Aborto é assunto de saúde pública. O corpo da mulher é assunto da mulher. É ela quem tem o direito de decidir o que fazer diante de uma gravidez. Aborto não pode ser criminalizado em nenhuma situação. Repito: em nenhuma situação. Uma mulher não faz aborto por esporte. É um trauma. O Estado tem a obrigação de oferecer as condições – dignas e seguras – a uma mulher que precisa recorrer ao procedimento. Proibir o direito ao aborto é coisa de sociedades atrasadas. Uma aberração que precisa acabar.

Suponho ter sido claro. Mas, para que não paire dúvida: interromper uma gravidez é decisão exclusiva da mulher. Se ela decide que o melhor para sua saúde, seu corpo, sua vida enfim, é o aborto, então está decidido. Ao Estado não cabe monitorar – muito menos regular – o que o indivíduo faz com seu próprio corpo. Isso é outra aberração culturalmente enraizada e reproduzida sob diversas formas de crenças, valores e preconceitos. Não viemos ao mundo para terceirizar nossos direitos individuais. 

Não perderei tempo com a canalhice de políticos e médicos que agem como policiais para impedir alguém prestes a fazer um aborto. Há casos de mulheres algemadas à cama de hospital porque um fanático de jaleco decidiu que ela é criminosa – logo num momento traumático da vida. São exemplos trágicos de uma mentalidade gangrenada por ideias parasitas num hospedeiro destituído da liberdade de pensar. 

O tema do aborto agita o noticiário e as ruas após a Câmara avançar com um projeto violento contra um direito da mulher. A bancada do estupro propõe que a vítima de um estuprador seja condenada a 20 anos de cadeia caso realize aborto após a 22ª semana da gestação. A prática seria equiparada a homicídio. Já o criminoso que violenta a mulher pega no máximo 10 anos de cana. É o país voando para trás.

A atual lei do aborto já é bastante restritiva ao direito da mulher. O PL do estuprador – apoiado por Arthur Lira – piora as coisas em níveis cavalares. Sei que diante de fanáticos não adianta argumentar. Mas é necessário lembrar o óbvio. O Estado laico separa religiões dos poderes da República. Pastores desta e daquela igreja não podem impor suas crenças ao conjunto da sociedade. Pregação é para os templos. E para uma patota.

É um alívio ver a reação popular à ideia parida por uma Câmara sem qualidades. Com tudo dominado entre desqualificados no parlamento, resta o caminho do protesto – as redes sociais e, mais importante, as ruas. O excelentíssimo Lira sentiu a fúria da opinião pública – algo que o deputado subestimara. O repúdio a seu nome está em faixas e cartazes Brasil afora. Ele e seus iguais terão de recuar com esse lixo de projeto.