Parece roteiro obrigatório. Nos últimos anos, jornalistas demitidos das redes de TV no Brasil, principalmente da Globo, escolheram o YouTube para desancar o antigo empregador. Nessas ocasiões, os entrevistados enfiam o pé na jaca, sem medo de passar vergonha, num inquietante espetáculo de constrangimento. É estranho ver profissionais consagrados voluntariamente expostos ao ridículo.
Um dos casos de maior visibilidade foi o da repórter e apresentadora Carla Vilhena (foto). Numa entrevista de mais de três horas ao podcast Inteligência Ltda., ela ignora qualquer parâmetro para a falta de bom senso. A pretexto de revelar bastidores de seu trabalho na TV, Vilhena fala mal dos ex-colegas de redação enquanto se vangloria – como se fosse o maior nome do telejornalismo brasileiro. É doloroso de assistir.
Demitido no ano passado, o repórter Eduardo Tchao também apareceu num podcast com o mesmo entusiasmo para o vexame. Mais uma vez, o que se vê é uma enxurrada de autoelogios, com uma naturalidade de causar espanto. Com a mesma ênfase, sobram maledicências para pessoas que até poucos dias antes integravam sua equipe de trabalho.
O circo de pouca ética e muita patetice não estaria completo sem as lágrimas. Ao menos dois rapazes seguiram essa trilha com desassombro. Ivan Moré e Bruno Laurence, nomes conhecidos no jornalismo esportivo, caíram no choro enquanto debulhavam suas agruras pela perda do emprego. Nesses casos, sim, é a tática do vitimismo usada como recurso de convencimento. A dor de “homens sensíveis” arrasados pela maldade global.
Além de entrevistas a podcasts no YouTube, todos os dispensados postaram aqueles textos medonhos em suas redes sociais. Em tom solene, num claro assédio moral contra a Linguagem, partem para “reflexões” num estilo que deveria render internação compulsória. É um oceano de platitudes do tipo “aquele menino que saiu do interior nunca desiste de seus sonhos”. Socorro!
Os jornalistas citados (e muitos outros) são o que são porque trabalharam por décadas na Globo. Além do talento e dos méritos inegáveis, em boa medida ganharam prestígio pela marca da emissora. (Agora sou eu a recalibrar o clichê que bate à porta: não é bonito cuspir no prato após a refeição).
Sair falando mal de todo mundo depois de ser demitido é um gesto de autossabotagem – e, em alguns casos, põe em dúvida o caráter de quem o faz. Mas somos assim. Movidos pelo fígado e pela cordialidade (alô, Sérgio Buarque), liquidamos a razão. Para completar o desastre, quando a vaidade encontra o ressentimento, já era.