No Carnaval, quando éramos criança lá pela década de 1960, ansiávamos chegar à idade adulta para também se enfeitar como carnavalesco e ir aos bailes.

Uma camisa de cetim, de preferência estampada, um quepe de marinheiro, um lenço e uma lança perfume Rodoro enfiada no bolso traseiro da calça.

De vez em quando, um porre. A lança perfume Rodoro era o charme e o gancho para atrair as meninas. As mais serelepes se entregavam no terceiro porre, e saiam beijos, abraços e amassos – que terminavm na Quarta-Feira de Cinzas, com todos em paz e esquecidos da farra.

Os excessos ficavam no Carnaval e ao final da festa, a lança perfume Rodoro, que era vendida livremente, desaparecia naturalmente do mercado. Era um produto exclusivo para o Carnaval.

Mas, aí apareceu uma autoridade e proibiu o uso e a comercialização da lança-perfume. Proibiu coisa nenhum. O que antes era só para o Carnaval, hoje é todo dia e pode ser produzida em casa com pouquíssimo conhecimento de Química.

Na minha infância, nunca ouvi falar de alguém que morreu com um porre de lança-perfume Rodoro. Mas, depois que a autoridade proibiu o uso e o comercio fazendo surgir o traficante, muita gente já morreu inalando “Loló”.

Moral da história: quem inventou o traficante foi a autoridade e não o viciado, como se tem colocado erroneamente.

O país assiste estupefato a divulgação dos números da guerra em São Paulo. Só este ano, 89 policiais militares foram assassinados nessa guerra que as autoridades tentam em vão esconder.

E chegamos a uma situação em que não dá mais sequer para prender os criminosos, porque não há vaga no sistema penitenciário.

Em Brasília, por exemplo, a Justiça suspendeu a execução de 6 mil mandados de prisão porque a Papuda – o principal presídio da Capital Federal – está perto de ultrapassar o dobro da capacidade. São 6 mil e 500 vagas, mas tem lá 11 mil presos amontoados.

Ao mesmo tempo, o Congresso Nacional discute a reforma do Código Penal e até agora não apareceu nenhuma proposta capaz da garantir a solução do problema. Todas as propostas, até agora, foram no sentido de manter a metodologia de segurança pública – que não deu certo; ou para adequar essa metodologia a crenças obsoletas, tais como acreditar que foi o viciado que produziu o traficante, quando, na verdade, o traficante é uma invenção da autoridade.

Aquela mesma autoridade que, na década de 1960, baniu a lança –perfume Rodoro, que era vendida sob controle no comércio regular, e fez surgir o tráfico de éter para a produção artesanal da “Loló”.

Na década de 1960 ninguém sabia o que era “Loló”. Foi a autoridade que proibiu o uso e a comercialização da Rodoro, que inventou a “Loló”.

Os traficantes, claro, agradecem. Aliás, por falar no traficante, vocês sabiam que eles também são contra a descriminalização do uso de drogas? Pois são e, nesse particular, autoridade e traficante estão juntos e falam a mesma língua.

O risco é se, entre ambos, também existir o mesmo interesse fiduciário...