Parece coincidência, mas não é. Primeiro veio a notícia do balneário de Neymar para uma faixa do litoral nordestino entre Alagoas e Pernambuco. Escrevi sobre isso em texto anterior. Agora vem a segunda notícia: o Senado começou a debater uma Proposta de Emenda Constitucional que retira da União a propriedade de áreas de marinha. O tema foi pauta de uma audiência pública realizada no Congresso na última segunda-feira.

Pela PEC, os terrenos passam para o controle de estados, municípios ou empresas privadas. É o sonho dos Bolsonaro e da família do jogador em decadência. A marmota já foi aprovada na Câmara em janeiro de 2022 e agora pode avançar na outra casa do parlamento. É evidente que se trata de uma investida para negócios milionários em busca de lucro com o turismo predatório. Um desastre para o meio ambiente.

O projeto imobiliário de Neymar e companhia recebeu dos próprios donos do dinheiro o bizarro título de Caribe brasileiro do Nordeste. Esse é o lado vulgar da empreitada. O grave mesmo é o impacto devastador que isso pode trazer para a região e os grupos que hoje vivem nos lugares a serem afetados. Ambientalistas condenam a iniciativa. 

Voltemos à negociata com as terras da União. Como não poderia ser diferente, a extrema direita abraçou a causa com a convicção dos fanáticos. Mais um debate no pântano do negacionismo e da pregação de falsidades. Relator e entusiasta da PEC, o senador Flávio Bolsonaro diz que “é a maior reforma agrária que a gente pode ter no Brasil”.   

O cinismo acrescenta um aspecto que parece lateral, mas esconde intenções silenciadas, ainda que bem conhecidas. A reforma agrária de Flávio e Neymar expulsa comunidades de pescadores, pequenos proprietários e comerciantes – e demarca “assentamentos” para condomínios fechados, pousadas de luxo, resorts e cassinos. Um espetáculo de expropriação em nome de interesses do capitalismo abrutalhado.

Em algumas áreas do litoral alagoano, o acesso ao mar não é livre. E isso é uma realidade há muitos anos. Roteiro (Sul) e Passo de Camaragibe (Norte) têm faixas de areia cujo acesso só é permitido com pagamento de uma taxa. Em outros casos, você tem que se cadastrar antes de cruzar uma porteira. Citei dois municípios, mas a mesma situação está em muitos outros. A praia é de todo mundo? Hoje não mais. E pode piorar.

Agora imagine se a combinação PEC do Flávio & Balneário do Neymar vingar. Aí, meu amigo, pode pegar seu bote e procurar uma beira de rio longe dos bacanas caribenhos que já estão babando à espera dessa maravilha. Tragédia climática a gente vê depois.