Não teve sorte. Abdias foi pego em flagrante. A prova do crime estava ali, em cima da cama, toda molhada e selvagemente exposta para quem quisesse ver.  Orminda, a esposa desconfiada e de que tudo sabia ou descobria, apareceu no lugar errado, na hora errada e no momento errado. Depois de 20 anos de casados foi um golpe fatal na frase divina jurada no altar da capela do Farol, famosa por ter batizado o talentoso filho das Alagoas, Djavan, "até que a morte os separe". E quase a morte os separou. Os gritos e berros de Orminda foram ouvidos a dois quarteirões da casa bem construída depois de muito esforço e sacrifício do casal. Chegaram a cogitar em chamar a polícia, mas o telefone da central estava fora do ar devido à "operação padrão" implantada pelos policiais do Estado. E viaturas para atender a ocorrência? nem pensar, todas sem combustível e os policiais de plantão com as carteiras de habilitação vencidas há anos. Ou seja, naquele momento nem a polícia poderia salvar Abdias.

            Vizinhos se aglomeravam frente à porta do casal e já tinha aposta que Abdias seria jogado para fora em alguns minutos. Outros apostavam que Orminda era capaz de tudo, até de matar mesmo! O alvoroço era grande. Furdunço e fofoca, fofoca e furdunço, o futuro de Abdias já era notícia que corria a plenos pulmões no bairro.   

            Mas ela já tinha avisado, o dia que pegasse era para desmantelo mesmo. E logo ali, em cima da cama, da cama deles, não, não teria perdão. Abdias tentou explicar, coçou a cabeça, a sobrancelha, balbuciou alguma reação, gaguejou mais do que a primeira vez quando foi pedir a mão da formosa Orminda, então com 22 aninhos e o desejo do bairro, ao pai coronel do exército e famoso por já ter matado uns três pretendentes da bela e então quase "Miss Paripueira", Orminda Cervantes Albuquerque e Silva Flores.

            Nada. Nada que pudesse explicar faria sentido para a dedicada esposa e mãe dos sete filhos bem criados até aquele dia. Aquilo não tinha perdão!

            Orminda era  esposa meticulosa, cuidadosa, a casa era organizada de forma britânica. Tudo tinha etiqueta, nome e lugar certo. Dos quartos aos banheiros era tudo milimetricamente organizado. E foi em um deslize desse que a luz do perigo acendeu e fez a situação se complicar  ainda mais para Abdias. O chuveiro ligado, vozes e depois o quarto. E a cena estava clara. A prova do crime, ali em cima da cama, exposta e deixando a verdade aparecer nua e crua para quem quisesse ver!

            Orminda era religiosa. Ia à missa todos os domingos nos Capuchinhos e se sentia a mulher prendada que todo homem sonharia em casar. Achava que Abdias tinha tirado a sorte grande e jogado tudo fora de maneira tão vulgar. E logo ali, em cima da cama deles. Em poucos minutos tudo caiu. Abdias já ajoelhado implorando o perdão da mulher e ela sacudindo a desgraçada de cima da cama e jogando-a para cima de Abdias.

            A cena era de novela global. Tudo sendo filmado por um dos filhos para depois jogar na rede e virar viral. Ninguém para ajudar o pobre Abdias que a essa altura não só chorava, mas implorava perdão em gritos histéricos e promessas de que "aquilo" nunca voltaria mais acontecer.

            Orminda se descontrolou e disse a frase certeira e derradeira. Estava tudo acabado. Ela não admitia de maneira alguma aquela cena. E jogada ali em cima da cama? De jeito algum!

            Abdias se controlou, juntou um pouco de dignidade que ainda lhe sobrava e foi juntando seus "pano de bunda" para procurar onde morar dali por diante.

            A toalha molhada que Abdias tinha esquecido de forma relapsa em cima da cama era o motivo para o fim do casório. Ela seria lembrada para sempre, viraria música, samba-canção, mas não mais elo de união entre um homem desleixado e uma mulher prendada e organizada.

            E foi assim que uma toalha molhada fez mais um casamento se acabar em Alagoas.