“Nós vamos pra cima da Braskem”. Era o que dizia um valente João Henrique Caldas na campanha eleitoral pela prefeitura de Maceió, em 2020. A frase de efeito se referia ao afundamento de bairros da cidade, em decorrência das atividades da multinacional. Eleito para comandar os destinos da capital, pode-se dizer que JHC cumpriu a promessa – mas de um jeito bem particular. Foi pra cima, e a Braskem gostou.

Quase quatro anos depois, a empresa já repassou à prefeitura 950 milhões de reais de um total de 1,7 bilhão. Essa montanha de dinheiro, como se sabe, é fruto de um acordo assinado entre as partes em julho do ano passado. Pelo acordado, o repasse foi dividido em seis parcelas. A primeira foi de 600 milhões, depositados dias após a assinatura da papelada. O fluxo está sendo cumprido à risca.

A segunda parcela, de 100 milhões, foi depositada em dezembro de 2023. Em 15 de abril deste ano pingaram nos cofres do município mais 250 milhões de reais, correspondentes à terceira parcela. No dia 15 de julho, vem o quarto depósito, com mais 250 milhões na conta controlada pelo prefeito. As duas últimas parcelas, também de 250 milhões cada uma, serão depositadas em 15 de outubro e 15 de dezembro respectivamente.   

A última parte pode ser prorrogada para até 15 de abril de 2025, caso a Braskem, por alguma razão, assim o deseje. Para isso, basta comunicar à prefeitura até 15 de dezembro deste ano – sem precisar explicar motivos. É uma decisão unilateral da empresa, com a qual a prefeitura concordou. Esses dados estão no conjunto de 18 páginas – um documento público – que detalha os termos do acordão entre as partes.

Para receber a fortuna bilionária em pleno ano eleitoral, a prefeitura garante à Braskem que jamais contestará qualquer ponto do acordo, não importa o que aconteça. Vários itens reiteram esse aspecto. Um exemplo: “A resolução deste Termo de Acordo, por qualquer motivo, impede que as tratativas aqui previstas sejam utilizadas por uma Parte contra a outra em juízo ou fora dele”.

Em entrevista em dezembro do ano passado, o prefeito disse que o item 3.8 do documento não isenta a mineradora por possíveis danos no futuro. Bom, era só o que faltava! Na verdade, o que esse item prevê é que, no caso de ampliação da área considerada atingida pelos danos, “as Partes se reunirão para discutir, de boa-fé, eventuais impactos ao Município, decorrentes dessa ampliação”.

Ao ler o que está escrito em cada página, não resta dúvida: a Braskem comprou parte da cidade em que vivemos. Com paciência para vencer o idioma da burocracia, cheio de volteios do pior juridiquês, está claro que a empresa tem plenos poderes sobre o destino de toda a área desocupada. E tudo isso tem o aval e a assinatura do prefeito. É um documento para a História. E merece estudo minucioso.