Fantasiado no afoxé Filhos de Gandhy, Lula desfilou numa carreata no 2 de Julho, a festa que os baianos tratam como a data mais importante da Independência do Brasil. Em clima de campanha eleitoral, o presidente estava ao lado do candidato a prefeito de Salvador Geraldo Junior, do MDB. Foi mais uma investida na estratégia que o petista adotou nas últimas semanas. É uma reação aos ataques contra o governo.

Com suas críticas ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que de fato faz política de maneira escandalosa, Lula atrai a fúria do “mercado”. A alta do dólar nas últimas semanas se tornou o mantra dos que apontam o apocalipse . A gritaria não bate com a realidade que atesta crescimento e estabilidade. Não é nenhuma maravilha, mas a gestão passa longe de qualquer sinal de terremoto. Mas os pregadores do caos insistem.

Nesta quarta-feira, dois fatos novos mostram o governo em movimentos quase opostos, com consequências na economia e na política. O primeiro foi a fala de Lula sobre compromisso com o ajuste fiscal ao ressaltar como prioridade o controle de gastos. Foi um recado para “acalmar” a turma do dinheiro e do setor produtivo. Ao que parece, as reações favoráveis foram imediatas. Além de afagos, o governo viu o dólar recuar.

Na outra ponta do jogo, Lula voltou a um vespeiro ao anunciar a recriação da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. O grupo foi dissolvido em 2022, na reta final do governo Bolsonaro. O tema nunca foi prioridade na gestão do capitão que exalta a tortura e chegou a lamentar a ditadura não ter assassinado pelo menos 30 mil. 

A comissão foi criada no governo FHC com o objetivo de localizar corpos de pessoas desaparecidas e indenizar suas famílias. O reconhecimento das vítimas do regime militar é uma obrigação ética, política e institucional da qual o Brasil não pode negligenciar. A recriação foi promessa de campanha de Lula – e ele estava sendo cobrado por isso.

Os crimes praticados pelo governo dos generais ficaram na impunidade sob o verniz da anistia geral acertada em 1979, quando o regime já derretia de podre. Sem punição aos que torturaram e assassinaram, que ao menos se reconheça o direito das vítimas por meio de reparação às famílias. É o que se espera que volte a ocorrer a partir de agora.

A decisão do presidente abre um flanco para o discurso da extrema direita que lambe as botas de ditadores. Como se sabe, os apoiadores de Bolsonaro foram às ruas, em várias ocasiões, com um pedido singelo: volta, ditadura. Aqui mesmo em Alagoas, elementos com e sem mandato, engrossaram esse coro da morte. É sempre importante lembrar.

Temos, portanto, um Lula se movendo entre arestas, pressões e tática política para tocar seu jogo. Aceno ao invertebrado mercado, alianças eleitorais e iniciativa à altura do estadista que defende os direitos humanos, ontem e hoje. A ver os desdobramentos dessas três investidas – as mais recentes no radar lulista para públicos diferentes.