No último dia 19 escrevi sobre a dura derrota de Arthur Lira ao bancar o PL do estupro como forma de agradar à extrema direita na Câmara. No texto, falei especificamente da repercussão que o caso teria para desidratar o poder político do alagoano no jogo entre parlamento e governo Lula. Como se sabe, Lira quer o apoio do petista na eleição para presidente da Câmara, marcada para o começo de 2025. Mas levou um tranco.

A revolta das ruas forçou o ainda comandante da Câmara a recuar com o PL da excrescência. Medo de mais desgaste político. Mas a repercussão pra lá de negativa desse troço cria outro embaraço para o parlamentar: uma virtual encrenca com a eleição de 2026 em Alagoas. A preocupação eleitoral bateu em sua cabeça. Vai que a coisa se espalhe ainda mais, como é que ficaria a imagem do deputado, já bem queimada?

A hipótese tem todo o sentido diante do que se viu nos protestos. Nas palavras de ordem, nas faixas e cartazes, o PL do estuprador ganhou um nome próprio – o de Arthur Lira. Ele diz que não é o agitador da presepada e tenta se afastar do papel de engajamento pela aprovação. Na verdade, ele foi tudo isso mesmo. Mas, ainda que não fosse, como sabem os marqueteiros, o que pega é a percepção. E aí já era. Hora de conter o estrago.

E agora pense num candidato a senador carimbado com a legenda de entusiasta de um projeto que violenta o direito da mulher ao aborto, mesmo em casos de estupro. E ainda com punição maior para a vítima do que para o estuprador. Mesmo diante de um eleitorado conservador, não é disso que se trata. É a dignidade humana que está sendo agredida por uma ideia descabida e truculenta. O candidato Lira viu o perigo.

Para complicar a situação do presidente da Câmara, além do PL maldito, ele frequenta o noticiário com a volta de uma denúncia de violência doméstica feita por sua ex-mulher. Para reagir, buscou a Justiça com o objetivo de retirar do ar as notícias que o aborrecem. Se deu mal aqui também – porque acaba sendo visto como adepto da censura à imprensa. Erros que podem ser fatais numa eleição que promete um páreo duro.

Claro que 2026 está longe. Mas o tempo da política não segue o calendário gregoriano – de modo que a Terra gira, mas o Sol pode derreter uma candidatura a qualquer hora. Um passo em falso, uma declaração disparatada ou uma proposta com jeito de indecência podem implodir o caminho das urnas. E esse PL, não tenho dúvida, jogará uma sombra capaz de turvar a campanha de Lira daqui a dois anos. Por isso, agora, ele odeia o tema.