O período de crise econômica e política que o país ainda vive gerou uma boa oportunidade para termos um debate maduro, principalmente com o início de um novo governo.

O sistema tributário brasileiro passou por substancial restruturação na década de 60. Depois disso, somente com a Constituição de 1988, o sistema teve uma reforma considerável. Foi evoluindo continuamente, sem alterações em sua estrutura básica. Embora a reforma Constitucional de 1988 tenha eliminado alguns tributos e introduzido modificações nas características de outros, notadamente no ICMS, a reforma focou na desconcentração dos recursos públicos, privilegiando especialmente os municípios. Desse modo, a estrutura básica da tributação brasileira vigente ainda é, em essência, aquela construída no período 1964/67.

Precisamos refazer o Sistema Tributário Brasileiro. Para isso, devemos primeiro ter bastante claro o tamanho do setor público que desejamos, para só assim podermos desenhar um proposta. Quanto maior o seu tamanho maior será a necessidade de um carga tributária robusta para dar conta destas despesas. Hoje temos um país, estados e municípios com déficit em suas contas, com raras exceções. Então, a meu ver, não temos como iniciar uma discussão de reforma tributária razoável sem antes discutirmos diversos paradigmas do setor público.

Temos educação, saúde, segurança pública, cultura, esportes, milhares de estatais dependentes, estabilidade dos servidores públicos, regime único, aposentadoria integral, aposentadoria precoce, benefícios previdenciários e assistenciais, gratuidade para idosos, meia entrada em atividades culturais e esportivas, benefícios fiscais, benefícios financeiros, subvenções e muito mais coisas. Soma-se tudo isso e o resultado é simples: déficit público e uma alta carga tributária, arcados por cada esfera federativa e muitas vezes de forma desproporcional à real necessidade.

Assim, também será necessário discutir o arranjo federativo, pois temos entes que possuem receita tributária própria mais as de transferências em valor 60% menor que a média nacional. Os mecanismos de equalização federativa existentes não funcionaram a contento em todo esse período agravando ainda mais esta situação.

Ufa!! Se conseguirmos pelo menos ter tudo isso aí de forma clara para todos os brasileiros, mesmo que não consigamos resolver todos esses pontos, mas termos uma agenda e um plano de reformas estruturantes para um Brasil moderno, em 30 anos poderemos colocar também nesta agenda um novo sistema tributário adequado às mudanças tecnológicas que já vivemos e que vamos viver. Não adianta pensar um sistema olhando para os fatos geradores antigos, mas para os da 4 ª geração que já se põem bastante claros para todos nós.

O sistema tributário deve observar o que a academia entende por premissas básicas para que possa atender seu principal objetivo: financiar o setor público interferindo minimamente na economia. Deve ser simples, proporcionando poucas divergências de interpretação e com poucas obrigações acessórias uniformes no País. Procurar a transparência transferindo para quem realmente pagar o tributo, a clareza da sua carga efetiva. Outro princípio fundamental é a neutralidade, evitando a distorção no ambiente de negócios. Não menos importante é a efetividade do sistema, pois ele deve proporcionar capacidade gerencial à administração fazendária e, por fim, a sua equidade tratando da mesma maneira os que estiverem em situação similar. Além destes princípios, o novo sistema deve ser absolutamente harmônico com o padrão internacional de tributação, pois isto ajuda muito na atração de investidores para a federação.

Outro ponto importante a se avaliar na construção do novo marco legal são as rápidas mudanças de negócios e de mercado propiciadas pela revolução tecnológica que passamos. Hoje pode-se abrir uma empresa no site do Ebay e no da Amazon em qualquer lugar do mundo e vender para vários países, operando sob a jurisdição de vários regimes tributários. Esta mudança propicia, por exemplo, que as informações tributárias dos contribuintes e do governo sejam armazenadas na nuvem, podendo ser acessadas em qualquer lugar do mundo. Mudanças como esta implicam até mesmo na criação de novas profissões como o taxologist (um espécie de profissional que não é simplesmente um contador, mas um especialista em tecnologias que integram o fluxo de trabalho e sistemas).

 

As novas tecnologias – como inteligência artificial, robótica e blockchain devem ser consideradas na construção do novo modelo e, principalmente, tecnologias como a impressão 3D e o streaming. Dessa forma, temos uma nova economia surgindo que valoriza cada vez mais os bens intangíveis e os negócios colaborativos, onde fica mais clara a aproximação do processo produtivo do consumidor, bem como uma crescente relativização da presença física e de transmutação das espécies jurídicas, dificultando o acompanhamento destas novas espécies econômicas.

 

O desafio neste cenário é imenso, mas é preciso começar um trabalho de discussão com especialistas de várias áreas do conhecimento que seja capaz de elaborar uma proposta que represente uma ruptura ao atual modelo de tributação brasileira e que nos ajude a dar um grande salto econômico.

 

George Santoro