Depois de aprovada a Reforma da Previdência no Congresso Nacional, o ministro da Economia, Paulo Guedes, foi taxativo sobre a sequência do projeto do governo federal em relação à agenda econômica: o próximo passo é a revisão do pacto federativo.

Obviamente – e já disse isso em outros textos – a nova previdência não é a solução para tudo. Ela é importante em função do sistema atual ter caducado, uma vez que tem a ver com a relação direta entre ativos e inativos, que faz colapsar as contas por uma questão demográfica, independente dos casos de fraudes e corrupção que, evidentemente, só pioraram a questão.

É preciso, portanto, que a previdência esteja associada a uma série de mudanças que impacte no cenário econômico do país para que o Brasil não viva – como no passado recente – de “voos de galinha”.

É preciso também rever a carga tributária, repensar as relações de trabalho para além do já pensado, e descentralizar poder e recursos, potencializando as regiões e suas vocações naturais, diminuindo as distâncias econômicas existente entre elas.

Em outras palavras: mais dinheiro nos municípios – que é de fato onde as pessoas vivem – e menos dinheiro na União, nas mãos de decisões burocráticas cegas aos regionalismos e particularidades.

O atual pacto federativo gera uma dependência extrema e as prefeituras, em especial, acabam se tornando meras gestoras de programas federais e não se sustentam. Não é apenas a revisão do pacto que resolverá isso, mas sim um conjunto de fatores.

Além disso, depende também de como esse novo pacto é pensado. Não dá para emitir opinião agora, pois é preciso primeiro saber qual é a proposta. De acordo com Paulo Guedes, na próxima semana todos os brasileiros o conhecerão.

A revisão do pacto federativo talvez seja a mais árdua tarefa da equipe econômica do presidente Jair Bolsonaro, pois são muitos os detalhes a serem pensados para que estados e municípios mais pobres não venham a sofrer, sobretudo porque o país foi criando cidades – ao longo do tempo – ao sabor das conveniências políticas e para favorecer oligarquias e redutos, sem pensar nas perspectivas econômicas futuras e na autossustentabilidade. Não é um tema fácil.

Mas Guedes se encontra absolutamente certo ao compreender que o caminho é “menos Brasília e mais Brasil”.

Cada detalhe dessa revisão precisa ser analisado com calma e prudência, assim como houve nas discussões em relação à Reforma da Previdência. Que o debate possa ser feito sem ideologizações, mas com base mesmo nas questões técnicas e nos números, para que de fato estados e cidades sejam beneficiados com a mudança.

Se o trabalho for bem-feito, isso significa mais liberdade administrativa e política para as regiões.

E aí, meus caros (as), isso acaba por desmentir de vez essa patacoada vermelhinha de que estamos em um “fascismo”. Essa gente que vive a propagar isso sequer sabe o que é fascismo. Que governo fascista descentralizaria poder, ora bolas?

O princípio do fascismo é justamente o controle de tudo por meio do Estado centralizador. É uma das características. Temos no Ministério da Economia uma construção de proposta que vai no sentido contrário, pois a liberdade econômica alcançada produz maior liberdade política e faz com que o governo federal abra mão de poder, ao descentralizar.

Tirar determinados poderes de Brasília e repensar competências favorece a democracia, assim como desaparelhar o estado com determinadas privatizações diminui os níveis de corrupção no aparelho estatal ao passo que favorece o desenvolvimento tecnológico e o consumo mais barato de bens. A telefonia volta a ser um exemplo aqui.

Agora, como não se pode privatizar de qualquer jeito, também não se pode fazer uma revisão de qualquer jeito. É quando cabe a discussão pública, transparente e argumentativa sobre os pros e contra de cada um dos pontos apresentados. Isso é a beleza da democracia.

Os profetas do apocalipse secular é que odeiam isso, pois gostam do “quanto pior, melhor” para que o caos os elevem à condição de salvadores da pátria.

Como não há governo perfeito, nem salvadores da pátria, cabe a todos nós o papel da vigilância, mas sem perder o senso de proporcionalidade e prioridade das coisas. E é prioritário que o Brasil passe por reformas estruturantes para que se consiga maior liberdade econômica e menos Estado nas costas do cidadão, que já paga muitos impostos e não possuem os serviços públicos básicos prestados a contento.

Em todos os indicadores medidos no mundo, a liberdade econômica está atrelada aos melhores índices de desenvolvimento social e econômico, ainda que não construam o utópico paraíso na terra. Quem acredita em utopias são outros, não eu.

Quem tiver dúvidas, que pesquise nas fontes sérias sobre o assunto e não nos manuais de uma filosofia que nunca deu certo em canto algum: o tal socialismo.

Até mesmo nos países nórdicos – que uma parcela da esquerda adora citar como exemplo – o que tem sustentado o chamado “Estado de bem-estar social” é a economia livre (e agora com um certo grau de liberdade) que o antecedeu. É a história, meus caros e caras. É a história.

Quanto ao pacto federativo, eis aqui uma discussão que também tem história no Brasil. No período imperial, por exemplo, a revisão desse pacto já era defendida – para ser ter ideia – pelo alagoano Aureliano Cândido Tavares Bastos quando ocupou o posto de deputado (correspondente ao deputado federal de hoje em dia) e foi uma das vozes precursoras de maior liberdade nesse país, abraçando a bandeira do abolicionismo, da educação universal e da integração nacional, como quando abordou – de forma pioneira – a necessidade do desenvolvimento da região Norte por meio do estímulo da navegação para que não se tornasse um país a parte.

A discussão sobre o pacto federativo em Tavares Bastos está na sua mais famosa obra que, infelizmente, se encontra esgotada nas prateleiras das livrarias brasileiras: A Província.

No século XX, surgiu uma voz crítica a Bastos e a sua proposta de federalismo, abrindo novamente a discussão: trata-se de João Camilo de Oliveira Torres. Todavia, em A História das Ideias Revolucionárias no Brasil (publicado pela editora da Câmara dos Deputados), Torres salienta a necessidade da descentralização, sendo esse – portanto – um ponto em comum com o alagoano Tavares Bastos.

No próprio império – na regência de D. Pedro II – essa discussão se fez presente e seria uma das etapas da regência que não houve: a da Princesa Isabel. Com a Proclamação da República (na realidade um golpe) isso volta a cena em 1891, mesmo sendo um debate entre positivistas. Porém, tivemos períodos de centralização posteriores, como a concentração de poder no Estado Novo e no regime militar, assim como na própria Constituição de 1988. Em que pese avanços, tivemos uma carta de promessas que enxergou o Estado de maneira paternalista também.

Estamos diante de uma discussão histórica e profunda. Que ela – agora – seja travada com bastante racionalidade e com os ânimos voltados ao bem do país. Que consigamos, enfim, mais Brasil e menos Brasília. Não nego: torço por isso.