Quem diria! Uma tentativa de assassinato nos Estados Unidos vira “ativo” político no Brasil. O mundo ficou maluco mesmo. Quantas vezes algo parecido ocorreu ao longo da nossa história? Até onde alcança minha ignorância, nenhuma. E você, conhece algum precedente? O atentado contra Donald Trump tem repercussão planetária por razões óbvias. Mas o que se passa por aqui não tem comparação. O futuro bateu à porta.

Na superfície, as manifestações de bolsonaristas estão dentro do previsível. Os rapazes pacifistas e pais de família estão chocados com a “violência da esquerda”. Chega a ser hilário ler as palavras de deputados e outras figuras com mandato sobre o ocorrido. Gente que reverencia torturadores e faz piada com direitos humanos agora tremula a bandeira da paz. Essa turma acredita mesmo no que escreve? Nem faz diferença.

A tentativa de igualar os tiros em Trump e a facada em Bolsonaro já é material para historiadores lá na frente. O caso ilustra, num episódio extremo, a inflexão definitiva no jeito de fazer política no século 21. Já sabemos que os fatos não importam, valem as “narrativas” e as versões de cada grupo. E aqui não interessam as escolhas ideológicas.

Direita, esquerda e qualquer outra posição geométrica estão emboladas nessa transição de modos de pensar e visões de mundo. Cruzamos um limite ao desconhecido – talvez à escatologia da política. É preciso reconhecer que, para além dos objetivos, os métodos se alinham no solene desprezo pela razão – a baliza mediadora dos iluministas.

Não sei se fui claro. A era do metaverso, o reino da plutocracia digital e o triunfo da algaravia das redes sociais sacramentam nosso destino. Tiros em Trump movem o dia a dia brasileiro num fenômeno sem paralelo na história das nações. Os patetas que berram contra o “modus operandi da esquerda” rodam uma engrenagem que os domina.

A gritaria virtual tem como gatilho um acontecimento concreto que, num paradoxo revelador, evapora ao ser apropriado por essa forma de reagir aos estímulos do mundo lá fora. É um processo que avança sobre todas as esferas da vida contemporânea. Numa quadra como esta os teóricos do pós-moderno não pensaram. Por aí.