Para bajular o topo da Justiça, a Globo-Lixo levou a ministra do STF Carmen Lúcia a participar do quadro Amigo Secreto, uma “tradição” do Fantástico. Essa opinião não é minha. É um resumo do que vi pela internet sob a assinatura de bolsonaristas indignados com “essa palhaçada”. A magistrada, atual presidente do TSE, está acostumada a levar pedradas por suas posições, mesmo que nada justifique a fúria dos agressores.

Imagine se o escolhido da Globo para o ritual de fim de ano fosse o Xandão. A essa altura haveria passeatas em diferentes avenidas do país cobrando a prisão de Alexandre de Moraes. Claro que a cúpula da emissora jamais cometeria um gesto mais que temerário. O juiz mais odiado pela extrema direita, suponho, também teria o cuidado de evitar algo tão delicado. Ainda assim, a imagem da ministra no “show da vida” deu o que falar.

A Globo fazendo agrados ao poder é regra na trajetória da empresa. Na ditadura militar, é claro, a parada era bem mais grave. No mesmo Fantástico, repórteres foram às ruas do país perguntar ao povo o que esperar do próximo presidente da República, João Figueiredo. Era o fim da década de 1970, e um ditador seria o sucessor de outro. A pauta da Globo fazia de conta que era uma sucessão na democracia. Bizarro é pouco.

Seis anos depois dessa recepção indigna a um presidente ilegítimo, a mesma Globo, agora no Jornal Nacional, apronta outra reportagem de mesma categoria. Cid Moreira diz que o ditador que está encerrando o mandato “está feliz”, que viverá como “um homem simples” e prefere ser chamado “apenas de João”. Que tal? Esse era o nível da cobertura jornalística da política do país. A naturalização de um regime de terror. Está no YouTube.

No carnaval de 1990, voltamos ao Fantástico, agora sim, na democracia, com o primeiro presidente eleito no voto direto, após o fim do governo militar. A pauta? O programa quer saber qual a música carnavalesca preferida do novo ocupante do Planalto, Fernando Collor. Ele cita as memórias da infância para justificar a escolha. E responde que a melhor de todas é o frevo Vassourinhas. Logo adiante, aquela cordialidade iria evaporar.

É muita marmota nessa relação entre a política, o poder e a imprensa. É bom ressaltar que cada caso é um caso. Mas, não importa a época, o clima entre essas esferas da vida pública é sempre um vaivém, uma alternância entre a calmaria e a hostilidade. Digamos que Carmen Lucia no Amigo Secreto da Globo é a reciclagem de um velho padrão.