O escritor Albert Camus, autor do clássico A peste, legou ao mundo uma máxima até hoje citada e repetida: 

- Só há um problema filosófico verdadeiramente sério: é o suicídio.

O tema, dos mais delicados para que seja tratado de maneira puramente superficial tem história registrada em livro pelo francês George Minois (História do suicídio) - uma dessas obras que precisam ser atravessadas, por motivos óbvios.

Não por acaso, seguindo a orientação dos especialistas e estudiosos do assunto, há um tratamento especial da imprensa mais responsável ao se deparar com uma possível notícia sobre esse tipo de tragédia. Aliás, hoje quase nunca um fato dessa gravidade chega ao grande público através do jornalismo profissional. É claro que sempre haverá, como em qualquer profissão, quem faça tudo para ser o primeiro a anunciar uma morte tão impactante - a lacração é certa.

O motivo da cautela? 

A capacidade desenvolvida pelos humanos de imitar e mimetizar comportamentos, ainda que assustadores. A literatura universal registra o caso, talvez o mais célebre, de uma obra que teria desencadeado uma onda de suicídios em toda a Europa. Trata-se de Os sofrimentos do jovem Werther, do escritor alemão Johann Wolfgang von Goethe, publicada em 1774, e que produziu grande furor e rebuliço na sociedade ocidental de então.

É um bom livro – ponto. Mas a sua trajetória, trágica, o transformou num veneno para a juventude daquela quadra por, supostamente, provocar uma epidemia de (auto) mortes entre jovens que sofriam das “dores de amor”.  

Pode-se se dizer que ele levou o suicídio à moda?

Parece-me que não seria de todo incorreto fazer esta afirmação. O impacto foi tamanho, após o lançamento e a divulgação maciça no boca a boca, que o livro do atormentado - e ótimo – Goethe chegou a ser proibido em vários países daquele continente “por razões de saúde pública”. 

(Quem nunca quis morrer/Não sabe o que é viver – Mário Quintana.)

Um livro pode estimular alguém a cometer tal desatino?

Prefiro entender que esse companheirão estimula bem mais a viver, se abrirmos a nossa mente para aquilo que ainda não conhecemos, mas que pode iluminar caminhos diferentes dos nossos, que nos conduzam a furar a obscuridade, empurrando-nos para fora da caverna.

Aproveitando a palavra e o tema, há outro registro literário sobre suicídio atrelado a Platão, autor de O mito da caverna. É a história de Cleômbroto (sugiro não batizar um filho com este nome), que teria dado cabo à própria vida ao ler Fédon, obra platônica que trata das últimas horas de Sócrates, filósofo morto ao ingerir sua dose de cicuta após haver sido condenado por Atenas.

Cleômbroto teria saltado de uma muralha por não suportar a perda do mestre ou, outra versão, por levar a sério demais a afirmação de Platão de que a sabedoria só nos chegará plenamente depois da morte. Como usá-la depois do evento? Creio que ninguém há de ter a resposta.

Fato concreto é que Platão que se cuide, com sua sabedoria pós-morte. Ele ainda não escapou da rejeição em bibliotecas improváveis. Caso de uma Universidade de Londres, que recebeu o pedido de um grupo de engajados alunos da Escola de Estudos Orientais e Africanos para que ele, Descartes e Kant fossem descartados do programa do curso por serem “racistas e colonialistas” (Infinito em um junco, Irene Vallejo).

Eu não chamaria isso de proteção à vida.