No panteão da história nacional, repleta de injustiças, o “almirante negro” João Cândido é mais um dos (inúmeros) injustiçados.

Líder dos revoltosos contra os açoites e os castigos corporais covardes recebidos pelos marinheiros de seu tempo, este militar foi o homem da famosa “Revolta da Chibata”.

Lutando contra as humilhantes agressões, o negro João Candido esteve à frente dos marinheiros do Encouraçado Minas Gerais que se amotinaram e obrigaram o Marechal Hermes da Fonseca, presidente naquele ano de 1910, a rever as punições físicas na Marinha.

Uma triste e pedagógica página na história nacional, ocorrida em uma época de “escassas” garantias constitucionais, turbulência política, República sem alicerces sólidos e acúmulo de violações dos direitos humanos.

Mas João Cândido foi um só.

Hoje o tempo é outro.

E Marco Prisco, líder dos grevistas da polícia militar da Bahia, não é João Cândido.

Assim, reconheço que os salários miseráveis e a falta de condições de trabalho dos policiais baianos (e alagoanos, e brasileiros...) são, de fato e com certeza, indignos. Eu mesmo, neste blog, não me canso de bradar em defesa do direito dos policiais, sejam militares, sejam civis.

A PEC 300 precisa não só ser votada urgentemente, como necessita ser sancionada e posta em prática o mais rápido possível. E os reajustes salarias, além do reforço em equipamentos e inteligência para nossas polícias, são mais que urgentes.

Os salários dos policiais brasileiros são aviltantes sim. Os profissionais que cuidam de nossa segurança merecem respeito e reconhecimento. E os governos, em sua maioria, são insensíveis aos reclamos de suas tropas.

Mas mesmo em assim sendo, vale ressaltar que os policiais não estão vivendo em tempos de violações das garantias constitucionais. Os policiais baianos não estão sendo açoitados com chicotadas em navios fétidos e insalubres, nem estão sendo ultrajados por seus superiores em tempos de falta de normas, de regras trabalhistas e de marcos legais.

Aliás, a tropa não pode ser confundida com baderna, já que policial de verdade é contra este mal.

Há falta de tato e prioridade por partes das gestões públicas para com nossas policias, isto é fato e é histórico. Mas nada justifica lançar um estado inteiro à barbárie como vem acontecendo na Bahia.

Daí não haver heroísmo nenhum no motim da polícia baiana, danoso exemplo que, espero, outras polícias não sigam.

Afinal, quem mais sofre no caos da greve da polícia são as famílias inocentes que têm grande parte de seus direitos cerceados por meio de iniciativas como estas dos militares da Bahia: o direito à propriedade, porque com a greve proliferam roubos e assaltos; o direito de ir e vir, porque ninguém se sente seguro para sair de suas casa, ir à escola, ao médico ou ao trabalho; e o mais elementar de todos os direitos: o direito a VIDA, sonegado ao ostentar mais de uma centena de homicídios em solo baiano.

Defendo, veementemente, a luta dos policiais militares e civis. Mas esta luta não pode descambar para a selvageria e para a banalização da vulnerabilidade de acuados e aterrorizados cidadãos civis.

E quando envolve partido político e interesses eleitorais, seja eles quais forem, então, aí a situação se torna ainda mais vexatória...

Não façamos dos Marcos Priscos da vida heróis da causa militar. Eles são militantes sindicais, políticos, representantes institucionais e de grupos, que vivem um momento histórico onde a Lei, o interesse coletivo e a salvaguarda irrestrita da VIDA devem imperar.

João Cândido não é Marco Prisco.

Por isso, a greve baiana não merece nosso apoio.

E dos policiais alagoanos, conscientes que são de seu papel e de seu dever, a sociedade espera, com sempre, bom senso e diálogo.

Esperamos deles que tirem nosso governantes da zona de conforto, cobrando com razão melhores salários e melhores condições de trabalho. Com a civilidade que lhes é peculiar.

Com certeza nossos oficiais e praças, ao assim agirem, contarão com o amplo apoio da maioria dos alagoanos na batalha contra os governantes que, estes sim, nos massacram. 

Até mesmo porque, heróis em nossa defesa que são, nossos policiais darão este exemplo!

 

 

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