Já conto vinte e dois anos que faço e desfaço seus nós. Muitas lutas, batalhas travadas em torno de algo que acredito possa representar ou espelhar o ideal de justiça. Por vezes lustrosa, por outras tristonha, ela está sempre lá a representar um pouco da dignidade da veste talar que agüenta diuturnamente a incompreensão, os ataques, os vitupérios daqueles que sempre ousam desacreditar seu porta voz.


Descansa plácida e se agita inquietante quando chamada a representar o injustiçado. Clama por liberdade em cores vivas e impõe formalmente um signo de paridade com outros representantes da justiça que também a envergam em sinal de hombridade e nobreza.


Da sua elegância afasta os mais humildes e reclama chamamentos doutorais por vezes imerecidos. Distingue-se do comum e se destaca em meio à multidão de descamisados e pés descalços que ainda a rodeiam em pórtico de adoração.


Não a vejo como divisa, mas como convergência entre desiguais. Todas as manhãs envergo sua silueta que se amolda à minha como um escudo, lembrando-me sempre de onde vim, para onde vou e porque fui ao seu encontro.


Não a trato com soberba, muito menos com indiferença. Respeito-a, pois já cruzou a estrada comigo e hoje se encontra carcomida pelo tempo e pela vivência de ter passado da jovialidade à experiência, da impetuosidade à temperança, nunca porém abandonando a ousadia e a coragem de brandi-la ao primeiro que desafiar seu cabedal de conhecimento e os ainda jovens e vigorosos ideais que nos uniram.


Em cada nó passado, o presente se faz reluzente e o futuro aponta no porvir. Em cada nó desatado a certeza do dever cumprido, o cansaço das batalhas enfrentadas, com vitórias e derrotas, mas com a certeza de ter lutado até o último instante.


Caminhando sempre em frente para sustentar a palavra, o choro contido, o sorriso por muitas vezes difícil, o grito da liberdade e os desafios da justiça prepotente e arrogante que tenta quase sempre triunfar sobre os mais humildes ou castigar impiedosamente os mais fortes.

Ali, representando a nobre missão de súplica sem subserviência, de pedido sem mendicância, de fôlego a plenos pulmões, vergo a gravata surrada que ainda brilha como no primeiro dia de nosso inusitado encontro, sob sonhos de dias melhores. E é por eles que todas as manhãs esta união litúrgica se dá de forma solene, mas muito, muito fraterna.