No meio das Olimpíadas, Marcos Mion usou dados falsos para criticar o governo pelo baixo incentivo aos atletas nacionais. Ao ser desmentido pelo Instagram (a rede na qual ele divulgou sua ficção), o animador de auditório pediu desculpas e nos tranquilizou. Segundo suas palavras, o vídeo que gravou não era uma crítica ao atual governo, e sim, atenção, “uma reflexão para estimular um debate sobre o esporte brasileiro”.
Que desconcertante! Descobrimos com esse episódio que Mion tem o hábito de refletir sobre os rumos do país, entre uma festinha e outra com sua turma de celebridades. Mais: ele tem a singela pretensão de pautar os debates que julga necessários ao Brasil. Nada como a autoestima no topo, livre de perrengues existenciais. Que o apresentador da Globo pense essa enormidade sobre seu poder de influência é assustador.
O drama não é sobre o pensamento do marombado Mion. Também não se resume naquela batida ideia de Umberto Eco sobre a internet dá voz a milhões de idiotas. O que temos aqui é uma mostra de uma inflexão de valores, a virada de princípios de conduta e de visão de mundo. Perturbador mesmo é constatar que fama e dinheiro são os ingredientes definitivos dessa revolução. Avançamos com tudo para trás.
A vida contemporânea se move pelas ações e palavras de famosos exibicionistas e cheios de grana. Uma coisa alimenta a outra. Na lógica da era do influencer, a conta bancária milionária certifica a excelência do ser. Foi sempre assim, você poderia argumentar. Mas não. A emergência da supremacia digital redimensionou o alcance de fatores que, até então, eram contidos numa maquinaria ainda rudimentar.
A vertigem das relações virtuais elimina as fronteiras não apenas do diversionismo e da futilidade. As redes sociais têm vida própria, inventam o inexistente e cancelam catedrais. O comércio de bens materiais, informações e afetos num único espaço – um não espaço, difuso, imaterial. É essa geleia cibernética, triunfo do metaverso, que autoriza um Mion qualquer a expor seu delírio de autoridade moral sobre nossas vidas.