Cinthya Rachel  é carioca moradora de Cascadura , subúrbio do Rio de Janeiro. Criou o Coletivo Encruzilhada Feminina da Arte Negra ,em 2018. Nele escreve, dirige e produz espetáculos teatrais. É professora de literatura do Instituto de Formação Humana Popular e Especialista de Literatura Africana pela UFRJ.  

E Cyntia, escreve:

Em 20 de dezembro de 2020, mais uma artista morre em razão da c-19. e, muitas outras e outras estão contaminadas sem saber. afinal de contas nem todo mundo tem o privilégio de ser testada. sim, um privilégio, visto que o exame da doença que vem assolando milhões de brasileiras (os) custa caro.

O que tem me deixado muito triste!

Em 13 de março eu estava no teatro quando chegou o comunicado do fechamento de todos os teatros do Rio de janeiro.

eu fiquei em choque por duas razões: primeiro por não entender, naquela época, do que se tratava essa doença. segundo, porque o teatro negro brasileiro estava em seu melhor momento.

Então, até hoje a minha cabeça está girando...eu tive que me reinventar nessa pandemia eterna, fiz muitas coisas no aconchego do meu lar. enlouqueci muitas vezes, mas, jamais deixei de pensar e fazer arte. afinal de contas, nós também movimentamos a economia desse país governado por sacanas. nós só não enriquecemos como eles.

Quando um artista está em cena, seja qual for a sua arte, ele está gerando empregos para muitas pessoas, estejam estas no palco ou nos bastidores, até mesmo àquelas e àqueles que colocam do lado de fora do teatro, cinema, casa de show, centro cultural, exposições o seu pequeno empreendimento.

Essa semana me deu um medo existencial de não poder fazer/vivenciar a arte dos encontros de ação e criação. nem todos os

artistas estão na globo - que tem sido bem criteriosa com os cuidados de seus/ suas funcionárias, e a maioria dos artistas não estão fazendo cinema - os de grande orçamento, que também tem tido a preocupação com suas equipes nesse sentido, mas, e as demais pessoas fazedoras de arte e cultura deste país, como ficam?

NÓS, todas e todos NÓS fazedores da arte e da cultura MOVEMOS A ECONOMIA e NÃO estamos em fase nenhuma da vacinação. que horror pensar nisso! a fome, as contas, a doença, a vida e a morte não esperam chamado pra chegar. só chegam!

Como pode artistas, que são tão trabalhadores quanto quaisquer trabalhadores não compor o quadro das fases da vacinação? Isso pra nós acarreta muitas coisas:desemprego em massa;subempregos em qualquer área;perda do ritmo de trabalho;desvalorização;atraso de contas= dívidas;depressão...

Hoje, infelizmente, perdemos a querida atriz Nicette Bruno, mas já perdemos tantas e tantos outros. Dá tristeza! artista não é rico. é bem verdade que alguns conseguem viver da sua arte, mas a grande maioria, vive à base de muita luta! ser artista não é tão glamoroso como alguns pintam, encenam, contam por aí...

Escrevo essa carta por estar cansada. quem vê cara, nunca vê o corre, as contas, as crises, os medos. que nenhuma artista / nenhum artista além do desemprego tenha que experienciar essa doença que todos os dias leva uma cidadã, um cidadão brasileiro.

um beijo.

por: cynthia rachel esperança (@cynthia_esperanca)