Da última sexta-feira (dia 14) para cá, este é o quarto texto que escrevo sobre o assunto. A gravidade do tema pode ser demonstrada em vários aspectos. Equiparar aborto ao crime de homicídio, mesmo em casos de estupro, é apenas uma das indecências no projeto de lei do deputado Sóstenes Cavalcante. Outro item no PL do estuprador prevê prisão de até 20 anos se a mulher fizer o aborto após a 22ª semana de gestação. 

O autor do projeto é um fanático da extrema direita filiado ao mesmo partido de Bolsonaro. O trâmite na Câmara ganhou velocidade porque Arthur Lira decidiu pautar essa vergonha em regime de urgência. A motivação do presidente da Casa é política. Seu gesto é um aceno aos extremistas que ele pretende cooptar para eleger o futuro comando da Câmara. Lira quer fazer o sucessor – e não vê limites para isso.

Nesta segunda-feira, o Senado deu sua contribuição ao espetáculo de baixarias que o parlamento patrocina. A convite do abjeto Eduardo Girão, uma atriz de última categoria foi ao plenário para encenar o “sofrimento” do feto quando há um aborto. Ela ganha dinheiro com esse tipo de trabalho. A foto acima é um flash da sordidez que distraiu senadores. Nyedja Gennari foi ao Senado sensibilizar a turma sobre a “defesa da vida”.

A segunda-feira também foi de novos protestos contra o PL que despreza a vida da mulher e pega leve com estuprador. É uma reação que, como já escrevi, dá um respiro diante da sujeira produzida pelo pior Congresso da história. Nem tudo é letargia, afinal. E veja aí esse nojo no Senado. Nunca houve algo desse nível no ambiente que já foi de debates sobre grandes temas do país. E olhe que o presidente é Rodrigo Pacheco.

Agora pense numa Câmara largada à própria sorte, sob o coronelato de Arthur Lira, vandalizada pelo bolsonarismo e pela direita mais fanática de todos os tempos. A oligarquia legislativa se vê tão poderosa que decidiu avacalhar geral com esse PL do estupro. Deputados equiparam o parlamento a seus latifúndios vigiados por jagunços – no sentido figurado, é claro. Por tudo isso, escrevo de novo sobre o tema.

E escrevo, antes e principalmente, para defender um direito que um dia o país será capaz de reconhecer: o direito fundamental da mulher sobre seu próprio corpo. Hoje parece impossível, mas, com mobilização e coragem pra pensar, os ventos mudam. Coragem nas ideias, luta nas ruas. Como a mulherada está fazendo agora. Eu apoio.