“Não dá mais para fazer aquelas feiras grandes como antes, para durar o mês todo. A gente vai contornando, sabe? Vai trocando de marca também. Às vezes tem uma marca boa que a gente gostava, mas não dá mais para comprar. E assim a gente vai levando… fazer o quê, né?”, diz a aposentada Joelma Silva, de 57 anos.
Ela também contou à reportagem que há meses tem ajustado sua rotina de compras para caber no orçamento apertado. No armário, só entra o que falta — e ainda assim, após alguma espera.
Com os preços dos alimentos básicos subindo a cada semana, fazer compras se tornou um desafio em Maceió. Em um supermercado da parte alta da capital, os carrinhos estão mais vazios, consumidores percorrem as prateleiras comparando preços e o som dos beeps no caixa é frequentemente seguido por um suspiro de alívio ou resignação.
“A carne foi o que mais subiu. Mas a gente continua procurando alternativas mais baratas… Já faz um tempo que venho observando com calma. Pesquiso nos supermercados, pego o que está com o preço mais acessível”, reclama a servidora pública Silvânia Cavalcante, de 52 anos, que tem ajustado suas compras à realidade dos preços altos.
Embora ainda mantenha sua rotina de compras sem grandes alterações, a servidora reconhece que muito precisa mudar. “Valorização do salário e estabilidade nos preços. Isso poderia melhorar muita coisa”, afirma.
Já a também aposentada, Maria Lúcia, de 58 anos, também se acostumou a deixar produtos nas prateleiras quando os preços assustam. “Quando vejo que está mais caro, eu não compro. Deixo ali. Espero baixar e depois volto. O salário que a gente ganha não dá nem para comer bem. A gente compra o básico do básico.”
A sensação de que a conta não fecha se espalha pelos corredores dos supermercados alagoanos. E, embora cada consumidor tenha sua própria estratégia para lidar com os aumentos, há um ponto em comum entre todos: a rotina de compras está mudando.
A antiga prática de fazer a feira do mês está sendo substituída por idas rápidas, compras pontuais e listas mais enxutas. Os cálculos agora exigem mais cuidado e, muitas vezes, sacrifício.
Inflação dos alimentos: um desafio para as famílias brasileiras
No cenário nacional, a inflação dos alimentos continua a pressionar o orçamento das famílias. Em março de 2025, o preço dos alimentos subiu 1,17%, contribuindo para que a inflação do mês fosse a maior para março em 22 anos.
O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou alta de 5,48% nos últimos 12 meses. A alimentação dentro de casa foi a principal responsável por esse aumento, com destaque para o encarecimento do ovo de galinha (+13,13%), do tomate (+22,55%) e do café moído (+8,14%).
Para muitas famílias, comprar carne virou um luxo. Levar a marca preferida de café ou óleo tornou-se uma exceção. A famosa cesta básica, que deveria garantir o mínimo de segurança alimentar, tem se tornado cada vez mais inacessível.
Enquanto os preços continuam a subir, as soluções parecem cada vez mais distantes. Entre as alternativas apontadas pelas consumidoras, estão desde o congelamento de preços até propostas mais estruturais, como o aumento salarial e o controle da inflação.

Alta no preço do ovo e do café reflete impactos climáticos e crises sanitárias
O aumento expressivo nos preços de produtos como o ovo e o café tem preocupado consumidores não apenas em Maceió, mas em todo o país, especialmente os de menor renda. Segundo o economista, consultor e professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Francisco Rosário, esses dois itens representam um exemplo claro de como fatores externos — como mudanças climáticas e crises sanitárias — influenciam diretamente o mercado interno brasileiro.
“O ovo era a proteína da população de mais baixa renda. Quando o preço sobe muito, o impacto é enorme”, afirma. Ele lembra que, além de ser uma alternativa à carne, o ovo passou a enfrentar obstáculos que afetam sua oferta e, consequentemente, elevam o valor final para o consumidor.
O especialista explica que parte dessa alta se deve à crise da gripe aviária nos Estados Unidos, que dizimou o plantel de galinhas poedeiras no país. “Eles estão importando ovo do Brasil, e isso faz com que o nosso preço suba. Não é que a gente não consiga produzir, a gente produz, mas a demanda externa pressiona o mercado interno”, destaca.
Outro fator que influencia negativamente a produção é o estresse térmico nas aves, causado pelas altas temperaturas. “A produção de ovo também caiu porque as galinhas estão estressadas e produzem menos por conta do calor”, aponta o economista, relacionando o fenômeno ao agravamento das mudanças climáticas.
No caso do café, o cenário é semelhante. Segundo Rosário, o produto também sofreu com os efeitos climáticos em países concorrentes. “O Vietnã, que é o segundo maior produtor mundial, teve quebra na safra, e todo mundo veio comprar café do Brasil”, explica. Essa pressão internacional sobre a produção nacional contribuiu para a elevação dos preços nos supermercados brasileiros.
