Na reta final de 2018, quando o país já havia cometido e erro fatal de eleger Jair Bolsonaro, nosso Djavan recebeu uma sondagem para ser ministro do governo que começaria em 2019. Quem faz a revelação é o próprio cantor em entrevista a Bianka Vieira para a coluna de Mônica Bergamo, na Folha de S. Paulo. O autor de obras-primas da música brasileira conta que rechaçou a ideia. Curiosa é a circunstância do convite.

Ele foi abordado quando estava sentado na porta de sua casa na praia de São Miguel dos Milagres. Um sujeito chegou de bicicleta e informou que em Brasília o nome do alagoano era cogitado para comandar o Ministério da Cultura. O emissário da mensagem da turma de Bolsonaro era Gilson Machado, um ricaço dono de pousadas de luxo no litoral alagoano. Machado viria a presidir a Embratur no desgoverno do capitão da tortura.  

Machado, que também foi ministro do Turismo, perguntou ao compositor o que ele achava da proposta. “Eu acho péssimo. Eu não quero ser ministro de nada”, foi a resposta segundo diz o autor de Samurai. “Trocamos mais três ou quatro palavras, e ele foi embora um pouco decepcionado”, acrescenta o ministeriável que disse não.

Mas por que Djavan receberia um convite de Bolsonaro para integrar o futuro governo? O que gerou a proposta inusitada? Há uma explicação desconfortável para o conterrâneo. A origem da investida decorre certamente de uma entrevista que Djavan dera dias antes. Ao falar sobre o governo eleito, ele expôs sua expectativa, afirmando estar “otimista”.

Foi um cataclisma. Djavan foi alvo de uma campanha de “cancelamento”, tratado como bolsonarista. O caso o deixou aperreado. À Folha, ele fala do episódio. “Aquilo foi terrível. Desmentir, na internet, não existe. Quanto mais você desmente, mais aquilo ganha força. O que vale para as pessoas é questionar alguém que não tem culpa no cartório”.

Ele reafirma seu compromisso com a democracia e diz que, sob Bolsonaro, vivemos um tempo de “obscurantismo”. Afirma ainda estar satisfeito com o governo Lula. O poeta da música também celebra o reconhecimento do negro em espaços de prestígio no que chama, acertadamente, de “refundação de valores”. Um cara antenado com seu tempo.

A verdade é que, sem oportunismo barato como muitos fazem, o artista sempre se mostrou alguém com ideias arejadas – progressistas, para usar o termo consagrado. A reação ao convite indireto para ser ministro confirma suas boas escolhas. Aos 75 anos de idade, ele segue nos palcos do mundo mostrando por que é um gênio brasileiro.