Quem viveu já um pouco mais, e é o meu caso, há de entender que a publicidade no Brasil já teve tempos bem melhores. Embora eu veja cada menos televisão, incomodo-me bastante ao me deparar com gritos e algaravias, masculinos, femininos ou indefinidos, vendendo alguma coisa pela telinha.
Claro que não atribuo esse momento, daquela que já foi a propaganda mais premiada do mundo, só aos publicitários, que, dura realidade, têm de entregar aquilo que o público pede ou está acostumado. Tem muita gente boa na profissão, amordaçada pelo padrão desses tempos de agora. É aquela história: manda quem pode…
Há de se dizer que a mesma “crise” se instalou na MPB, mas não por falta de compositores de qualidade ou de intérpretes, apenas e tão somente por causa do “mercado”, que tem uma relação de reciprocidade canina com o público – em qualquer tempo ou lugar -, num processo de retroalimentacão. E aí: obedece quem tem juízo.
Se você cresceu ao som de Tom Jobim (símbolo da geração de grandes artistas que ele criou com Vinicius de Moraes), não deve se sentir à vontade para revelá-lo ou para cobrar mais: corre o risco de ser considerado um chato ou um pedante. Aceito as duas sentenças, até para não discutir desnecessariamente.
Dito isso, eis um pouco mais do meu currículo profissional: fui publicitário, numa grande agência local, durante cinco anos, até chegar à conclusão de que eu não era do ramo, mesmo porque esse trabalho não me dava mais prazer. Desisti antes que fosse tarde demais para ambos os lados.
Como aprendizado inicial e imediato, pude enxergar uma armadilha quase que inevitável para os candidatos à atividade: a de achar que trocadilho é criação publicitária (e hoje até está sendo, lamentavelmente). Daí que surgem bobagens sem fim, que o criador há de achar geniais ou divertidas, sem entender que qualquer piada fica velha, por melhor que seja. Uma vez já basta para ouvi-la ou vê-la; na segunda, você já tem vontade de sair de perto.
Tanta conversa só para registrar o meu pequeno protesto, e não pela rejeição enorme que sinto, contra a denominação que a imprensa esportiva nacional - que é replicada por aqui - deu à Copa do Nordeste, o antigo Nordestão: Lampion’s league é a p... (deixa pra lá). Fato: a denominação nasceu da mesma cepa do “novo cangaço”.
Essa associação de um movimento que nos remete à violência e ao banditismo é profundamente injusta com o povo dessa região tão bela, sofrida e mal dividida – como o resto do Brasil-, revelando apenas o tal do preconceito estrutural.
Digo-lhes: seria também uma tremenda estupidez chamar o Campeonato Carioca de Futebol de “Milicião” ou algo semelhante. Quem sofre com essa turma do crime, sempre e principalmente, é o povo que vive assustado e na iminência de uma tragédia. Seria injusto e acintosamente preconceituoso com os torcedores do Rio de Janeiro (o que vale para outros estados e regiões) batizar seu torneio de futebol com inventividades tolas, engraçadinhas e desrespeitosas.
A nordestinofobia é uma realidade que não cessa, mesmo em tempos do politicamente correto, ainda que nem sempre percebida (como acontece com o racismo recreativo). Ela está viva e pulsando na alma dos que enxergam diferenças entre nós – a menor – e aqueles que são de unidades da Federação mais ricas ou “evoluídas”.
É até verdade que alguns segmentos da “esquerda” ou da academia, em todo o país, ainda veem no cangaço um movimento revolucionário, como pensou Prestes, um dia, de rompimento com o feudalismo (mas chega, não é não?).
E para a turma que teima em chamar a Copa do Nordeste pela alcunha dada pelo “gênio” piadista e iluminado de um publicitário/esportista, é bom usar a própria linguagem do futebol para fazer um alerta: sem intenção também é falta.