No encontro da ultradireita realizado no fim de semana em Santa Catarina, as grandes estrelas não fugiram ao script previsível nesse tipo de evento. O argentino Javier Milei foi o primeiro a dedicar parte de seu falatório para ataques à imprensa. Os reacionários enxergam no jornalismo profissional um dos grandes inimigos de suas ideias “libertárias”. Em entrevistas por lá, Jair e Eduardo Bolsonaro repetiram a ladainha.

Nos Estados Unidos, Joe Biden diz que não vai se curvar à maldita imprensa que pede sua desistência da candidatura à reeleição. Durante sua trajetória política, Biden foi tratado com mesuras pelos grandes jornais americanos. A recíproca era verdadeira. Em momentos agudos, ele ressaltava o papel da imprensa livre como expressão da robustez do regime democrático. Agora, o presidente parece ter mudado de opinião.

O adversário do atual presidente americano tem como inimigo mortal alguns dos mais influentes veículos de comunicação do mundo. Para Donald Trump, New York Times, CNN e The Economist agem para destruí-lo com a proliferação de fake news acerca de sua conduta honrada. Por isso mesmo, prefere falar para o pessoal da mídia que não se dobrou ao globalismo comunista – que ele vê como dominante em todos os continentes.

Para o russo Vladimir Putin, o Ocidente distorce suas ações humanitárias na Ucrânia, chamando de guerra o que não passa de uma ação diplomática para retomar o território da grande Rússia. Volodymir Zelensky não concorda. Além de denunciar Putin, ele também se queixa da mesma turma de jornalistas que fazem o jogo do inimigo que pretende anexar sua pátria. Cobra fidelidade aos fatos e respeito aos ucranianos.

O presidente Lula não tem dúvida de que os tubarões dos jornais, TVs, portais e outros meios mentem um bocado sobre as qualidades do governo. Seu colega na Venezuela, o progressista Maduro, teve de domar emissoras e outros meios que não eram fiéis aos fatos. Ao contrário, queriam sabotar o grande projeto socialista em curso. Lula e Maduro acham que a imprensa quer tirá-los do poder em nome das elites entreguistas.

Nos Diários da Presidência, Fernando Henrique Cardoso gasta boas páginas para acusar a imprensa de perseguir sua gestão. Usa termos duros contra os grandes veículos, sobretudo a Folha. Mas sobra até para O Globo, visto, veja só, como oposição por FHC. No Estado Novo, com a ditadura de Getúlio, e no regime militar, com a ditadura de 64, o jeito foi oficializar a censura. Somente assim para barrar as más notícias.

Resumo da ópera, do samba e do rock: a culpa é sempre da imprensa. Nisso, os donos do poder sepultam a polarização e concordam universalmente. Essa é uma ideia fixa em minha cabeça oca. Por isso o ataque em massa contra a velha imprensa sempre me soa um perigo muito maior do que os piores erros que esta senhora já cometeu. O fim da atividade do jornalismo livre será o abismo sem volta, a distopia total.

Até lá, que se escreva tudo, sempre. Ou a imprensa incomoda ou não é nada. Por aí.