A Igreja Católica mandou os seus representantes sem batina, os “juristas católicos” Ives Gandra e Paulo de Barros Carvalho, darem o recado do Vaticano sobre a reforma do Código Penal ao presidente do Senado, José Sarney – que recebeu os dois na segunda-feira, 6, à tarde.
O recado foi: “A Igreja Católica é contra a descriminalização de plantio e porte de maconha para consumo e também é contra que se ampliem as possibilidades do aborto legal”.
Na verdade esse é um recado de todas as religiões, o que equivale dizer que, se for aceito, o novo Código Penal já nasce velho e os velhos problemas da sociedade vão permanecer no que se refere à liberdade individual da mulher – em usar o seu corpo à sua maneira; e ao viciado em maconha de fumar seu baseado à vontade.
Vai resolver o problema? Não.
O que as igrejas deveriam fazer eram dar sugestões para se resolver o problema e não manter o problema para faturar com ele. A Igreja Católica também foi contra o divórcio e essa posição tacanha foi responsável pela infelicidade de muitos casais.
Lembro-me do velho Teotônio Vilela num debate com o irmão, o cardeal Primaz do Brasil, dom Avelar, que se contrapunha ao apoio que ele (Teotônio) dava ao projeto do senador carioca Nelson Carneiro – que é o pai do divórcio no Brasil.
-“Avelar, o divórcio é igual ao remédio na farmácia. Só vai lá pegar quem está precisando”.
Graças a Deus o divórcio passou sem que se concretizasse a hecatombe social prevista; e ainda tem muita gente acreditando no princípio da indissolubilidade do matrimônio baseado em que nenhum homem deve separar o que Deus uniu.
Agora imagine se Deus iria permitir dois casais num inferno doméstico! Esse Deus, com certeza, não seria o verdadeiro Deus – que não mandou ninguém casar; no principio era o “comunismo”, que não inclui apenas a economia.
E com base nesse princípio indestrutível do “comunismo primitivo” em relação à mulher, ainda hoje o poder é materno – e sempre será; ninguém jamais vai revogá-lo, exceto quando um dia o homem puder também engravidar e dar a luz.
Mas, a mulher continuará sem a liberdade de decidir sobre o seu corpo.
Quanto à maconha, tudo o que se tem falado sobre a erva até agora parte de conclusões que tem por base princípios arraigados que só levaram à expansão do consumo. Vejamos: até o começo da década de 1960, a maconha era vendida livremente no Mercado Público de Maceió com o sugestivo nome de “remédio para dor de mulher”.
O chá servia e serve para amenizar os efeitos da TPM. Aliás, outro medicamento melhor não há para a mulher "naqueles dias"...
E o que aconteceu depois da repressão policial? Aí surgiram o haxixe, a “merla”, a cocaína e depois o “crack”. E novas drogas estão surgindo com extrema dificuldade de serem detectadas pela polícia, pois são sintéticas e cada vez mais fáceis de serem acomodadas na bagagem.
Ou seja: não adianta proibir e se outro motivo não existisse este bastaria: iguais às igrejas, os traficantes também são contra a liberação porque vão perder dinheiro. O policial corrupto também e pelo mesmo motivo: os Fóruns estão abarrotados de denúncias de flagrantes forjados.
Para os que se miram pela visão religiosa um lembrete: Nabucodonossor, o personagem bíblico que libertou os judeus do cativeiro fumava maconha.
Washington, a capital dos Estados Unidos, foi construída em duas grandes propriedades rurais de maconha que pertenciam a Thomaz Jefferson e George Washington – aliás, esse general deu nome à Capital do Tio Sam.
E o pior de tudo para os que impedem que o novo Código Penal brasileiro seja realmente novo é que de nada vai valer à pena. Mais cedo ou mais tarde a pressão das ruas vai escancarar as portas, tal qual aconteceu com o divórcio, o casamento gay e a reforma agrária – que está sendo realizada na marra.
É só uma questão de tempo, porque a sociedade pressiona pela solução do problema – e a solução do problema está nas propostas que a comissão de juristas notáveis ofereceu.