A sensação de insegurança faz parte do cotidiano de muitos maceioenses, como revelam os relatos de Wladmyr Lenine Oliveira, de 26 anos, e Antonio Elias, de 34. Morador do bairro Salvador Lyra, parte alta de Maceió, há duas décadas, Wladmyr afirma que a situação não mudou muito em relação ao passado.
“Lembro de já ter sido assaltado três vezes por lá, e conheço pessoas que foram muito mais… Com o tempo se tornou natural para gente andar sempre atento”, recorda o estudante.
A violência não se limita às ruas. Wladmyr relata que até mesmo em sua casa já foram vítimas de furto: “Na minha casa inclusive já roubaram dois bujões de gás e até hoje a gente não sabe como fizeram isso de madrugada sem ninguém ouvir.”
Para o administrador financeiro, Antonio Elias, morador do bairro do Poço, parte baixa da capital, a falta de segurança é especialmente preocupante à noite. “A [rua] Pedro Américo é mal iluminada e esquisita. Sempre ouço relatos de assaltos em horários diversos e já cheguei a presenciar da minha janela mesmo, correria e gritaria. Até invasão de domicílio”, conta.
A experiência de ter sido assaltado sete vezes ao longo da vida deixou marcas profundas em Antonio. “Me tornou desconfiado e paranoico”, desabafa. A insegurança o leva a evitar sair à noite, a não ser em avenidas movimentadas. “Não confio em praças ou ruas que não sejam avenidas principais com muita movimentação de carros e pedestres”, afirma.
Ambos os moradores apontam a falta de iluminação adequada como um problema que contribui para a insegurança. “Um ponto que acho o básico mínimo para melhorar é ter alguma iluminação decente nos bairros que precisam mesmo. Aquela luz amarela não sei nem como existe ainda”, critica Wladmyr.
Antonio, por sua vez, sugere o aumento do policiamento, e não apenas na orla marítima. “Cara, não sou nenhum especialista ou entendido, mas poderia aumentar postos policiais e patrulhamento nos bairros, não só na praia que é onde o prefeito só se preocupa”, declara.
Segurança segue preocupando maceioenses
A preocupação dos eleitores com a segurança pública reflete o sentimento de insegurança destacado na sociedade brasileira. Segundo uma pesquisa realizada pelo PoderData, em dezembro de 2023, 36% dos brasileiros acreditavam que houve aumento da violência no país.
Na capital alagoana esse cenário não muda muito, a pesquisa Quest, que ouviu em Maceió 900 eleitores de 16 anos ou mais, divulgada no último dia 2 de setembro, revela que a segurança pública aparece como a segunda maior preocupação dos eleitores (16%), perdendo apenas para a saúde (36%). Esses números dão uma dimensão da importância do tema para os eleitores, que irão às urnas no dia 6 de outubro.
Apesar do senso comum, de que a divisão de tarefa é dos poderes públicos, a responsabilidade de zelar pela segurança pública fica a cargo do governo estadual, afinal são eles que comandam a Polícia Civil e Militar, o município possui seu papel importante na integração dos órgãos estaduais de segurança.
Além disso, o papel na prevenção social e situacional das violências e na promoção dos direitos da população, os quais são partes fundamentais de uma política de segurança pública.
Veja as propostas dos candidatos a prefeito
O CadaMinuto, analisou os cadernos de propostas de todos os candidatos a prefeitura de Maceió — JHC (PL), Rafael Brito (MDB), Lobão (Solidariedade), Lenilda Luna (UP) e Nina Tenório (PCO) — para mostrar e tentar entender como cada candidato pensa o tema em suas propostas de governo.
JHC
Atual prefeito, candidato a reeleição e líder nas pesquisas na capital alagoana, João Henrique Caldas, o JHC (PL), apresentou seu programa de governo, e nele, sem uma divisão temática, apresenta 5 propostas voltadas para o tema da segurança pública.
O candidato do partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, foca no desenvolvimento da Guarda Civil Municipal, apostando em programas de capacitação e integração com outros órgãos de segurança. Confira todas as propostas apresentadas pelo atual prefeito para o tema:
- Política de Capacitação Permanente: Desenvolver uma política de capacitação permanente para os Guardas Civis.
- Modelo Integrado de Gestão de Segurança: Implementar um novo modelo integrado de gestão de segurança pública, passando a Guarda Civil Municipal (GCM) a ter independência e autonomia para executar o serviço auxiliar de segurança na cidade.
