A moça liderança mostra, com orgulho, o imponente templo cristão na entrada da comunidade quilombola, e conta ser devota fervorosa.
Ouço-a com atenção, pontuando , por entre suas palavras de exaltação, os caminhos da miséria e da poeira seca que tomam conta do ar-respirável e atropelam a circulação de gargantas, provocando uma tosse incomoda, intermitente.
Cof! Cof! Cof!
Depois conversamos sobre as coisas práticas, que carecem de muita fé para alimentar a crença diária, que um dia as coisas mudem para melhor, mesmo que a situação da invisibilidade, do abandono , do deixa-pra-lá, venha se arrastando faz séculos.
Não há condução, ou seja transporte, entre o Quilombo e a cidade. Tem que se enfrentar um longo caminho, a pé, debaixo de um sol causticante.
Tem fartura de escassez de água nas torneiras e muitos esgotos a céu aberto saudando o descaso estatal.
Os jovens, sem perspectivas, descobrem as drogas.
A incidência da violência doméstica é crescente, e a gravidez na adolescência, também.
Um povo negro (?), com o pertencimento histórico desidratado pelos discursos do Ocidente, que tira do bolso, um dinheiro, fabricado pela pseudo-esperança de sucesso, felicidade e outros valores, como resignificacçao da fé.
Utopia que ilumina e seduz como promessa de futuro, da salvação eterna.
Religião é mercado?
Operação mercantil da compra e venda?
Nos entremeios da conversa, pergunto à liderança quilombola, se existe um terreiro de matriz africana na comunidade.
Ela é pega no susto e responde que não, em palavras incorporadas pelos ensinamentos cristãos, afirma que isso é coisa ruim.
É senso comum entre quilombos alagoanos, classificar a religião de matriz africana como impraticável.
Demonização, ou, o oco do nada da preservação crítica da memória- história quilombola-negra ?
Quem não tem consciência crítica se torna refém do sistema reproduzindo, naturalmente, dominação, exploração, exclusão sócio-étnica.
Coisificação da fé negra, totalmente, alheia.
A religião como produto do capitalismo branco e a reprodução marginal da religiosidade negra pelos quilombolas, em Alagoas.
Fé cega. Fala amolada.
Laroiê, Exu!