos relacionados a execuções sumárias, a Paquistanesa Asma Jahangir, que em seu relatório final sobre execuções sumárias no Brasil descreveu a atuação dos Ninjas de União na chacina de quatro jovens no Bairro Roberto Correia de Araújo em União dos Palmares. Este caso também é mencionado no Relatório Final da CPI da Pistolagem no Nordeste, que além deste caso, fez ainda um histórico dos crimes atribuídos ao grupo. São suspeitos de integrar o grupo: Soldado Eraldo Tadeu Vieira dos Santos, Soldado Fernando Gomes de Lima Filho, Soldado Sandro Jorge da Silva, Cabo Valdir, Tenente Antônio Batista Neto entre outros.

Este é o retrato de um estado onde a segurança pública nunca foi levada a sério, onde os interesses políticos sempre se sobressaíram aos interesses sociais. Um estado, onde nota-se a ausência de organizações criminosas, como é o caso de estados do sudeste brasileiro, a saber, Comando Vermelho, Primeiro Comando da Capital, entre outros. Por aqui, a sociedade teme, principalmente, os bandidos da lei, aqueles a quem se deve recorrer quando o cidadão é vítima.

Entretanto com o envolvimento tão arraigado de policiais com o crime organizado, aquém se deve recorrer? Nosso povo roga à “Padim Cíço” e continuam a crucificar Jesus Cristo: “aconteceu porque Deus quis”.

Meu twitter: @JosivaldoRamos
 

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