“Vai tomar um processo! Pode esperar”. Com variações nos termos e no estilo, esse é um aviso recorrente em vídeos no YouTube. Imagino que o mesmo deve ocorrer nas redes sociais. Nada de novo que uma arenga acabe virando disputa judicial. A novidade é o volume de casos. Todo mundo processa todo mundo. Marca do nosso tempo. Políticos, artistas, jornalistas, influenciadores – uma multidão de ofendidos cobra reparação.
A pancadaria generalizada, decorrente das diferenças políticas, abarrota as esferas da Justiça como nunca se viu em nossa história. Boa parte das ações envolve falas ofensivas durante entrevistas na internet. O que mais tem é confusão com declarações a podcasts. Na hora dos “argumentos” para atacar um adversário, fascismo e pedofilia se misturam numa saraivada de associações descabidas. Resultado? Mais um processo.
Quase todos os casos envolvem fatores subjetivos. Na literatura do juridiquês, acusação, defesa, Ministério Público e Judiciário gastam tempo e latim num debate sobre conceitos como honra e liberdade de expressão. No meio, as opiniões, de um lado e de outro, sobre censura e criminalização do direito ao livre pensamento. Na quase totalidade dos casos, alguém quer indenização por danos morais. Os valores vão de trocados a milhões.
Há também os episódios em que o suposto ofendido pretende nada menos que cadeia para o suposto agressor. Botar alguém na prisão pelo “crime” de manifestação verbal é caso sério. O que está em jogo não é apenas a encrenca com a “regulação das redes”. Antes, o mais importante nisso tudo é o exercício pleno da liberdade individual. É tênue o limite entre “responsabilidade” para regular veículos e censura prévia.
No trabalho, fui processado algumas vezes. Servidores públicos, delegados e empresários não gostaram de reportagens, notas e opiniões – e foram à Justiça contra mim. O caso mais recente se arrastou por cinco anos, de 2020 até semanas atrás, quando a ação foi encerrada por decisão de um juiz. O autor do processo foi um político, insatisfeito com textos publicados aqui no CM. Escrever livremente pode ser perigoso.