Na Idade Média, o tratamento da loucura seguia os ensinamentos da “ciência” de então, que estava longe, muito longe, de entender o que acontecia com a mente e como domá-la, se necessário. Um dos procedimentos mais curiosos, absurdo e risível hoje, defendido por médicos ou charlatães, era a “extração da pedra da loucura”, literalmente, que haveria de estar escondida na cabeça do doente.
Assim: fazia-se uma pequena incisão no crânio do afetado, retirava-se o objeto inanimado e o apresentava ao dono, na sequência, induzindo-o a recobrar a razão. A coisa era séria, ou tentava ser séria, e virou até obra de arte pelas mãos do pintor Hieronimus Bosch, autor da tela A extração da pedra da loucura.
(Fico me perguntando se essa não seria a origem da expressão “doido de pedra”, que vai sobrevivendo nesses tempos do politicamente correto. Deixo a resposta para os especialistas nas línguas dos homens.)
Mas, cá para nós, todo mundo consegue distinguir ou suspeitar da loucura explícita, a do doido de pedra ou varrido (de onde tiraram isso?), quando se depara com ela. É bom ressaltar que a ciência médica evoluiu bastante, a ponto de conseguir dar uma vida praticamente normal e humanizada àqueles cuja razão resolveu sair de férias.
Obviamente, a dificuldade de lidar com um problema tão sério permanece – dolorosamente –, principalmente para os mais pobres. Os depósitos de gente, como eram a maioria dos hospitais psiquiátricos, foram desativados por aqui, mas os serviços que os sucederam ainda não conseguiram atingir a qualidade e a universalização necessária, embora haja melhoras significativas. Sabe-se hoje, e está claro, que não é a exclusão do doente do convívio social e/ou familiar o melhor tratamento – muito pelo contrário.
Mas sabem aonde eu queria mesmo chegar?
Às eleições, que se realizam neste domingo de outubro.
Está louco, Ricardo?
Explico: não são os pacientes psiquiátricos o motivo da minha preocupação quando o assunto é política e voto, até porque o eleitor, quando estes aparecem como candidatos ou candidatas, fazem rapidamente o “diagnóstico” – e de forma até bem-humorada.
Ao acompanharmos as campanhas eleitorais pelo país afora, e aqui em Alagoas também, podemos nos deparar com indivíduos muito mais perigosos: os psicopatas, que se comportam quase sempre como pessoas comuns, sedutoras tantas vezes, que esperam com frieza e racionalidade o momento certo – para eles – de praticarem as mais abjetas maldades. Pior ainda em tempos de redes sociais e assemelhados.
Eis um território farto, a política, para essa turma, cujo diagnóstico só é possível aos profissionais especializados. Desprovidos de empatia, os psicopatas são atraídos naturalmente para o poder, e ao exercê-lo cumprem sua sina de perversidade – a indivíduos, comunidades e populações –, sem que isso resulte em qualquer sentimento de culpa ou remorso. E se o tal já fez uma vez uma maldade extrema, é maior a chance de fazer de novo (matar, por exemplo).
Quem já teve de conviver com pessoas com essa qualificação há de entender o perigo que isso representa, individualmente ou coletivamente.
Para os que têm sensibilidade humana mais aguçada, o transtorno (não é considerado doença) pode até parecer evidente, mas não é algo muito simples de se concluir. O problema é que não há uma avaliação científica frequente e obrigatória para detectar esse mal entre os que acumulam poder sobre outras pessoas (acho que o exame específico deveria ser compulsório para os que exercem atividades com uso da arma – evitar-se-iam muitas mortes e sofrimentos – ou para os que têm comando no poder público).
Extrair a “pedra da loucura”, imagino, pode ser até mais fácil para os humanos comuns do que evitar que eles se submetam ou sigam aqueles que nos parecem iguais, e cujas diferenças só ficam mais claras, quase sempre, quando já é tarde mais.
Vote com consciência e razão.
Ricardo Mota