Está em curso uma guerra ideológica na política brasileira. De um lado, comunitaristas de todos os tipos brigando por leis especiais para seus grupos. Temos movimentos feministas e homossexuais pedindo penas mais duras para crimes contra os seus, grupos étnicos pedindo direitos especiais como cotas em concursos públicos e até em empresas privadas, estudantes brigando por descontos especiais em shows... Do outro lado? Evangélicos e radicais moralistas...

Temos grupos para todos os gostos pedindo direitos especiais. Tais grupos avançam sobre o direito individual de várias maneiras possíveis. Desde quando tiram a vaga na universidade ou no serviço público de um suposto “branco” para dar a um suposto “negro”, até quando usam verbas públicas (pagas por todos os brasileiros) para promover a “cultura” de uma dessas autoproclamadas “minorias”.

Cada gestor público desse país tem que lidar com esses pleitos. E esses pleitos são vistos como igualmente importantes pelos políticos demagogos. Quem danado vai se atrever a dizer que direitos especiais não devem ser concedidos? Será imediatamente chamado de fascista, racista e contrário aos interesses de negros, índios, mulheres, homossexuais, idosos, estudantes... Se eu digo que é um absurdo dar o direito especial de ter meia-entrada em shows e eventos para estudantes, vão imediatamente me acusar de ser contra os estudantes, ora! Por outro lado, quem defende direitos especiais, nunca é acusado de ser contra todos os não-estudantes... Assim, é muito fácil aprovar tais direitos nos parlamentos pelo Brasil. O deputado tira direitos de pessoas que não se encaixam no grupo, mas o que aparece na mídia é uma benevolência para com os grupos específicos que ajudou. Benevolência com o dinheiro dos outros, é claro!

A “promoção dos valores e da cultura” envolve tirar de uns e dar para outros, tanto na forma de dinheiro público como na negação de oportunidades e do tratamento igualitário. Mas há um outro problema. Os tais grupos também ostentam valores e querem seus valores (na verdade, os valores de suas lideranças) impostos à sociedade toda. Essa imposição, obviamente, deve se dar por meio do estado. Sempre ele! Caberia ao estado promover os valores que eles, os líderes, consideram importantes.

Então encontramos de tudo um pouco. Desde a escolha de qual filme receberá dinheiro público até o conteúdo do que será ensinado nas escolas. Desde a proibição de certos tipos de publicidade até a contratação de músicos para o Carnaval. Quando exigem uma “História da África” como conteúdo obrigatório nas salas de aula, estão, na verdade, impondo o que eles consideram ser a “verdadeira história da África”. Como se nós, quando estudamos história, não tivéssemos que estudar o papel da África na formação do Brasil... Vão ler Gilberto Freyre!

Essa imposição de valores particulares aos outros só se opera por meio do estado. Tais grupos não estão mobilizados como uma associação de indivíduos livres que querem apresentar seus valores à pessoas para que elas conheçam e reconheçam. Não! Eles querem que a maioria pague à força para que essa minoria possa ditar o que é certo e o que é errado.

Esse tipo de antiliberalismo é uma das piores regressões da política. Coloca de volta à arena pública o que, na verdade, deveria continuar apenas como questão privada. Tira da escolha dos indivíduos e coloca nas mãos de uma elite preconceituosa a decisão sobre o que é relevante para suas vidas.

Isso traz consequências. Se militantes do movimento homossexual, por exemplo, querem impor seus valores por meio do estado, militantes evangélicos também vão querer, não é? Então, se, de um lado, militantes homossexuais abandonaram os pleitos liberais em favor dos comunitaristas, os defensores da moral de dos bons costumes vão reagir na mesma moeda.

Foi assim que a Assembleia do Rio aprovou e o Governador sancionou a Lei da Moral e dos Bons Costumes. Assim, com iniciais maiúsculas mesmo.

“Sancionado na quinta-feira pelo governador Sérgio Cabral, o projeto de lei, de autoria da deputada Myrian Rios (PSD), tem a finalidade “promover o resgate da cidadania, o fortalecimento das relações humanas e a valorização da família, da escola e da comunidade como um todo”. http://oglobo.globo.com/rio/cabral-aprova-lei-da-moral-dos-bons-costumes-7329567#ixzz2IKwlGsKX

Se Jean Wyllys, o deputado ex-BBB, quer que as crianças tenham acesso a um “kit gay”, Myriam Rios quer que as crianças tenham acesso a um “kit moral e bons costumes” ou um “kit família”, talvez. Todo mundo quer dizer o que o outro deve fazer e o que o outro deve pensar! Com dinheiro publico! Significa que você está pagando para que Myriam Rios faça proselitismo moralista, ao mesmo tempo em que paga para que Jean Wyllys faça proselitismo homossexual.

Eis o princípio que defendo: cada indivíduo tem que ser tratado como tal, como indivíduo! As diferenças estão nos indivíduos, não nos grupos. A cada vez que um grupo usa o estado para conceder privilégios ou proteções especiais, está agredindo a liberdade individual e impondo seus valores particulares. Está na hora de lutarmos por um princípio mais abrangente. Que tal cada um cuidar da sua própria vida?