Após nove anos, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (25), que portar maconha para uso pessoal não pode ser considerado crime. Os oito dos 11 ministros votaram a favor de tratar o porte da droga apenas como ato ilícito, sem natureza penal. 

A medida propõe avanços, mas precisa ser encarada com cautela, já que não se trata de uma “liberação geral da droga", mas apenas avança para determinar a distinção objetiva entre usuário e traficante, assim como defendeu o ministro Gilmar Mendes, durante julgamento. 

“Se trata apenas de separar o traficante daquele que é apenas usuário. Não se trata de uma liberação geral para recreio ou coisa do tipo. É enfrentar a droga como uma doença mesmo, que precisa de tratamento. É, antes de tudo, um problema de saúde”, disse o ministro.

Para compreender o impacto efetivo da medida na capital alagoana, o CadaMinuto entrevistou um advogado e um jovem negro morador da periferia de Maceió. 

O estudante e compositor, Thierry Renan, de 19 anos, que reside na parte alta da capital alagoana, nasceu e se criou na periferia.  “A maconha é amplamente utilizada por alguns moradores, os quais, em sua maioria, são inofensivos, nunca concordei com sua proibição, principalmente por se tratar apenas de uma planta”, relata. 

O estudante acredita que a proibição resulta na má qualidade da droga e no fortalecimento do tráfico, e ainda equipara o usuário ao traficante. “Com a descriminalização, reduzirá a discriminação dessas pessoas, que, mesmo não sendo usuárias, já são estigmatizadas por serem oriundas da periferia, e também diminuiria o absurso que é penalizar o usuário como se fosse um traficante”. 

Decisão histórica para população periférica

O advogado do Núcleo de Advocacia Racial do Instituto do Negro de Alagoas (Ineg/AL), Pedro Gomes, de 33 anos, destaca que a decisão da Corte é histórica e importante para a população negra periférica de Alagoas. 

“A população negra periférica vai ter pelo menos parâmetro e segurança jurídica, não correrá o risco de ser presa a qualquer momento por portar maconha”, afirma 

Além disso, o advogado defende que o entendimento do STF contribui para o fim da política de guerra às drogas, que elegeu a substância ilícita, o usuário e o traficante como inimigos, mas ao mesmo tempo, promoveu o crescimento das organizações criminosas tanto no Estado quanto no país. 

Para ele, “o primeiro passo é dar fim a essa política de guerras às drogas, e que a gente evolua para um Estado no qual ele priorize a paz e o bem-estar social como a principal bandeira da segurança pública”.

Gomes explica ainda que a decisão impacta diretamente a população negra que reside nas periferias alagoanas. “A gente vê como a discrepância é muito grande entre a quantidade mínima de droga apreendida com uma pessoa branca para uma pessoa negra, para que ela seja usuário ou traficante”. 

“Quando são brancos moradores de bairros nobres, a quantidade de droga apreendida para que essa pessoa seja considerada um traficante é gigantesca. Já com pessoas negras da periferia bastam dois cigarros de maconha, para que ela seja considerada traficante”, pontua. 

Para o advogado, discutir e definir a quantidade para usuário e traficante pode desencadear na soltura de detentos que estão presos no sistema prisional alagoano. “A gente entende que pode acontecer em várias revisões criminais de pessoas que foram presas e estão presas até hoje porque estavam portando quantidades ínfimas”. 

O especialista alerta que é necessário acompanhar os próximos passos da decisão. “A gente vai ter que acompanhar primeiramente, como é que se vai dar os próximos passos. Além disso, verificar também se os órgãos de segurança pública estaduais irão acompanhar o entendimento do STF”.