O mundo debate o que fazer com a compulsão de crianças e adolescentes pelo celular. Um livro lançado nos Estados Unidos é notícia de destaque na imprensa brasileira. Depois de reportagens nos grandes jornais, vi o tema ser abordado pelo Fantástico na noite deste domingo. Salvo engano, o autor Jonathan Haidt defende que até os 16 anos ninguém faça parte de uma rede social. Muita gente acha que isso deveria ser lei.

Na pré-história, antes da geração Z e outros grupos de fanáticos por tecnologia e interações virtuais, as famílias pregavam os filhotes diante da televisão. Desenhos animados, palhaços e rainhas de baixinhos, entre outras substâncias psicotrópicas, garantiam a distração dos seres incontroláveis. Naquele tempo, educadores e psicólogos também pintavam um futuro devastador às pobres criaturas hipnotizadas por telas de TV.

Aliás, é uma ironia ver a Globo preocupada com a saúde mental de criancinhas – chapadas com o uso desregrado de smartphones. Quando a maldição era a dependência televisiva, a maior rede do país não demonstrava esse cuidado com a formação das novas gerações. Era o contrário. Sobre isso, recorro a uma informação obtida diretamente da cúpula da emissora – especificamente da direção de jornalismo.

Lá pelo fim dos anos 90, num dos encontros nacionais com diretores de afiliadas de todo o país, um mandachuva da TV Globo criticou uma emissora estadual por causa de uma reportagem. A afiliada havia exibido uma matéria sobre os males que o excesso de tempo diante da TV poderia representar para as crianças. Afirmo isso porque eu estava no tal encontro, na condição de diretor de Jornalismo da TV Gazeta de Alagoas.

A bronca, como você pode imaginar, saiu em forma de piada. Alguma coisa assim: tudo bem, a gente se preocupa com nossos filhos, sim; ocorre que mais importante é a audiência de nossos telejornais e demais produtos da Globo. Todo mundo achou engraçado. Mas o recado era uma reprimenda – e uma regra. O altruísmo e a conduta ética valiam até o limite de atrapalhar nossos interesses. Primeiro os negócios e a grana. 

Sobre o celular e as redes, querem conter a fixação mental da garotada. Tudo bem. Mas quem vai cuidar da loucura coletiva dos pais e das mães, das senhoras e dos marmanjos? Se até as aventuras sensoriais ampliadas são vividas por telas e conexões, impossível recuperar os adultos. E olhe que o metaverso está apenas começando.