Reforma do federalismo fiscal já!

 

 

O federalismo fiscal é uma técnica que garante o melhor atendimento ao bem comum, um instrumento de organização das finanças públicas com o objetivo de coordenar a gestão político-administrativa dos entes que compõem a federação. Aqui se apresenta um dos maiores dilemas enfrentados pelo Poder Constituinte – que é o financiamento por meios equânimes e razoáveis das tarefas finalisticamente destinadas aos estados e municípios nos seus respectivos níveis de governo.

O pacto federativo brasileiro está esculpido na Constituição no capítulo destinado à questão tributária. Nossa tradição é definir na Carta Magna a que esfera de governo pertence a competência para cobrar cada imposto e, se for o caso, como compartilha sua receita entre os diferentes entes subnacionais. A responsabilidade pela aplicação dos recursos corre à reboque da receita. A decisão principal sempre foi em torno da disputa do poder de tributar e deter as receitas no sistema tributário. Não por acaso o capítulo tributário da Constituição brasileira é dos mais extensos em todo o mundo. Um exemplo disso é o capítulo destinado ao ICMS que se aproxima de um regulamento de tão detalhado que é.

Não faltam questões e polêmicas na organização federativa brasileira. Pode dizer que há um início de crise na federação, pois estamos vendo a cada dia se ampliarem os problemas. Já temos um percentual considerável de estados e municípios que não conseguem pagar nem sua folha de pessoal quanto mais fazer investimentos importantes em infraestrutura. Chega-se ao ponto de vermos no noticiário pontes caindo, escolas e hospitais públicos em péssimas condições. As perspectivas são as mais confusas e incertas. Vemos muitos culparem a questão previdenciária como a grande vilã, mas sinto dizer que a questão previdenciária é a ponta do iceberg.

Na prática, o debate de alternativas para equacionar os problemas muito pouco ou nada avançou. Quem deveria ter uma visão estratégica e ampla – nesse caso, o governo federal - pode-se dizer que oscila entre a inépcia e a omissão há muitos anos. Claro que isso é decorrente de várias medidas paliativas na gestão fiscal federal que, por fim, acabam por empurrar o problema para frente sempre.

Por todos esses motivos, se faz necessária uma reforma do federalismo fiscal já, pois não deve se limitar à repartição espacial das unidades federadas, mas restabelecer a capacidade financeira dos estados e municípios de fazerem políticas públicas efetivas. Medida que é uma das mais urgentes do nosso País. Claramente, muito se queda dependente de decisões políticas, mas é algo que não pode esperar e reclama compromisso de todos.

Numa parte significativa dos Entes subnacionais o governo representa mais de 40% da geração da atividade econômica. Dessa forma, o maior desafio consiste em criar condições para a retomada do crescimento econômico, fomentar o desenvolvimento e ampliar a capacidade de financiamento das administrações de estados e municípios, dos investimentos em infraestrutura, bem como dos recursos destinados à educação, saúde e às mais variadas políticas públicas regionais. Mas tem-se que aproveitar essas reformas para que seja possível fazer também um início de processo de equalização fiscal e de desenvolvimento regional. Estados como Alagoas, Sergipe e Piauí  entre outros possuem receita fiscal disponível muito aquém da média nacional. Alagoas, por exemplo, tem uma receita disponível per capta de, aproximadamente, R$ 1,9 mil, quando que estados de Roraima e São Paulo contam com cerca de R$ 5,5 mil e R$ 3,8 mil, respectivamente. Essa injustiça fiscal nunca foi resolvida pelo FPE – Fundo de Participação dos Estados -, mesmo com a recente alteração legislativa. Essa situação se perdura. Não há como mantermos o país tão desigual em oportunidades. Precisa-se criar mecanismos de longo prazo para que equalizemos a receita disponível nas regiões e depois entre as regiões. Dessa forma, poderemos iniciar um processo saudável de melhoria da distribuição da renda nacional e, também, da infraestrutura. Isto irá propiciar nestes Estados uma menor dependência no longo prazo da atuação governamental pelo crescimento sustentável do setor privado nas economias locais.

Contudo, esse processo de reformas não pode esquecer-se dos contribuintes, das melhorias do sistema tributário para permitir a suportabilidade da carga tributária, a simplificação na arrecadação dos tributos e no equilíbrio entre todos para eliminar hipóteses de vantagens indevidas ou excessivo de tributos sobre alguns. No Estado Democrático de Direito não há sistema tributário eficiente sem justiça fiscal.

E, passados quase 30 anos de vigência da Constituição de 1988, é chegada a hora do aprimoramento do nosso federalismo fiscal, o mais longevo do constitucionalismo brasileiro que conseguiu ser piorado ao longo dos anos. Já basta!