O debate sobre o uso de celulares nas escolas tem se intensificado no Brasil. O Ministério da Educação (MEC) já anunciou que desenvolveu um projeto de lei que deve instituir a proibição dos aparelhos nas instituições de ensino públicas e privadas do país, com o objetivo de conter os prejuízos do uso excessivo de telas na infância e na adolescência.

A Comissão de Educação da Câmara dos Deputados deve analisar o texto do projeto que proíbe o uso de aparelhos eletrônicos nas escolas no próximo dia 30 de outubro. O texto está na Câmara desde 2015, é de autoria do deputado Alceu Moreira (MDB - RS) e  voltou ao debate após o anúncio do MEC de que está preparando uma medida para o caso.

O texto de 2015 prevê a proibição do uso de celular dentro de sala, no recreio e nos intervalos entre as aulas para todas as etapas da Educação Básica. O uso será permitido apenas para fins estritamente pedagógicos ou didáticos, conforme orientação do professor e por questões de acessibilidade, inclusão e saúde.

De acordo com a pesquisa TIC Educação 2023 do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), o uso de celulares em sala de aula já é proibido em 28% das escolas brasileiras. Porém, a medida divide opiniões de estudantes, pais e profissionais que atuam na área de educação.

Em entrevista ao CadaMinuto a pedagoga e educadora parental, Cícera Lopes, disse que o uso dos celulares é inevitável no contexto atual, mas afirmou que invés de uma proibição total, uma regulamentação clara e equilibrada é necessária. “A escola pode ser um espaço de aprendizado sobre o uso consciente da tecnologia. No entanto, regras claras e limites são necessários para evitar distrações e promover o foco no aprendizado”, completou a educadora.

A educadora parental Cícera Lopes / Foto: Arquivo Pessoal

 

Segundo Cícera Lopes, entre os benefícios do uso dos celulares pelos alunos estão o acesso rápido à informação e ferramentas educacionais;  a possibilidade de reforço da aprendizagem com aplicativos e plataformas; a comunicação com os pais em caso de necessidade ou emergência. No entanto, mesmo com estes pontos favoráveis, o uso dos dispositivos também distrai os alunos e pode prejudicar a concentração; facilita o acesso a conteúdos impróprios; pode favorecer o isolamento social e cyberbullying.

“O uso excessivo e não monitorado pode prejudicar a capacidade de concentração, diminuir a memória de longo prazo e afetar o desempenho escolar. Além disso, pode comprometer o desenvolvimento social, limitando interações face a face. No entanto, quando utilizado de forma equilibrada, pode enriquecer o aprendizado, ajudar no desenvolvimento de habilidades digitais e proporcionar acesso a conteúdos relevantes”, afirma.

E continua: “ já o acesso gradual e o uso controlado são fundamentais para o amadurecimento. Essa abordagem ensina autocontrole, responsabilidade e gestão do tempo. A introdução progressiva dos dispositivos permite que as crianças e adolescentes compreendam os limites e aprendam a equilibrar suas atividades virtuais com as presenciais, essencial para o desenvolvimento saudável”.

Para a pedagoga e educadora parental, uma solução para o caso seria o uso regulamentado e supervisionado dos celulares, com momentos específicos em que eles podem ser utilizados para fins educacionais.

“A escola pode adotar políticas claras sobre o uso, como o armazenamento dos aparelhos durante a aula e a liberação em momentos apropriados. Também é essencial promover educação digital, ensinando os alunos a usarem a tecnologia de forma segura e responsável”, conclui.

“A proibição é necessária, pois há muita imaturidade digital”

Com anos de experiencia em sala de aula, em turmas do Ensino Fundamental e Médio, e em cursinhos, o professor Aleksei Rodrigo diz ser a favor da proibição do uso do celular e que há uma imaturidade digital por parte dos alunos.

“Sou a favor da proibição, porque na sala de aula está impossível a gente dar aula com acesso... intermetendo o celular. Os alunos eles não têm maturidade para pegar o celular só quando for requisitado pelo professor. Até porque depois da pandemia houve um exagero em relação ao uso e aí os pais mandam mensagens, os amigos mandam mensagens, eles falam entre si. É uma imaturidade digital, eu acho que é um termo bem acessível a situação e eu sou a favor da proibição”, afirma o professor.

O professor Aleksei Rodrigo / Foto: Arquivo Pessoal

 

Para Aleksei, se os alunos soubessem utilizar o celular de forma coerente, no silencioso, olhando uma mensagem ou outra e em casos de necessidade seria o ideal. Ele afirma que o maior problema são as redes sociais e os jogos.

