Quando fui visitá-la em seu território, o Quilombo Lagoa do Algodão, no município alagoano de Carneiros ela mal levantava os olhos. O horizonte vivia pregado no chão feito magnetismo repressor que domestica as possibilidades de voos, até, mesmo aqueles mais rasantes.
Quando a conheci, tem cerca de 10 meses, os sonhos da moça viviam soterrados em impossibilidades, construídas pelo racismo estrutural, que estava lá, mas, não dizia seu nome. Um sabotador. A realidade possível era o sol escaldante do sertão perturbando o juízo.
Ela é uma dessas lideranças natas, que, ao não serem incentivadas,vão ficado por ali mesmo, à margem do mundo, engolindo e naturalizando a mesmice da vida.
Quando a vi, comandando, mesmo que, timidamente, suas companheiras de saga no Quilombo, percebi de imediato o poder de mobilização/liderança e tomei-a sob meus cuidados.
Essa ativista ,como a mais velha faz a transmissão de experiências à mais nova. Continuidade de caminhos…
Com ela exercito a arte de ressignificar a história , falar sobre trilhas e desvestir o impossível.
Incentivada, a líder quilombola, criou o Coletivo Cultural Quilombo de Saias e aprendeu a dialogar com gestores. Agora caminha com os olhos postos em horizontes que brilham. Vai se fazendo referência.
Nunca baixe os olhos, quando conversar com outra pessoa- sempre recomenda essa ativista, que se faz madrinha.
A peleja na busca de conhecimentos, ainda é grande, mas, indiscutivelmente, é uma mulher preta, quilombola que desafia o imobilismo e vai fazendo revoluções/transgressões na própria alma e n’almas alheias.
Dia 08 de abril ao lado de autoridades, como a deputada estadual Fátima Canuto , Ziane Costa prefeita do município de Delmiro Gouveia , Lucinha Vilela, secretária municipal da mulher do município de Carneiros e outras contempladas, essa brava quilombola foi homenageada com o “Prêmio Sertanejo Maria Bonita” pelo Coletivo Maria Bonita, feito estímulo, por sua disposição de seguir adiante..
Salve, Kelly Damasceno, mulher quilombola alagoana com nome e sobrenome!
Essa ativista tem um orgulho danado de ajudar a parir para o mundo todinho uma preta potência.
Estimada afilhada nunca baixe a cabeça e lembre-se, sempre, sempre, sempre a nossa luta é coletiva, e o lema é nós-por-nós.
E que 2024 nos aguarde.
Ubuntu!
Se mulheres pretas não se derem as mãos quem dará?