Já caiu no senso comum que investimentos públicos em Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação garantem a solidez da construção de uma sociedade mais preparada para o enfrentamento dos dilemas do desenvolvimento econômico, da preservação ambiental e da justiça social. 

Qualquer turista brasileiro que reúne as possibilidades de tempo e recursos para desembarcar em algum país de primeira linha, da Europa, da América do Norte ou da Ásia, perceberá em tudo ao seu redor que a evolução da sociedade, além de depender de um pacto social de solidariedade e respeito às regras institucionais do jogo democrático, ali onde esse é o regime político prevalecente, também não prescinde dos avanços ao acesso dos bens públicos ou privados, nas formas material e em serviços. Esse acesso pode ser garantido por um contrato social, onde indivíduos, grupos de interesses e classes sociais contribuem para a produção da riqueza nacional e, também, participam da luta e das disputas pela repartição dela.

Na base de todo esse processo, encontra-se a formação das pessoas e os avanços e aperfeiçoamento das forças produtivas. Dois aspectos que não abrem mão de investimentos duradouros em educação e ciência, básica e aplicada. 

Muito recentemente, o Brasil perdeu um precioso tempo e uma oportunidade espetacular para ter dado saltos de qualidade naquelas áreas e aproveitado os desafios impostos pela pandemia da Covid-19. Desde 2015, os investimentos em ciência, tecnologia e inovação despencavam. Esse movimento foi agravado no governo de Jair Messias Bolsonaro, ao ponto de promover quase um colapso do fomento à ciência no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e no seu braço executivo, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

As restrições orçamentárias e os bloqueios financeiros, motivados pelo total desprezo da gestão Bolsonaro pela educação e ciência, fizeram o pais recuar, gravemente, durante o período. O Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), gerido pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), que conta com contribuições das atividades econômicas, serviu de reserva de contingência para contribuir com as metas de superávit primário do governo federal, com grande parte de seus recursos desviados para o pagamento de juros pelo Tesouro Nacional ao sistema financeiro-bancário.

Pelo lado da Educação, não é preciso argumentar muito quando testemunhamos o rodízio em torno da cadeira de Ministro, entre – nada mais, nada menos – quatro indivíduos. Um outro quase assumiu, mas foi impedido pelo escândalo de fraude em seu currículo. Não há dúvida que a inconsistente gestão na pasta teve consequências na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), agência vinculada ao Ministério da Educação (MEC), responsável pelo financiamento, pelo acompanhamento e pela avaliação de mais de 4,5 mil Programas de Pós-graduação stricto sensu e cerca de 7 mil cursos, entre Mestrados e Doutorados. Esses programas permaneceram na míngua, durante a era Bolsonaro, quase fechando as portas, em razão dos cortes de bolsas para os estudantes, da defasagem nos valores e da completa falta de recursos para o seu custeio. Não quero nem entrar no caso do orçamento das universidades públicas federais, nas quais cerca de 90% desses programas estão alocados e onde quase chegou-se ao nível de ter serviços básicos cortados, como fornecimento de energia, água e vigilância.

Ou seja, o governo Bolsonaro foi uma verdadeira tragédia para a sociedade brasileira e, mais ainda, para a Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação. Isso não pode ser jogado para debaixo do tapete, jamais. 

A situação das instituições que produzem conhecimento e da comunidade científica brasileira escapou, em parte, do total colapso, graças aos esforços e ao empenho dos governos estaduais, por meio de uma rede bastante sólida de agências públicas responsáveis por fomentar e executar as políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação locais, as chamadas Fundações de Amparo à Pesquisa (Faps).

O país conta com uma importante rede de fomento à ciência estadual, que ganhou amplitude logo após a Constituição de 1988, quando foi inserido na Carta Magna o capítulo da CT&I. Entretanto, a primeira e mais importante agência estadual foi criada por Lei Orgânica em 1960: a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Começou a funcionar, plenamente, a partir do Decreto 40.132, de 23 de maio de 1962. Uma década separa a criação da Fapesp do CNPq (1952), o que demonstra como a elite paulista, à época, foi motivada por grandes ambições no desenvolvimento humano e conhecimento técnico-científico. E a história do estado, desde então, não contraria esse ponto. As maiores universidades do país encontram-se em solo paulista, com destaque para as três estaduais: Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade Estadual Paulista (Unesp). 

