Seis décadas antes de Ainda Estou Aqui concorrer ao Oscar, houve o Cinema Novo. Um grupo de jovens operou a maior revolução da arte cinematográfica produzida no país. Na linha de frente desse time estavam Glauber Rocha, Arnaldo Jabor, Ruy Guerra, Joaquim Pedro de Andrade e o alagoano Carlos Diegues. Com “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”, a vanguarda encontraria o povo na aventura de transformar o Brasil. 

Além dos citados, outros diretores com trabalhos de peso são Roberto Pires, Paulo Cesar Saraceni, Leon Hirszman e Roberto Santos. A grande ironia do Cinema Novo, até hoje fruto de debates acalorados, é a distância do grande público. Os cineastas pretendiam “falar em nome do povo”, mas o povo não estava (e não está) nem aí para intelectuais decididos a libertar as massas de sua vasta ignorância. O marxismo dominava geral.

Depois da fase inicial, a turma do CN se desgarrou, cada um com seus projetos e estilos particulares. Cacá Diegues tem cerca de vinte filmes de longa-metragem. Os mais fortes estão em sua primeira década de produção. São desse período Ganga Zumba, A Grande Cidade e Os Herdeiros. Arrisco dizer que o último título do diretor que vale a pena conferir é Chica da Silva, de 1976. No papel da protagonista, Zezé Motta faz história.

Há um consenso de que Bye Bye Brasil, de 1979, seria a obra-prima do diretor. O filme tenta captar o país do fim dos anos 1970, a partir da história de uma trupe circense que roda o mapa de norte a sul. O problema é que a carta de intenções nunca aparece na tela com essa grandiosidade. As estripulias começam em Piranhas, nas paisagens do rio São Francisco, com José Wilker e Bety Faria em cenas de pouca originalidade.

Aliás, essa é uma das contradições de Cacá Diegues. Ele integra o núcleo duro de um movimento vanguardista, mas sua pegada sempre foi o convencional e a caretice. Na primeira etapa, ele parecia mais arrojado, mas seguiu na direção oposta. A partir da década de 1980, a coisa se complica. Filmes como Um Trem Para as Estrelas, Dias Melhores Virão e Veja esta Canção revelam um criador sem rumo, disparando a esmo.

Em 1999, Diegues apresenta Orfeu, mais uma releitura do mito que já rendera um filme décadas atrás. O cineasta ambienta a trama numa favela carioca, numa mistura de novelão da Globo com ares de superprodução. Nada funciona. Depois vieram Deus é Brasileiro (2003), O Maior Amor do Mundo (2006) e O Grande Circo Místico (2018). São três obras cheias de equívocos de um cineasta que, em 60 anos, andou para trás.

O último filme de Carlos Diegues ainda não chegou às telas. As filmagens terminaram, salvo engano, há uns três anos. Deus Ainda é Brasileiro revisita a mesma ideia, vinte anos depois. Pelo que o diretor falou do projeto, será muito mais do mesmo. De todo modo, o artista escreveu seu nome na história do cinema nacional. Como disse, na fase inicial é instigante pensar naqueles filmes e naquele Brasil que o CN levou às telas.