Imagino que você também já deve ter se indagado como e por que torcedores peruanos, uruguaios, paraguaios, chilenos, bolivianos e até argentinos manifestam sincero racismo em relação aos brasileiros, tratando-nos por macacos (já revelei aqui que sou apaixonado pelos grandes primatas, a quem considero superiores).

Sim, o questionamento é plausível e necessário, levando em conta que esses povos da América do Sul também são vítimas da xenofobia por causa, entre outras coisas, da descendência dos povos originários -  indígenas de várias etnias - e dos negros africanos escravizados.

Uma estupidez, não é não? Pois é:  o "acusador" senta no bancos dos réus, mas tão logo sai de lá aponta o dedo para o outro, este sim o verdadeiro inferno - nos lembraria Sartre. Mas bem sabemos qual espécie animal é a mais estúpida e destrutiva. Pior: não parece disposta a melhorar nunca, salvo quando está na mira da lei.

É o caso, me parece, de lembrar o pensador italiano Umberto Eco (1932-2016), que nos alertou, em um ótimo ensaio sobre a intolerância (Cinco escritos morais), que a elite cria as bases do preconceito, mas “quem o pratica é o povo”. O mais, creio, é idealismo tolo e cegueira voluntária.

Andando em nosso vasto território nacional, de tantas belezas e criações artísticas raras e sofisticadas – inclusive populares –, nos deparamos com nordestinos que revelam aos berros ou sutilmente o racismo brutal e puramente ignorante (como todo o racismo) de uma gente que desconhece qualquer princípio biológico sobre cor/inteligência/adaptação/capacidade. Não esqueçamos que os habitantes da nossa região são xingados por muitos populares - ou não - de estados mais ricos, embora não mais civilizados. E olha que o Nordeste tem livrado o Brasil de algumas terríveis tragédias - políticas, inclusive.

Julgar-se superior a alguém por causa de alguns pares de genes que tratam da aparência, e é isso o que ocorre, revela tão somente a preguiça de pensar e a renúncia à razão. Se o racista soubesse como se construiu a espécie humana e ainda assim mantivesse o mesmo ponto de vista, de rejeição do diferente, haveria de, por livre e espontânea vontade, se trancar numa jaula para xingar livremente o resto do mundo (embora eu sei que ele haveria de preferir as redes sociais, onde encontrará tantos iguais).

Não podemos esquecer nunca que o primeiro de todos os preconceitos, que nasceu nas cavernas onde habitavam nossos antepassados mais remotos – e muitos não deveriam ter saído de lá –, é a misoginia, esse mal que ainda perdura e que enxerga a mulher como um “ser inferior” (nos países do Oriente Médio a situação é de terror, desesperadora). 

Dói ouvir isso, o que por aqui ainda se repete em algumas igrejas que pregam a igualdade entre os homens – mas só entre os homens, os machos e os machões. Incapazes, estes, de proezas que a biologia possibilita às mulheres, mas que nega aos do sexo masculino, mesmo os autocognominados “galos” e “barrões”.

A homofobia é um caso à parte, chamando ao debate um personagem que lida com os segredos da alma humana: Sigmund Freud. Ou você acredita que o ódio a gays, lésbicas e semelhantes/dessemelhantes não nasce onde o seu dono tem um medo mortal de mergulhar? Daí, gente, vale o tal do “Freud explica”:  basta que o empapuçado de ódio se olhe no espelho e pergunte:

- O que é que eu sou, o que é que eu sou, o que é que eu sou? 

Depois é ouvir a resposta. E se ela vier da coragem, o furioso de plantão pode se deparar com uma surpresa, que há de ser demolidora ou reparadora (por favor, evitar gestos tresloucados).  

Confesso que tenho até certa preguiça de tratar novamente desse tema em uma crônica domingueira. Fazer o quê? Deixo, no entanto, mais uma confissão: entendo e aceito mais os misantropos do que os racistas - estes acabam por justificar aqueles.