- Programa Guarda Faz Escola: Fortalecer e ampliar o programa Guarda Faz Escola, aumentando ações de monitoramento e proteção nas unidades de ensino da rede municipal.
- Patrulha Maria da Penha: Estabelecer uma Patrulha Maria da Penha Municipal por meio da GCM.
- Central Integrada de Monitoramento: Reestruturar a Central Integrada de Monitoramento para prevenção de violência nas escolas, prédios públicos, praças, pontos de ônibus, com a possibilidade de integração dos sistemas de monitoramento de condomínios, comércios, compreendendo ainda toda malha de videomonitoramento viário, permitindo a interoperabilidade dessas informações com as demais forças de segurança.
Rafael Brito
Quem aparece como segundo colocado nas últimas pesquisas de intenção de votos em Maceió, apesar da grande distância para o atual gestor da capital, é Rafael Brito (MDB).
O candidato apoiado pelo governador do estado, Paulo Dantas (MDB), é o que mais elencou propostas, no sentido mais puro do termo, para o tema da segurança pública. Brito, aliás, é o único candidato, em Maceió, que cita como propostas armar a Guarda Civil Municipal. Confira os eixos apresentados pela campanha de Rafael Brito para o pleito em Maceió:
- Aumentar a segurança pública com o policiamento, integrando a Guarda Municipal e a Polícia Militar, e melhoria da iluminação das ruas e calçadão;
- Implantar Programa Integrado de Prevenção à Criminalidade e à Violência, ampliando a força de trabalho da Guarda Municipal e a capacidade de policiamento
- Integrar a Guarda Municipal aos Centros Integrados de Segurança Pública (CISP), reforçando as forças de segurança
- Armar os Guardas Municipais, priorizando os agentes que atuam em regiões de maior índice de violência, com a realização dos cursos e treinamentos necessários
- Ampliar e modernizar o sistema de videomonitoramento da segurança pública, integrando com sistema da Secretaria de Segurança Pública (SSP) do Governo do Estado de Alagoas
- Criar o Núcleo Estratégico de Inteligência da Guarda para realizar a coleta e análise de dados relacionados à segurança pública e auxiliar na elaboração de estratégias de segurança
- Implantar os Módulos da Guarda, base 24h para a Guarda Municipal realizar a segurança (PM Box)
- Implantar sistema de radiocomunicação municipal, integrando a comunicação operacional da Guarda aos demais agentes de fiscalização, Agentes de Trânsito, Agentes de Fiscalização de Transporte e Fiscais de Postura
- Fortalecer e ampliar o programa “Guarda Faz Escola”
- Projeto de Prevenção à Violência contra a Mulher e Violência Doméstica e a promoção da cultura da paz
- Criar o Gabinete Metropolitano de Gestão Integrada da Segurança Pública junto ao Governo do Estado e os municípios da Região Metropolitana de Maceió
- Criar o Programa de Democratização e Modernização da Gestão da Segurança, fortalecendo esferas de diálogo e participação decisória com a sociedade civil
- Capacitação das forças policiais sobre direitos humanos, gênero e violência urbana e doméstica.
- Implantar os Pontos de Ônibus Seguro que são abrigos de ônibus com câmeras de segurança e a presença digital de um vigilante para fazer companhia ao passageiro durante a espera.
Lenilda Luna
A candidata Lenilda Luna, da Unidade Popular (UP), também reservou um grande espaço do seu programa de governo para tratar do tema da segurança pública.
A jornalista e servidora pública, utilizou o espaço sobre o tema em seu programa para levantar um debate sobre o papel do poder executivo municipal na implementação de uma guarda civil, feita por civis. Confira o trecho das propostas de Lenilda sobre a segurança pública:
- Desmilitarização da Guarda Municipal: A desmilitarização da Guarda Municipal exige uma reestruturação profunda, afastando-se do modelo policial militarizado. Propomos a transformação da Guarda Municipal em uma Guarda Civil municipal com foco na proteção comunitária.
A Guarda Civil deve atuar como parceira da comunidade, priorizando ações preventivas e de proximidade, como programas de educação para o trânsito, patrulhamento comunitário e mediação de conflitos.
A militarização das guardas municipais têm gerado inúmeros problemas, como o aumento da violência policial e a violação dos direitos humanos. A proposta de transformar a Guarda Municipal em uma Guarda Civil busca:
- Priorizar a proteção comunitária: A Guarda Civil deve atuar de forma proativa na prevenção e no combate à criminalidade, buscando construir relações de confiança com a comunidade.
