O aumento da insegurança no campus A.C. Simões da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), no Tabuleiro do Martins, em Maceió, tem intensificado o debate sobre a possível atuação da Polícia Militar (PM) na instituição. Enquanto parte da comunidade vê a medida como essencial para conter a criminalidade, outros alertam para os riscos à liberdade acadêmica e à autonomia universitária.
A discussão ganhou força após a suspensão temporária, no dia 30 de janeiro, das aulas presenciais em cinco cursos do Instituto de Ciências Humanas, Comunicação e Arte (ICHCA). Sendo eles: Relações Públicas, Filosofia, Biblioteconomia, Dança e Teatro. Outros quatro cursos de graduação e três de pós-graduação também fazem parte do instituto.
A suspensão foi provocada por relatos de episódios de violência e ameaças, supostamente ligadas ao tráfico de drogas dentro da universidade, o que levou à criação de uma comissão de segurança para buscar soluções para o problema.
Um dia após o anúncio da paralização das aulas, a Reitoria da Ufal divulgou, por meio de uma nota, as medidas adotadas após uma reunião com a direção do instituto, coordenadores de cursos e técnicos.
As ações incluem o aumento da segurança privada, a determinação de abertura e fechamento das salas por segurança privada, a flexibilização dos horários de expediente dos servidores e a inclusão do tema como ponto prioritário na primeira sessão do ano do Conselho Superior Universitário (Consuni) da Ufal.
Comissão amplia debate sobre policiamento no campus
A comunidade acadêmica se reuniu, no último dia 4 de fevereiro, em sessão extraordinária do Consuni para debater questões de segurança. O encontro contou com a presença de 50 conselheiros, entre eles representantes dos técnicos, estudantes e docentes.
Durante a reunião, foi formada uma comissão que ficará responsável por dialogar com as forças de Segurança Pública do estado em busca de soluções para os desafios no campus. A proposta recebeu ampla aprovação, com apenas dois votos contrários e uma abstenção.
Os integrantes da comissão, designados pelo Conselho, terão a missão de elaborar propostas e recomendações voltadas à prevenção e ao enfrentamento da insegurança dentro da Ufal. As sugestões serão encaminhadas ao Conselho que decidirá quais medidas serão adotadas.
O presidente da Associação dos Docentes da Ufal (Adufal), Jailton Lira, destaca que a criação da comissão garante a participação ativa de estudantes, professores e técnicos na elaboração de estratégias mais eficazes. “É fundamental compreender as particularidades de cada curso para que as decisões sejam realmente resolutivas. A comissão tem um papel essencial ao propor soluções concretas para essa questão”, afirma.
Adufal se opõe à presença da PM e defende autonomia universitária
No entanto, a Adufal se posiciona contra a atuação da PM no campus da instituição na capital alagoana, argumentando que a instituição possui um histórico de abordagens violentas em comunidades periféricas, e que a autonomia universitária, garantida pelo artigo 207 da Constituição Federal, permite que a própria universidade gerencie sua segurança.
No dia 31 de janeiro, a entidade publicou uma nota de repúdio contra a informação veiculada na imprensa local que acusa professores e alunos de consumirem e comercializarem entorpecentes dentro da instituição.“Graves acusações têm sido feitas envolvendo docentes e estudantes, ligando-os ao suposto motivo da falta de segurança no local. As informações caluniosas, pois não há qualquer comprovação do que está sendo veiculado, acabam intensificando a tensão e apreensão entre os membros da comunidade acadêmica”, afirmou.
O presidente reforça ainda que a Adufal apoia o policiamento preventivo nas imediações do campus, mas é contra a presença da PM dentro da universidade. “O problema da segurança não se restringe à Ufal, mas também afeta as comunidades vizinhas”, aponta.

SSP e PF divergem sobre atribuições no policiamento da Ufal
A responsabilidade pela segurança na Ufal tem gerado divergências. Inicialmente, a Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP-AL) afirmou que realiza policiamento nas imediações do campus, mas que a segurança interna é responsabilidade da Polícia Federal. No entanto, a PF contestou essa atribuição, alegando que a responsabilidade pela segurança cabe à Polícia Militar.
Em nota divulgada no dia 31 de janeiro, a Superintendência da Polícia Federal em Alagoas afirmou que a manutenção da ordem no campus é de responsabilidade da Polícia Militar e que não havia recebido nenhum comunicado oficial da Ufal sobre ocorrências criminais.
“A Superintendência da Polícia Federal em Alagoas esclarece que a manutenção da ordem pública no campus da UFAL é de responsabilidade da Polícia Militar e que não recebemos, até o momento, nenhum ofício da UFAL comunicando eventual prática criminosa em seu campus”, diz a nota da PF.
Por sua vez, a SSP-AL, no dia 30 de janeiro, reafirmou que o policiamento ostensivo ao redor da Ufal é realizado pelo 12º Batalhão de Polícia Militar, mas que a responsabilidade pela segurança interna cabe à Polícia Federal, dado que se trata de uma área federal.
