A convivência entre moradores e seus animais de estimação em condomínios pode ser desafiadora sem a existência de normas claras e seguidas por todos. Recentemente, no bairro de Mangabeiras, uma situação trouxe à tona debates sobre como gerenciar o comportamento dos pets em áreas comuns dos edifícios.

Uma moradora relatou ao CadaMinuto que sua vizinha permitia que seu animal urinasse na garagem, próximo aos carros e à área de convivência social. Segundo ela, isso causava desconforto devido à sujeira e ao forte odor da urina, descrito como "bem desagradável".

Para esclarecer como lidar com esse tipo de problema e promover um ambiente mais harmonioso, a reportagem entrevistou o advogado Francisco Vasco, presidente da Comissão de Direito Condominial da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Alagoas.

Vasco destacou a importância de estabelecer e seguir normas específicas para o convívio entre moradores e seus animais de estimação. 

Confira abaixo a entrevista na íntegra.

Qual é a responsabilidade legal dos moradores em relação à limpeza e manutenção das áreas comuns, especialmente em relação aos resíduos de animais?

Os direitos e deveres dos condôminos decorrem diretamente dos artigos 1.335 e 1.336 do Código Civil, bem como das normas previstas na convenção e no regimento interno. Com base nisso, é possível afirmar que a responsabilidade dos moradores em relação à limpeza e manutenção das áreas comuns é uma obrigação contida em lei e nos regramentos internos da edificação.

Quanto ao resíduo de animais, os moradores têm o dever de zelar pelo bem-estar, pela salubridade, pela segurança e pela higiene do ambiente compartilhado, o que inclui a remoção imediata de resíduos deixados por seus animais de estimação. Cada proprietário deve garantir que seus animais não prejudiquem a limpeza das áreas comuns e a saúde dos demais proprietários.

 

É possível aplicar sanções aos moradores que não cumprem as regras de limpeza após seus animais urinarem ou defecarem em áreas comuns? Se sim, quais são essas sanções?

A falta de cumprimento dessas responsabilidades pode acarretar sanções, conforme estabelecido na convenção do condomínio ou no regimento interno. Além disso, a legislação local, quando existente, pode reforçar essa responsabilidade, estabelecendo normas de higiene pública que se aplicam aos condomínios.

Em regra, a administração do condomínio notifica o proprietário do animal sobre a irregularidade, para num segundo momento aplicar multa, especialmente em caso de reincidência.

As sanções mais comuns incluem a aplicação de multas, as quais objetivam desestimular comportamentos inadequados e cobrir eventuais custos de limpeza extra ou reparos necessários. Em casos de reincidência, as multas podem aumentar progressivamente.

Em situações extremas, onde o comportamento do animal coloca em risco a saúde ou a segurança dos demais moradores, o condomínio poderá recorrer à Justiça para obter medidas mais severas, como a expulsão do animal.

 

Quais são os passos legais que um condomínio pode tomar se um morador se recusar a cumprir as regras de limpeza de resíduos de animais?

Como visto, existem etapas que o condomínio, por meio de sua administração, deve seguir para resolver a situação de forma efetiva e dentro dos limites da lei.

O primeiro passo é a comunicação formal do problema ao morador, geralmente por meio de uma advertência escrita, detalhando a infração e solicitando a correção imediata do comportamento. Esta comunicação deve ser clara e objetiva, mencionando as regras violadas e as possíveis consequências em caso de reincidência.

Caso a advertência não seja suficiente, o próximo passo é a aplicação de multas conforme previsto na convenção ou no regimento interno. Vale reforçar que a aplicação dessas penalidades deve ser documentada e comunicada formalmente ao morador, incluindo uma explicação sobre o motivo da multa, os prazos para pagamento e os procedimentos para apresentação de recurso.

Por último, o condomínio pode se socorrer do Poder Judicário por meio de uma ação judicial com o objetivo de obrigar o infrator a cumprir de imediato das regras.

Em todas essas etapas, é fundamental que o condomínio mantenha registros detalhados de todas as infrações (fotografias, filmagens, testemunhas etc.) e das tentativas de resolução amigável.

 

Como o condomínio pode formalizar regras sobre a circulação de animais nas áreas comuns para evitar problemas futuros?