“Alguns alunos não sabem ficar sem utilizar o celular. Há um vício, todos estão reféns, mas os alunos são bem mais reféns do que os professores, não sei se pela idade. E se você pegar o celular e colocar em um local adequado, tem alunos que ficam nervosíssimos, ansiosos, preocupados, distantes  e parece que o celular faz parte do corpo. Tem aluno que não tira ele da mão e se retira o aparelho dele, ele fica sem saber o que fazer”, reforça Aleksei.

De acordo com o professor, a proibição do telefone nas escolas deveria acontecer para educar os alunos, que deveriam deixar o aparelho em casa.

“Deveria ser proibido e avisado desde a matrícula. Deveria ter um local específico na entrada da escola para que os alunos deixassem o celular, depois ia haver a possibilidade de estar, de vez em quando, utilizando alguma estratégia de usar o celular para fazer algumas aulas ramificadas. Algumas escolas já são mais tecnológicas e usam o aparelho em algumas aulas, mas acho que a princípio tem que ser algo mais rígido, e aí depois ia aos pouquinhos educando”, diz.

O professor diz que, com o uso constante do celular,  parece que os alunos não querem e não sabem mais estudar e que essa é uma percepção comum entre seus colegas professores.

Aleksei conta que os alunos não querem copiar nada, nenhum exercício. E como tem tudo muito fácil na internet, não querem copiar, não querem responder questões abertas, não se preocupam com pontuação na hora de escrever e acabam demostrando que não sabem mais estudar. “É preciso mudar, dar uma reviravolta em relação a essa questão do uso do celular”, alerta o professor.

Em relação ao uso gradual do celular para ajudar no processo de amadurecimento, o professor diz que ainda tem “um pé atrás” sobre a possibilidade, pois há uma enorme  imaturidade digital que prova que as pessoas não sabem utilizar o celular.

“ A palavra refém é muito bem utilizada. Todos somos refém de tecnologia, principalmente das redes sociais, e  há muita imaturidade digital. Então, as pessoas não têm essa noção de futuro lá na frente, o que vai acontecer. Eu acho que, agora, não dá para permitir esse acesso gradual. Tem que dar uma bloqueada e depois, aos  pouquinhos, vai liberando, mediante educação e orientação para ver se dá certo”, finalizou o professor.

O que dizem os alunos?

Eu acho que deveria sim proibir o uso do telefone em sala de aula,  porque  mesmo que tenha só uma pessoa usando, ainda assim vai distrair os outros e atrapalhar a dinâmica de sala de aula. Porque o aluno não presta atenção é muito influenciável. Quando toda a sala está prestando atenção e só você está ali bagunçando, ou só você está distraído, você é tipo intimidado e começa também a querer estudar. Já em relação a tablete e computador, acho que deveriam manter, mas criar algum sistema que bloqueie o acessar a internet, redes sociais e jogos durante o tempo de aula”.

Maria Cecília, estudante do 2º ano do Ensino Médio

“Sou a favor da proibição por conta de que, em diversas aulas, muitos alunos acabam mexendo no telefone e deixando o professor explicando o assunto só. O aluno acaba perdendo o foco, querendo não participar das aulas e deixa de aprender o que seria importante para o seu futuro, tanto na faculdade, quanto na vida social e profissional”. 

Ítalo Gustavo, estudante do 2º ano do Ensino Médio.

“Eu sou a favor da proibição, porque o celular tira o foco das pessoas e se tornou um vício entre os estudantes, que não têm mais paciência de ouvir o professor falando e já estão muito acostumados com a tela do celular e, as vezes, o contato com as pessoas reais é diferente. O uso exagerado do celular prejudica tanto o desenvolvimento do aluno, quanto o convívio dele com as pessoas”, 

Maria Fernanda, cursa o 2º ano do Ensino Médio.

“Eu sou contra a proibição. Tem muitos país e responsáveis que tem a necessidade de entrar em contato com os filhos, por preocupação ou outros motivos, além de ajudar a socializar muita gente que não consegue socializar pessoalmente e só tem amigos por meio das redes sociais”.

David Lucas, cursa o 2º ano do Ensino Médio.

“Sou contra. Acho que caberia a escola colocar normas e até mesmo ao professor estabelecer regras. Proibir o uso é uma coisa sem sentido algum. Deveriam estipular regras e normas de uso dentro das escolas e fazer com que os alunos usem do bom senso”.

Miguel Lopes, estudante do 9º ano.