- Reduzir a violência policial: A desmilitarização da Guarda Municipal contribui para a redução da violência policial, uma vez que a ênfase será na proteção da comunidade e não na repressão.
- Melhorar a qualidade do serviço público: A Guarda Civil pode oferecer serviços de maior qualidade à população, como a realização de atividades sociais e culturais.
- Respeitar os direitos humanos: A atuação da Guarda Civil deve ser pautada pelo respeito aos direitos humanos, com o uso de força restrito e a valorização do diálogo.
- Participação popular: É fundamental garantir a participação da comunidade na gestão da Guarda Civil, através de conselhos comunitários e ouvidorias.
- Formação continuada: Os agentes da Guarda Civil devem receber formação continuada em direitos humanos, resolução de conflitos e atendimento à população.
- Articulação com outras políticas públicas: A Guarda Civil deve atuar em articulação com outras políticas públicas, como educação, saúde e assistência social.
- Criar a guarda municipal da defesa das mulheres, de combate ao racismo e da defesa das crianças e adolescentes.
Lobão
No programa de governo do candidato do Solidariedade, Lobão, cita o tema da segurança apenas em um trecho, intitulado “Mulheres e Minorias”. O tema é levantado em propostas que fala sobre a violência doméstica e contra minorias sociais.
O candidato foca em propostas que visam a conscientização e o acolhimento de vítimas, como a proposta da criação de um Centro de Cuidado para mulheres vítimas de violência. Confira as propostas:
- Criaremos o programa tolerância zero a violência doméstica. Criando uma rede de serviços e atendimento às mulheres vítimas de violência, permitindo o acesso ao auxílio aluguel as mulheres em situação de violência, colocando-as nos programas de moradia, trabalho e renda. Programa de Governo Lobão e Danúbia - 2024
- Criaremos o centro de cuidado as mulheres, atuando junto a coordenação de saúde da mulher da secretaria municipal de saúde, promoverá atendimento integral das mães e filhos até a primeira infância, fortalecendo políticas públicas para prevenção de doenças e diagnóstico precoce, incluindo assistência de saúde mental.
- Criaremos a rede municipal de enfrentamento a violência, o racismo e a discriminação lgbtfobia. Combater a violência através da sensibilização da população e dos órgãos municipais, capacitando os servidores públicos, especialmente os da área de saúde e segurança urbana, para o atendimento humanizado.
- Criaremos os centros voltados a população lgbtquia+ promovendo educação, garantindo empregabilidade, acolhimento e monitoramento da saúde, promovendo uma abordagem inclusiva, garantindo uma vida digna.
O programa de governo da candidata Nina Tenório, do PCO, segue um padrão nacional de propostas e, portanto, não foi considerado nesta matéria.
Militarização ignora causas da violência e visão ampla de segurança
Em um contexto de crescente violência e insegurança, o debate sobre segurança pública no Brasil, em alagoas e Maceió, tem se mostrado limitado e superficial, preso a uma perspectiva ostensiva que prioriza o armamento e a ampliação das forças policiais.
Essa visão, criticada por especialistas como Adson Ney Amorim, doutorando em sociologia pela UFSCar, negligencia as múltiplas dimensões que compõem a ordem pública e ignora o papel crucial dos mercados ilegais na escalada da violência.
“Fala-se em armamento e ampliação das instituições policiais, sem que se leve em conta, as múltiplas dimensões de garantia da ordem pública que compõem a ideia de segurança pública”, alerta Amorim.
Para Amorim, enquanto o debate público se limita a promessas de “restabelecimento da ordem” por meio da força, os mercados ilegais e criminais prosperam, expandindo sua influência e poder.
Ainda segundo ele, a ausência de perspectivas de estabilidade e prosperidade dentro da legalidade impulsiona a adesão a essas dinâmicas mercantis ilícitas, alimentando um ciclo de violência que se manifesta nos alarmantes índices de homicídios.
“São os homicídios resultantes das disputas pela regulação desse mercado e aqueles decorrentes do seu combate, os que elevam as cifras da violência”, aponta o pesquisador.
Essa “miopia do debate público” apontada pelo pesquisador se reflete em demandas por medidas como a militarização das guardas municipais, ignorando seu papel constitucional na proteção do patrimônio público. “Em Alagoas, apesar de investimentos significativos em segurança pública, a ênfase em mecanismos de inteligência policial não garante a redução dos índices de violência”.
*Estagiário sob supervisão da editoria
Foto de capa: Antônio Cruz/Agência Brasil