A receita do sucesso da Fapesp e que contribuiu, decisivamente, para a robustez do sistema paulista de produção científica e desenvolvimento tecnológico está no Artigo 123 da Constituição Estadual: “O amparo à pesquisa científica será propiciado pelo Estado, por intermédio de uma fundação organizada em moldes a serem estabelecidos por lei [...] Anualmente, o Estado atribuirá a essa Fundação, como renda especial de sua privativa administração, a quantia não inferior a meio por cento de sua receita ordinária” (grifos nosso). Na Constituição Estadual de 1989, esse percentual se elevou para 1%. 

Este é o verdadeiro esteio do sucesso de São Paulo nas áreas de CT&I e de suas instituições de pesquisa. Padecemos de algo igual no nível federal, o que deixa o sistema nacional muito vulnerável aos governantes de plantão que não tenham compromissos com Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação, ou as vicissitudes da dinâmica macroeconômica. 

Como falamos acima, entre 2015 e 2022, o fomento à ciência no país contou com os esforços das fundações estaduais. Nesse contexto, a decisão governamental e as estratégias de gestão fizeram toda a diferença para tornar a Fundação Estadual de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal) muito mais atuante no enfrentamento dos primeiros sinais de recrudescimento do papel constitucional do Estado nacional no financiamento à Ciência, Tecnologia e Inovação. 

Quatro variáveis foram fundamentais para que a Fapeal expandisse suas linhas de ação, criando mais programas de fomento: a) o saneamento das finanças públicas e a recuperação da capacidade de investimentos; b) a decisão política de privilegiar, gradativamente, o orçamento público estadual da CT&I e sua execução financeira; c) a formação e a reunião de uma equipe técnica e com capacidade executiva na Fundação, com baixa rotatividade e elevado nível de formação, aproveitando ao máximo os servidores públicos; e, d) a construção e a conquista de espaços institucionais, intra (estadual) e intergovernamental (federal), com o estabelecimento de parcerias, cooperações e ocupação de espaços de representatividade, especialmente em âmbito nacional. Sobre esse último ponto, cabe destacar o papel que exerce o Conselho Nacional de Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap) e o Conselho Nacional de Secretários para Assuntos de Ciência, Tecnologia e Inovação (Consecti).

De 2015 a março de 2023, o Governo do Estado de Alagoas, por meio da Secti-Fapeal, lançou 90 editais públicos. São editais que atendem aos 13 programas vigentes da Fundação e mais outros que a Secti executa, principalmente no sentido da promoção do desenvolvimento de empresas de base tecnológica e formação de jovens para áreas de tecnologias. Todos esses editais, há de se ressaltar, foram rigorosamente cumpridos e executados, algo raro de se ver em políticas públicas. Por exemplo, no nível federal, ao longo dos últimos quatro anos, vários editais lançados pelo MCTI/CNPq foram ameaçados em razão dos cortes e dos bloqueios orçamentários e financeiros. Alguns sequer foram contratados, ainda, após a divulgação dos resultados das propostas contempladas.

Somente com recursos do Tesouro Estadual, a Fapeal executou, ao longo desses oito anos, R$ 105 milhões em programas de bolsas de estudos (iniciação científica e tecnológica, mestrado, doutorado e pós-doutorado), fomento a pesquisas (mais de mil projetos financiados) e subvenção econômica (cerca de cem jovens empresas apoiadas com financiamento para desenvolver ideias criativas e projetos inovadores). Esse valor agregado aos convênios e termos de cooperação ultrapassa os R$ 130 milhões em investimentos.

