Cena 1. Os olhos de pavor e tensão não são mais os que metiam medo nas vítimas de minutos atrás. Escondido debaixo de um carro e ouvindo as vozes da população enfurecida gritando para “matar o ladrão” o deixou mais apavorado. Por alguns segundos pediu que chegasse primeiro a polícia para prendê-lo e entregar os trocados que conseguira roubar de uns transeuntes daquele bairro empobrecido. Para a sua infelicidade o dono do carro logo chegou ao local e retirou de lá o veículo com medo de que alguma coisa acontecesse com seu possante já que as pessoas tentavam a todo custo pegar o ladrão para fazer “justiça”. Assim que o motorista deu ré, não sobrou mais espaço para estar escondido e de logo sentiu o primeiro chute que lhe atingiu o rosto; tentava cobrir as partes do corpo com as mãos que àquela altura já haviam largado os quarenta reais amealhados à força após mostrar a arma de brinquedo para as suas vítimas, mas era em vão. Socos, pontapés, mais chutes, pedaços de pau, pedradas, tudo foi acertando em cheio seu corpo franzino e esquelético que em um último suspiro sentiu o alívio da morte arfar o peito e terminar o sofrimento de intensos e exatos 13 minutos de pancadaria social e revolta pulsante contra aquele “ladrão”. A violência foi tamanha que impossível depois foi reconhecer de quem se tratava, mas já se sabia de que era um ladrão. Os programas do tipo show de horrores que vão ao ar na hora do almoço comemoraram com certa ironia a “ação higienizadora da sociedade” que não agüentava mais tanta violência. Alguns apresentadores, aproveitando-se da popularidade deste tipo de sensacionalismo, já no cargo de eméritos políticos, esbravejaram contra o caos, a insegurança e a violência praticada pelos bandidos e que o remédio aplicado pela sociedade não poderia ser outro.

Cena 2. Encurralados em uma sala, mais precisamente no canto da parede, três jovens de 13, 16 e 17 anos ouviam os berros ensandecidos dos agentes penitenciários que deveriam estar ali para  ajudar na suas recuperações. Após os berros o primeiro soco, depois um chute, depois as ameaças de morte que seguiam em constância avassaladora contra os jovens que estavam detidos por terem cometido alguns roubos, um por estar ao serviço do tráfico de drogas do seu bairro miserável. Mais agentes se juntaram à ação para bancarem os temidos e também aproveitaram a situação para aplicar mais alguns safanões no rosto dos detidos. Mais alguns minutos e a sessão de tortura acabaria. A lição estava dada. Socos, chutes, ameaças de morte e a tortura gratuita. Isso a população não assistiu. Foi tudo dentro de uma unidade “ressocializadora” para menores infratores. A violência realmente está sem controle no tecido social esquizofrênico por qualquer tipo de justiça.

Cena3. Alguns políticos apadrinham pessoas que vão ganhar mais de 100 salários por ano. Alguns políticos estão negociando como repartir melhor as sobras da verba de gabinete. Alguns outros não apresentam nenhum projeto em 04 anos de mandato, mas recebem rigorosamente seus gordos salários de representação parlamentar e vão se reeleger comprando mais votos. Funcionários fantasmas lotam as folhas de pagamento misteriosas. Muitos não sabem nem onde fica o prédio onde deveriam trabalhar. Cargos comissionados como moeda de troca. Quase ninguém reclama ali, intra-muros, da leniência do governador, do prefeito, do presidente, quase não se fala sobre corrupção, quase não se toca em assunto algum. E as leis? Leis, ora as leis... 

 

Observação: essas cenas são meramente obra de ficção e os personagens envolvidos são fruto da mente nada criativa do blogueiro. Qualquer semelhança é pura, mera, e infeliz coincidência.