Sessenta e um anos depois, e o país não consegue avançar no debate sobre golpe de Estado e democracia. Por aí. A ditadura inaugurada em 31 de março de 1964 ainda rende bate-boca, controvérsia e impasse institucional. A novidade no aniversário deste ano é que a pauta golpe militar nunca esteve tão na ordem do dia, com o julgamento de Bolsonaro e aliados no STF. Ontem e hoje, golpistas não desistem.
Historicamente, a turma das Forças Armadas sempre comemorou a data. É como se tudo aquilo tenha sido um grande feito em defesa das garantias democráticas. É como dizem patriotas na política alagoana – os milicos livraram o Brasil da “ditadura comunista”. A mesma piada segue sendo repetida nos salões da extrema direita.
Lembro do ódio que filmes recentes despertaram na alma pacifista de “conservadores”. Antes de Ainda Estou Aqui, a história de um guerrilheiro, Marighella, causou indignação entre os cidadãos de bem. A adesão ao bolsonarismo disseminou a estupidez que é festejar um governo baseado na violência, na tortura e no assassinato de opositores.
Fizemos a chamada transição pacificadora. Politicamente nas cordas, a última gestão dos militares – com João Figueiredo presidente – era a imagem da decadência. O grande acordo foi a saída para todos os lados. Voltam os exilados da esquerda, incluindo os que foram à luta armada, enquanto a tropa governista, de generais a torturadores, ganha a impunidade. Não foi lá grandes coisas. As consequências estão na praça até agora.
Ao longo desses 40 anos de redemocratização, o Exército e demais forças seguiram firmes com a versão heroica do golpe de 64. Todo ano, velinhas acesas, bolo caseiro e guaraná para festejar o autoritarismo, a censura e a matança de brasileiros. Revisão crítica dos fatos? Isso daí é coisa de comunista, reagem bandoleiros de ontem e de hoje.
E o que dizem o presidente Lula e o governo do PT? Melhor não dizer nada. É assim que o chefe do Planalto e os ministros se portam neste 31 de março, numa estratégia de “acalmar os ânimos”. Fica difícil. Grave mesmo é a formação nas escolas militares. Enquanto não houver mudança radical no currículo e nos métodos de ensino, já era.
Não se modifica uma alma golpista do dia pra noite. Nos bancos da sala de aula, sim, é possível mexer nas estruturas. Para homenagear o óbvio, a educação é o caminho perfeito para essa mudança necessária. Nas academias de formação militar, jovens em começo de carreira recebem lições criminosas. Golpe e democracia não combinam.