Para efeito de resultados, no tocante à pesquisa científica fomentada pela Fapeal, existem, atualmente, 77 projetos em desenvolvimento na área de Ciências Agrárias envolvendo aproximadamente R$ 7 milhões. Uma carteira de conhecimento científico estratégica que pode ter implicações decisivas e resultados aplicáveis não somente para atender às necessidades e demandas de conhecimento do homem e famílias do campo, mas, também, para segmentos e cadeias produtivas da agricultura alagoana. Na área de Ciências da Saúde, há mais de uma centena de projetos de pesquisa – alguns deles de referência nacional. Em 2018, a Fapeal ganhou o segundo lugar no Prêmio em CT&I para o Sistema Único de Saúde (SUS), promovido pelo Ministério da Saúde, por apoiar um projeto de pesquisa na fronteira do conhecimento nessa área. 

No momento mais raso das condições de financiamento à pesquisa no Brasil por parte do governo federal, o Governo de Alagoas, por meio da Fapeal, foi responsável, entre 2020 e 2022, por mais de 80% do financiamento de todos os projetos de pesquisas da comunidade científica do Estado, ficando em sétimo lugar no país, em termos proporcionais, logo atrás de São Paulo, da poderosa Fapesp, e em segundo lugar no Nordeste, atrás, somente, do Ceará, exemplo de investimentos em Educação. Esses dados foram preparados pelo Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap) e podem ser conferidos no quadro abaixo.

O Programa de Concessão de Bolsas de Estudos (Mestrado e Doutorado), nesses últimos anos, complementou as ações federais no estado. Esse complemento foi fundamental para que 53% de todos os estudantes matriculados nos 51 Programas de Pós-Graduação e 75 cursos entre Mestrado e Doutorado contassem com bolsas estudos. No mesmo levantamento realizado pelo Confap, entre 2020 e 2022, Alagoas foi o segundo estado do país em cobertura proporcional de alunos com bolsas na pós-graduação, ficando atrás, somente, do Estado do Amazonas (ver quadro a seguir).

A política e os esforços em CT&I em Alagoas fizeram toda a diferença, com a Fapeal se destacando entre as fundações nordestinas, conforme o quadro abaixo.

No quadro seguinte, vemos a contribuição de cada agência estadual no fomento à ciência em cada Estado da Federação. Observe que, em Alagoas, a Fapeal teve um peso um pouco superior ao da Capes e bem maior que o do CNPq, as duas principais agências federais. O conjunto das políticas de fomento empreendido pela Fapeal (bolsas, fomento à pesquisa e subvenção econômica) colocou Alagoas em nono lugar do país em contribuição ao desenvolvimento da Ciência, Tecnologia e Inovação e o segundo no Nordeste, bem à frente de estados com maiores capacidades de investimentos públicos e Produto Interno Bruto (PIB). Isso foi resultado de decisão política e estratégica.  

O impacto desse fomento pode ser avaliado, por exemplo, pela evolução de qualidade e conceito dos Programas de Pós-Graduação (PPGs) acadêmicos em Alagoas. Na última avaliação quadrienal (2018-2020) realizada pela Capes, e divulgada no ano passado, dos 42 PPGs acadêmicos, 16 deles subiram de conceito, em uma escala de 2 a 7: 10 PPGs de conceito 3 para 4; 5, de 4 para 5; e 1 de 5 para 6. Não obstante todo o esforço das instituições de Ensino Superior de origem desses PPGs, bem como do seu quadro de docentes, servidores e alunos, nada disso poderia acontecer sem o esteio da Ciência: o fomento e a sua previsibilidade. Agora, todos os PPGs que evoluíram para o conceito de 3 para 4 já estão habilitados a apresentar propostas para criação de Doutorado. Isso é um grande avanço para o estado.

Na parte de fomento ao empreendedorismo e criação de empresas de base tecnológica, a política de CT&I em Alagoas vive um momento muito auspicioso. O Centro de Inovação do Tecnológico do Jaraguá foi inaugurado no ano passado e já encontra-se completamente ocupado por empresas de pequeno e médio porte. Nele, são gerados mais de 750 empregos diretos, com salários muita acima da média do mercado de trabalho local, e centenas de jovens têm usado suas áreas comuns como coworking para desenvolver projetos e como espaço de convivências para cambiar ideias. 