A situação, de acordo com o professor, é especialmente delicada para as famílias de baixa renda. “Quem substituía carne por ovo hoje se pergunta: vai substituir o ovo por qual produto?”, questiona.

Custo da alimentação em Maceió é um dos mais altos do Nordeste
Se alimentar em Maceió — seja em casa ou fora — continua pesando no bolso dos moradores. A avaliação é do economista Francisco Rosário, que atribui o alto custo a uma combinação de fatores estruturais e econômicos que impactam desde o campo até o consumidor final.
“Na verdade, o alimento em Alagoas a gente sempre paga mais caro”, afirma. Segundo ele, o custo elevado atinge tanto as compras nos supermercados quanto as refeições em restaurantes, especialmente na região central da cidade.
“A alimentação dentro de casa é cara por causa dos preços no supermercado. Já a alimentação fora, particularmente na parte baixa da cidade, fica mais cara devido ao encarecimento dos serviços e à pressão do turismo”, explica.
De acordo com Rosário, o aumento da demanda turística eleva significativamente os preços nos estabelecimentos. “Comer fora em Maceió é caríssimo, está entre os mais caros do Nordeste”, pontua.
Já no consumo doméstico, o problema está na dependência externa. “Nosso Ceasa é quase totalmente abastecido por produtos de fora. Mais de 80% dos alimentos in natura que consumimos são importados”, destaca. Apesar do potencial agrícola da região metropolitana, a produção local é limitada.
“Temos áreas que poderiam ser aproveitadas, mas a cana-de-açúcar e o eucalipto dominam. Falta uma política agrícola estadual. Quase todas as ações vêm do governo federal”, critica o economista. Essa ausência de incentivo à agricultura encarece o abastecimento, pois obriga o estado a importar alimentos de outras regiões.
“O impacto no custo de vida é muito maior do que os 1,09% apontados por alguns indicadores. Como não produzimos, o custo de trazer esses produtos para cá é muito mais alto do que em estados como Pernambuco, que tem produção própria de tomates, frutas e outros itens”, observa.
Com essa dependência de estados vizinhos como Pernambuco, Sergipe e Bahia, os preços acabam inflacionados pela logística, transporte e falta de autonomia alimentar. “Isso pesa — e pesa muito — no bolso do consumidor”, acrescenta.
Apesar de supersafra, queda nos preços pode não chegar ao consumidor
A recente supersafra colhida até março trouxe uma expectativa de alívio no preço de alimentos como feijão, arroz e carne. Esses produtos já começaram a apresentar queda nos valores no atacado, movimento confirmado pelo Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM). “Quando o IGPM começa a baixar, é sinal de que tem entrada de safra no mercado”, explica o economista.
Segundo ele, o recuo de preços no atacado está ligado diretamente ao aumento da oferta provocado pela safra, mas esse alívio pode não chegar com a mesma intensidade ao consumidor final em Maceió. O motivo é a estrutura de comercialização na capital alagoana, que depende fortemente de produtos de fora.
“O problema é esse: Maceió importa tudo”, afirma Rosário. Além disso, ele destaca que os agentes da cadeia de distribuição podem usar esse momento para recompor margens de lucro. “Cada um quer ganhar, é capitalismo, mercado livre, e infelizmente a vida é essa.”
Na prática, isso significa que mesmo com a queda registrada no atacado, os preços nos supermercados e feiras podem permanecer altos ou cair menos do que o esperado. “O recuo no atacado pode não repercutir em Maceió justamente por conta da cadeia de comercialização, que importa tudo e pode recuperar margem aí no meio”, completa.
Consumidor precisa recorrer à pesquisa para economizar
Em um cenário de alimentos caros e variações frequentes nos preços, a principal estratégia para o consumidor alagoano é simples, mas fundamental: pesquisar. É o que orienta o economista ao comentar as alternativas para enfrentar o custo elevado da alimentação em Maceió.
“Pesquisa é o único caminho que o consumidor tem para aproveitar uma promoção e tal, para sobreviver nesse cenário”, afirma. Ele destaca que o ato de comparar preços, seja em supermercados físicos ou por meio de ferramentas digitais, pode fazer uma grande diferença no bolso.
Uma das recomendações do economista é o uso do site e aplicativo Economiza Alagoas, iniciativa da Secretaria da Fazenda do Estado de Alagoas (Sefaz/AL) que disponibiliza pesquisas de preços atualizadas de diversos produtos. “Tem o site da Fazenda, aquele Economiza Alagoas, que já faz uma pesquisa de preços sobre os produtos, para a pessoa não sair de casa e já ter uma visão”, explica.
Rosário reforça que, embora a pesquisa não resolva a estrutura de encarecimento dos alimentos no estado, ela é uma ferramenta de proteção ao consumidor no dia a dia. “É isso: pesquisa. É a estratégia que resta diante de um cenário em que tudo pesa no orçamento”, finaliza.
*Estagiária sob supervisão da editoria
Foto de capa: Laura Gomes/CadaMinuto