A decisão do ministro Edson Fachin de anular todas as condenações impostas pela Justiça Federal do Paraná ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pela Operação Lava Jato, gerou imediata repercussão no campo econômico brasileiro.

Ranulfo Paranhos, cientista político e professor na Universidade Federal de Alagoas (Ufal), analisa as movimentações políticas ocorridas na última semana e o prosseguimento da disputa eleitoral para as próximas eleições.

Ao CadaMinuto, Ranulfo destaca alguns efeitos iniciais do retorno de Lula ao cenário político como possível candidato à presidência. “É óbvio que o governo federal sentiu a presença de um jogador que tem, basicamente, seu mesmo percentual de apoio. Estou falando dos 30% de Bolsonaro, que é mais ou menos o que o PT com Lula teria se as eleições fossem hoje”, afirma.

“A gente tem dois jogadores: um com a caneta na mão e o outro se apresentando como principal jogador de oposição. Claro que existem outros, mas quando digo principal é porque ambos possuem poder representado por intenção de voto”, explica.

Ainda sobre as mudanças esperadas a partir desse novo cenário, Paranhos espera que ocorra um rearranjo nas alianças partidárias. “Existe quem vai fechar momentaneamente com o PT, os partidos que se aliarão ao presidente da república e os que tentarão montar uma terceira via. (...) Já existe o centrão, mas o centrão não é partido, é uma coisa sem forma que não sabemos agora como irá funcionar. Do ponto de vista partidário, a gente sabe que rearranjos acontecerão. O próprio PT disse que vai negociar e já iniciou as negociações com PL, PSD e PSB”, destaca.

“Agora, você tem um PT com um pré-candidato à presidência, que ora pesquisa aponta em primeiro lugar, ora aponta em segundo lugar. Na ciência política temos algo chamado ‘correlação de força’, na qual quem tem mais força manda. Nesse sentido, o PT vai buscar aliados no sentido de formar uma chapa, mas esses aliados precisam entender que a cabeça de chapa pertence ao PT, o candidato à presidência da república é o ex-presidente Lula e isso é inegociável. Para o resto, há negociações”, completa.

Diante das discussões sobre a existência de uma polarização no cenário político brasileiro, o professor fala sobre a existência de uma terceira via. “Essa decisão vai encontrar os apoiadores e aqueles que a rejeitam, isso é natural. Do ponto de vista político, há quem seja a favor do Lula e quem o rejeite, assim como os que defendem o atual governo. Existe também uma terceira via, pretendendo lançar um terceiro candidato, quer seja Doria, Luciano Huck ou Luiza Trajano. Esse outro caminho está sendo chamado de frente ampla”, diz.

O Partidos dos Trabalhadores divulgou que entre os dias 8 (anulação das ações contra Lula) e 10 (entrevista de Lula em rede nacional) de março houve um aumento de 828% nas filiações ao Partidos dos Trabalhadores, se comparado à semana anterior (1 a 7 de março).

“O retorno de Lula é, sobretudo, uma tábua de salvação para o PT, que investiu em 2018, até o último momento, na candidatura do ex-presidente antes de Haddad. (...) O número de filiados do PT sempre é maior, é um partido atrativo, que controla, coordena e está em sindicatos. Estes “pertencem”, por assim dizer, às esquerdas. Então é natural essa injeção de ânimo, é o movimento festivo, a esquerda festiva faz isso. Para eles, tem dado certo”, declara Ranulfo.

“Do outro lado você tem um governo federal que não tem muita coordenação e controle. É tanto que o presidente da república nem partido tem e não conseguiu criar o seu partido”, relata.

Paranhos lembra que, apesar dos últimos acontecimentos movimentarem o debate político no país, o cenário está em aberto no futuro. “Mesmo quem não é do meio jurídico precisa levar em consideração que os processos foram anulados, mas a operação não. Isso não quer dizer que o Lula é inocente, nem que ele é culpado. Quer dizer que está no limbo jurídico. O processo vai ser encaminhado para uma vara federal em Brasília e é possível que parte dessa operação tenha prosseguimento ou que tudo comece do zero”, finaliza.

Cenário político

“Analisando o mercado financeiro, o momento é de alerta, dada algumas pautas de centro-esquerda que caracterizaram os governos petistas entre 2002 e 2016, que vão de encontro aos governos Michel Temer e o realizado pelo Presidente Bolsonaro até o momento, isso explica os indicadores comumente utilizados pela imprensa especializada”, diz Anderson Henrique, economista e professor da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

Ele lembra, também, que as reformas econômicas que já foram aprovadas, seguiriam outra trajetória a partir de uma possível vitória da candidatura do petista. “Isso implicaria em uma diminuição nos fluxos de capitais no curto prazo, com evasão de divisas. Nos médio e longo prazo, uma diminuição nos ritmos de investimentos privados poderia ser observada, embora seja prematuro estabelecer uma visão finalística”, explica Anderson.

Na atual conjuntura, o economista observa que a relevância do ex-presidente Lula ganhou fôlego nos últimos dias no cenário político interno e externo. “Poderemos observar singelas modificações na pauta política e econômica do atual presidente, que tende a influenciar diretamente a economia. Não creio numa forte guinada na condução econômica orquestrada pelo ministro Paulo Guedes, mas questões ligadas a renovação do auxilio emergencial e a ampliação da imunização avançaram rapidamente, que demonstra uma possível mudança na ‘cara’ do governo”, destacou.

Anderson Henrique avalia ainda que um governo de esquerda com forte presença de centro traria outro cenário para a economia brasileira.  “Aumentaria as chances de uma vitória dessa chapa, com pautas que seriam mais simpáticas ao mercado. Todavia, a ampliação de pautas desenvolvimentistas e ligadas a população de baixa renda também ganharia notoriedade, algo mais que necessário na retomada pós-pandemia”, finaliza.

“Efeito Lula” no mercado financeiro

Luciana Caetano, economista e professora da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), aponta que o setor mais difícil de prever é o mercado financeiro. “Para fazer qualquer aposta sobre o mercado financeiro, é preciso definir o fato ao qual uma possível mudança estaria relacionada. Por exemplo: se Lula ganhar as eleições, se a regulação sofrer essa ou aquela alteração, se as privatizações de estatais forem canceladas e, assim, por diante”, afirma a economista.

Ela avalia que em curto prazo haverá grande nível de incerteza entre empresários em relação ao petista. “As reformas implantadas desde 2016 afetaram profundamente as condições de sobrevivência da classe trabalhadora e dos mais vulneráveis, classes prioritárias nos governos Lula e Dilma. Para grande parte do empresariado brasileiro, quanto mais explorada a classe trabalhadora, maior sua rentabilidade, apesar do equívoco desse raciocínio”, diz a professora.

Segundo a economista, a incapacidade de crescimento da economia brasileira não está relacionada aos encargos sociais, mas à incapacidade de consumo das famílias. Ela analisa que quanto mais concentrada a renda e quanto menor a capacidade de consumo, menor o potencial de crescimento dos investimentos privados.

Ainda de acordo com Luciana Caetano, em médio prazo os ânimos vão se acalmar pela capacidade de diálogo e articulação política do ex-presidente Lula.

“Durante seu governo, os empresários alcançaram a melhor fase do século 21 e, após o golpe, constatou-se a incapacidade dos que assumiram o governo em dar respostas, paralisando a economia por longos cinco anos. Mesmo para um antilulista, no campo da racionalidade, ter Lula de volta é a melhor aposta que o país poderia fazer para ter de volta o crescimento econômico e a recuperação da credibilidade do país no mercado internacional”, analisa.

*Com supervisão da editoria.