Em 27 de abril do ano passado publiquei aqui um texto sobre a atriz alagoana Aline Marta Maia, que foi premiada por filmes como Carvão e Pedágio. Começo aquele post afirmando que o cinema brasileiro vai muito bem, obrigado. Ao contrário da besteirada de muitos que insistem numa comparação idiota com o cinema argentino, a produção brasileira tem alta qualidade, riqueza temática e diversidade de estilos.
Não gosto de Central do Brasil, a obra do mesmo Walter Salles que dirigiu Ainda Estou Aqui, agora indicado ao Oscar de melhor filme, melhor filme internacional e melhor atriz. Salles é um diretor convencional, como fica claro em Terra Estrangeira, Abril Despedaçado e Diários de Motocicleta, outros de seus títulos. Tomara que esteja mais arrojado com o novo trabalho, que já fez história com o Globo de Ouro e outros prêmios.
Como não vi, não posso opinar sobre Ainda Estou Aqui. Uma resenha propriamente dita fica para depois. Mas é preciso escrever algumas palavras sobre o feito inédito do diretor: pela primeira vez, o Brasil concorre na categoria principal – a de melhor filme, não apenas na prateleira internacional. O que isso tem a ver com a arte de fazer cinema? A rigor, nada. Mas o reconhecimento global tem consequências concretas.
A primeira é incentivar as plateias brasileiras a prestigiarem o cinema daqui. Não por patriotada, mas porque há muito o que ver nas telas do país. E a maioria das histórias passa voando pelas grandes salas, sempre engajadas nas produções americanas feitas sob medida para desmiolados (exceções reafirmam a regra absoluta). Uma premiação nessas dimensões tem tudo para fortalecer a produção cinematográfica.
Sim, tem o lado da guerra cultural. As redes sociais expõem a festa, mas também os ataques dos cidadãos de bem que defendem ditadura, tortura e morte. O tema do filme racha o Brasil da polarização. A esquerda pula carnaval. A direita faz cara feia, torce contra e – o mais importante – detona “esse filmezinho comunista”. Aí não dá. É uma pena que a política provoque tamanha cegueira e exponha desatinos até sobre a arte.
Não precisamos de um Oscar para atestar a força e a vertigem do cinema do Brasil. Mas, pelo clima, acho que alguma estatueta está a caminho. Espero que haja premiação e, com isso, mais interesse pelos talentos do país. Filme é o que não falta para mostrar.