"A Secretaria de Estado da Segurança Pública de Alagoas (SSP-AL) informa que o policiamento ostensivo no entorno do Campus Maceió da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) é realizado diariamente pelo 12º Batalhão de Polícia Militar. No entanto, reforça que a atuação dentro das dependências da universidade é de competência da Polícia Federal, uma vez que se trata de uma área federal.
A SSP-AL reafirma seu compromisso com a segurança da população alagoana e com a integração das forças policiais, visando à redução contínua dos índices de violência no estado.", afirmou a SSP.
Opinião dos estudantes: segurança ou vigilância excessiva?
A proposta da entrada da PM no campus divide opiniões entre os estudantes. Enquanto alguns acreditam que a medida pode ajudar a prevenir crimes, outros alertam para os riscos de abusos e repressão no ambiente acadêmico.
O impasse revela um dilema mais complexo — como conciliar a necessidade de segurança com a preservação da autonomia e do ambiente democrático universitário?
Para alguns, a presença policial oferece uma sensação de proteção diante da criminalidade, enquanto para outros, ela ameaça a liberdade acadêmica, podendo transformar o campus em um espaço de controle e repressão.
A estudante de Biblioteconomia, Camilla Gomes, considera necessário reforçar a segurança, mas se opõe à presença da PM no campus. “Colocar a PM para garantir a segurança dos alunos é, na verdade, torná-los ainda mais inseguros. Já houve casos de abordagens agressivas e até intimidação verbal contra estudantes que não tinham nenhum envolvimento com suspeitos”, relata.
A estudante de Letras – Português, Ingrid*, defende que a presença de militares pode agir como um fator preventivo contra crimes como assaltos e agressões. “A polícia é uma instituição pública e, como tal, deve estar presente onde for necessária, sem imposições ou restrições”, afirma.
O estudante de História e membro do Diretório Acadêmico de História Dirceu Lindoso (Dahis), João Victor, vê a proposta como uma tentativa de criminalizar os estudantes e o ambiente universitário.
Ele defende que a segurança no campus deve ser abordada de forma mais ampla, considerando fatores estruturais como iluminação, moradia estudantil e espaços de lazer. “A presença da PM nesse espaço intensifica as opressões contra os estudantes marginalizados, como os negros, pobres e LGBTs”, afirma.
Segundo o estudante, o diretório estudantil e outras entidades acadêmicas se posicionaram contra a presença da PM e um possível convênio com a SSP.
Estudantes protestam contra entrada da PM
No dia 3 de fevereiro, estudantes da Ufal realizaram um ato de protesto no campus A.C. Simões, em Maceió, se manifestando contra a presença da PM na universidade e exigindo transparência da reitoria sobre a situação. O protesto foi motivado pela repercussão de relatos envolvendo ameaças, tráfico de drogas e episódios de violência que impactaram o ICHCA.
Durante o ato, dezenas de estudantes ocuparam o restaurante universitário com cartazes e entoando palavras de ordem. Entre as mensagens, estão frases como: “Vocês preferem dar ouvido às nossas vozes ou perpetuar o silêncio dos reitores?”, “A reitoria não se importa com o ICHCA” e “Polícia Militar não é segurança”.
Suspensão das aulas e insegurança; veja linha do tempo
No dia 17 de janeiro, o Diretório Acadêmico do curso de História foi comunicado sobre um problema que estaria impactando o funcionamento da secretaria do ICHCA. No entanto, foi somente no dia 20 de janeiro, data prevista para o retorno das aulas e o início da semana de recepção dos calouros, que os estudantes se depararam com o bloco fechado.
Em 22 de janeiro, o Conselho do Instituto convocou uma reunião extraordinária para esclarecer o fechamento do bloco. Durante a reunião, uma professora relatou que servidores técnicos e membros da diretoria têm sofrido ameaças e intimidações de homens desconhecidos.
No dia 30 de janeiro, as aulas presenciais foram suspensas para cinco cursos do ICHCA, sendo eles Relações Públicas, Filosofia, Biblioteconomia, Dança e Teatro.
No dia 4 de fevereiro, a comunidade acadêmica se reuniu, durante sessão do Conselho Universitário (Consuni). Na reunião, foi formada uma comissão com a tarefa de iniciar um diálogo com as forças de Segurança Pública do estado, visando encontrar soluções para os problemas de segurança no campus.
Os membros da comissão, escolhidos pelo Consuni, serão responsáveis por desenvolver propostas e recomendações focadas na prevenção e no combate à insegurança. As sugestões elaboradas serão submetidas ao Conselho, que determinará as ações a serem implementadas.
A próxima reunião do Consuni está prevista para esta terça-feira (11), quando a comissão de segurança apresentará suas primeiras propostas. A comunidade acadêmica segue mobilizada, acompanhando de perto as decisões que definirão o futuro do ICHCA e a política de segurança da UFAL.
*Nome fictício
*Estagiária sob supervisão da editoria