Em regra, as normas devem estar previstas na convenção condominial e no regimento interno. Tais documentos trarão um rol de situações passíveis de cumprimento pelos proprietários, sob pena da adoção das penalidades previstas. Esses documentos são a base regulamentadora da convivência entre os moradores e devem refletir as necessidades e expectativas do condomínio.

A proposta de novas regras ou a alteração das existentes deve ser discutida em assembleia geral, onde todos os condôminos têm a oportunidade de expressar suas opiniões e votar. É prudente destacar que nos casos de alteração na convenção, a assembleia deverá respeitar o quórum de 2/3 da totalidade dos moradores para validar a mudança proposta.

Portanto, as regras devem ser claras e específicas, abrangendo todos os aspectos relacionados à permanência de animais nas áreas privativas e circulação destes nas áreas comuns, a exemplo da previsão das áreas permitidas e proibidas, a necessidade de guias e coleiras, a responsabilidade pela limpeza de resíduos, entre outras.

É função da administração dar ampla divulgação entre os moradores, o que geralmente acontece por meio de comunicados afixados em áreas comuns, distribuição de cópias impressas ou envio por meios eletrônicos. Além disso, a implementação de campanhas educativas pode ajudar a conscientizar os moradores sobre a importância de seguir as normas.

 

Existem leis ou regulamentações específicas que regem a presença de animais em áreas comuns de condomínios?

Alguns Estados brasileiros já possuem leis que regulamentam de maneira específica a presença de pets nas áreas comuns. Inclusive, existem leis que tratam dos animais comunitários, que são aqueles que de alguma forma aparecem no condomínio e passam a fazer parte da comunidade.

A Lei 10.406/2002 (Código Civil) estabelece princípios gerais sobre a convivência em condomínios, incluindo o respeito aos direitos e deveres dos condôminos. Destes dispositivos, podemos extrair o entendimento de que a presença de animais é plenamente possível, desde que o proprietário cumpra com as normas internas.

Corroborando esta ideia, atualmente a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de permitir a presença de animais nas unidades privativas, bastando, apenas, que o dono do animal siga as diretrizes condominiais.

 

Qual é o papel do síndico em resolver questões relacionadas à limpeza e manutenção das áreas comuns afetadas por animais de estimação?

Dentre as competências do síndico elencadas no artigo 1.348 do Código Civil, podemos destacar a obrigação de cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da assembleia, bem como diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns.

Como representante legal do condomínio, o síndico é responsável por assegurar que todas as normas e regulamentos internos sejam cumpridos pelos moradores e isso inclui a supervisão da limpeza das áreas comuns e a aplicação de sanções aos condôminos que não mantêm esses espaços em condições adequadas.

Uma vez ocorrida a infração, o síndico deve seguir os procedimentos previstos e aplicar as sanções estabelecidas no regimento interno. Caso estas não surtam efeitos, poderá o mandatário buscar o Poder Judiciário para resolver a situação.

 

Há alguma recomendação legal para a implementação de medidas preventivas ou de controle para evitar que esses problemas se repitam?

A existência de uma convenção e de um regimento interno bem elaborados e atualizados é fundamental para a construção de um ambiente condominial saudável. Estando bem redigidas as normas e amplamente divulgadas, certamente as chances de cometimento de infrações será reduzida.

Outra recomendação importante é a implementação de campanhas educativas, voltadas para a conscientização dos moradores sobre a importância da limpeza e do respeito às áreas comuns. Essas campanhas podem incluir a distribuição de folhetos, a realização de palestras e workshops, e o uso de comunicações digitais para alcançar todos os residentes.

Além disso, o condomínio pode investir em infraestrutura e serviços que facilitem o cumprimento das regras, como a instalação de lixeiras específicas para resíduos de animais, a disponibilização de sacos para coleta de dejetos e a contratação de serviços de limpeza especializados, quando necessário.

O uso de câmeras de vigilância em áreas comuns também pode ser considerado, desde que respeite a privacidade dos moradores e seja devidamente regulamentado.

Essas medidas, combinadas com uma administração competente, ajudam a manter o ambiente condominial apto à boa convivência entre os moradores.