O conjunto de programas voltados aos empreendedores, como o Centelha da Inovação e Tecnova (em parceria com a Finep), Geração do Hoje Indústria e Seviços (GdH Indústria e GdH Serviços), Lagoon Startup e Mentoring Team, está fazendo a diferença em Alagoas, tanto na formação da cultura empreendedora e tecnológica como no fomento à criação de empresas de base tecnológica, na capacitação e na aceleração das mesmas. Nesses programas, nossas parcerias institucionais têm sido fundamentais, especialmente com Senai, Sesi, Sebrae, IEL/FIEA, Universidade Federal de Alagoas e várias faculdades.

Os programas OxetechLab e OxetechWork estão tornando os sonhos de muitos jovens, de várias partes do estado, uma realidade factível. No primeiro, sete laboratórios distribuídos em municípios pelo interior são responsáveis por ofertar cursos básicos de programação e linguagem, principalmente para estudantes do Ensino Médio matriculados em escolas públicas. Várias plataformas são trabalhadas gratuitamente e, recentemente, a Microsoft esteve interessada no programa e nos convidou (Secti e Fapeal) para uma reunião em sua sede, em Brasília, para discutir a incorporação de suas ferramentas de capacitação no programa. 

Por sua vez, o OxetechWork é um programa de inserção desses jovens já capacitados no mercado de trabalho, onde o Governo do Estado, por meio da Secti, da Fapeal e de editais públicos, oferta bolsas no valor de R$ 1,5 mil, por seis meses de duração, para que eles possam fazer estágios em empresas que demandam conhecimentos nas áreas de tecnologias. Essas empresas selecionam esses jovens e têm o compromisso de absorvê-los após o término do período das bolsas. Para nossa surpresa, as empresas estão contratando esses jovens antes do término do período de bolsas. Em dois editais, mais de 200 jovens já foram inseridos em um mercado de trabalho exigente e com perfis salariais muito acima da média geral. 

Nesse dia 13 de abril, no Centro de Inovação do Polo Tecnológico do Jaraguá, o Governador de Alagoas, Paulo Dantas, lançará o Programa Mais Ciência, Mais Futuro Alagoas. Em mais uma ação estratégica arrojada, o governo anunciará um pacote de investimentos, para os próximos quatro anos, de, aproximadamente, R$ 200 milhões em Ciência, Tecnologia e Inovação. Somente nessa primeira rodada, serão oito editais que somam mais de R$ 30 milhões em bolsas de iniciação científica para estudantes do Ensino Médio da rede pública e da graduação em universidades; bolsas de Mestrado e Doutorado; apoio à realização de eventos acadêmicos, científicos e tecnológicos; apoio a viagens de pesquisadores para participar de eventos científicos; apoio à produção de livros acadêmicos; e apoio à publicação de artigos científicos.

Com esses editais lançados na gestão governamental de Paulo Dantas nessa primeira etapa, Alagoas alcançará a inédita marca de 100 editais de fomento à Ciência, Tecnologia e Inovação, promovidos em menos de uma década, e cumprirá os compromissos assumidos para os 100 dias de governo nessas áreas.

As sementes estão sendo plantadas em Alagoas e as colheitas acontecendo. A Política Pública de CT&I, muitas vezes, é incompreensível para o cidadão comum, mas seus resultados, na forma de conhecimento e desenvolvimento tecnológico, chegam muito rápidos à sociedade, na forma de melhores e mais eficientes culturas agrícolas; novos procedimentos médicos; filhos e filhas bem formados e contribuindo com o desenvolvimento econômico e social; uma sociedade mais crítica e zelosa com o Estado Democrático de Direito e com as liberdades; e, mais tolerante. Até a formulação, a execução e o acompanhamento das políticas públicas, nos níveis estadual e municipal ganham com essa política. 

Alagoas ainda padece de graves problemas estruturais, como a questão do elevado nível de analfabetismo e injustiça social. Investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação, no plano local, são elevados para um estado com tantas prioridades como o nosso. Mas, com toda a certeza, as possibilidades de reversão desse perverso quadro social serão muito, mas muito menores, se eles não forem realizados e de maneira perene.