Neste dia 18 de janeiro de 2012, o Brasil tem o dever de reverenciar a memória de um de seus maiores juristas.
Evandro Lins e Silva é, na data hoje, um criminalista centenário. Nasceu em 18 de janeiro de 1912 no Piauí. Faleceu em 2002, aos 90 anos, com uma lucidez ímpar, invejável e indelével.
Foi Procurador-Geral da República de 1961 a 1963. Foi Chefe do Gabinete Civil e ministro das Relações Exteriores de João Goulart em 1963. Foi ministro do Supremo Tribunal Federal de 1963 a 1969. Foi cassado e sofreu as agruras do famigerado AI 5.
Mas jamais foi covarde. Sempre foi grandioso.
E sua atuação na lida da profissão de advogar é tão monumental quanto sua performance política, quanto sua faceta de homem público a frente de seu tempo.
Hoje, quando ser advogado criminalista é ser incompreendido por uma sociedade por vezes não acostumada ao direito de defesa inalienável ao ser humano, Evandro Lins e Silva nos prova, com seu exemplo de vida, a grandeza deste ramo do Direito.
E nos honra ao indicar com sua história profissional algo que é fato e é alicerce nesta seara das Ciências Jurídicas: o comprometimento do Direito Criminal e Penal para com a Justiça e para com a Legalidade integral, sua essência, seu fundamento.
Sim, porque Evandro Lins e Silva, com sua pena e sagacidade, defendeu mais de 1000 “criminosos” políticos, assim considerados pela covarde repressão do Estado Novo de Getúlio Vargas.
Não se curvou à opressão e fez o que era sua missão pessoal e profissional, ou seja, atuar com base na Lei garantindo o contraditório a quem acusado de crime fosse em milhares de casos, em incontáveis sessões de júri.
Em 1979 defendeu Doca Street, assassino da musa Ângela Diniz. Comprou briga com feministas, mas teve a coragem para, mais uma vez provar o que deveria ser o óbvio: que todos têm direito à defesa.
Crítico ferrenho do sistema carcerário brasileiro, antes de morrer afirmou em entrevista à revista Época:
“Cadeia não é solução. Nunca foi, nunca será. Presídios imensos são construídos com custo fabuloso, em vez de escolas. Manter a população carcerária é muito caro para o Estado. Tenho 70 anos de advocacia. Nunca vi alguém sair da cadeia melhor do que quando entrou. Cadeia é a coisa mais infame que já se inventou. E ainda cria uma situação de marginalização permanente. Ninguém mais dá emprego àquela pessoa quando sai, ela acaba parando no crime de novo”.
Hoje, quando penitenciárias ainda são versões adaptadas das antigas senzalas dos tempos da vexatória escravidão no Brasil, tais palavras continuam atualíssimas. Ou repensamos nossas práticas de “ressocialização” de presos, ou continuaremos bancando faculdades do crime.
E mais, na mesma entrevista, oferta-nos uma demonstração de humildade única.
Afirma que sempre a acusação será mais propensa à falibilidade humana que a defesa. Ou seja, acusar pode nos levar ao erro. Defender, jamais nos leva à injustiça.
A pergunta da revista foi sobre o pior “momento” do jurista. Eis a resposta:
“Não foi uma derrota, mas às vezes em que atuei na acusação. Uma situação, em especial, me atormenta até hoje: um médico teria matado um rapaz que fazia barulho na rua. Acusei, o júri popular condenou e ele se matou na prisão. Eu estava convencido de que ele era culpado, mas e se não fosse? E me arrependo de ter acusado. E se a decisão tivesse sido mais resultado de minha eloqüência que dos indícios concretos? Penso nisso até hoje, 40 anos depois. Se um pecado cometi na profissão, foram as poucas vezes em que acusei. Das defesas não me arrependo de nenhuma.”
Que mais Evandros abrilhantem nossos júris.
Precisamos de mais juristas de caráter centenário e perene como este grande menino do Piauí, cidadão do mundo, que tem a mim como admirador e discípulo nesta Alagoas.
Estou Twitter. Siga-me no @weltonroberto