Era fã do “hômi” e, além de tudo, seu xará.

Cíço de Nazaré para os chegados, Cícero da Silva no segmento do transporte de cargas e “Cabavéio” para os íntimos.

Não perdia um só programa de forró, que ouvia bem cedinho com ouvido bem coladinho no “ráidinho” “consola corno”.

Tinha devoção pelo “hômi”.

Para ele, a Ponte Rio Niterói era menor e menos importante que o viaduto “da Xuxa”, feito na Mangabeiras só para veículos baixinhos.

Fazia questão de andar de ônibus na Fernandes Lima em horário de pico. Gostava de juntar um lixinho em casa para ver se dinheiro minava.

Aliás, sua casa parecia templo com imagem de tudo que é santo e de tudo que é digno de fé.

Adotou bigodinho, camisa listrada, ficou obcecado por automóveis... e seu sonho era comprar terrinha em Maribondo para, quem sabe, poder ficar juntinho do ídolo, pescar junto, prosear...

Na TV só via programa de “puliça” e, de uns tempos para cá, dizia que conversava com Deus, em ligação direta com o além tal qual seu líder querido.

E falava isso principalmente quando tomava uns “gorós” a mais. Aí era que conversava com tudo o que era santo, beato, orixá e patrono de romaria.

Com o “Padim Ciço”, então, era sempre ligação direta 0800, “SAC dos Céus”, verdadeiro “Disk Messias”.

Em homenagem, quando queria contato com o santo padre do Juazeiro do Norte, só tomava Montilla com Coca Cola.

Dizia que o “desáiguini” da garrafa, toda preta com cabeça branca, ajudava na comunicação divina.

Naquele domingo passou a madrugada em linha direta com o além. Ou seja, começou a “entornar” no sábado de tarde, vendo a final da Série C e comemorando cada drible e cada passe magistral do “galo”.

Diante do resultado em Joinville, não deu outra. Mergulhou no barril de cachaça por emoção de ver o time na série B e por ira diante do desempenho do plantel alvirrubro.

Foi a madrugada inteira assim.

Até que um grande amigo seu, assíduo na corretagem de automóveis, o avisou do novo feito de seu profeta.

E aí “Cabavéio” endoidou. Tinha que copiar a moda “prumóde” ficar que nem o “hômi”.

E lá se foi nosso herói.

Domingo de manhã, dia de sol e de praia, caminhões e ônibus carregados de “turistas” no mirante da Sereia.

“Cabavéio” entrou em sua Pampa 84 GLXYZ, especialista em carreto da Bomba da Marieta.

No “ráidio”, topado, o hit de seu cantor mais “joiado” que o Rei Roberto, mais essencial que Luiz Gonzaga. Foi do Vergel até a praia do Mirante ouvindo no último volume o clássico do forró chamado “Locadora de Mulher”.

“Cabavéio”, mais troncho que cara de gente safada, judiava da Pampa. Era adrenalina pura.

Virou à direita dando cavalo de pau na entrada da Sereia. Estava a mais de 120 por hora. A Pampa toda lascada cantou pneu e, quem nem em filme de ação, arrebentou barraca de petisco e foi parar na areia da praia.

Ciço de Nazaré acelerou. Se seu mandatário podia, ele não iria ficar para trás.

Iria, montado na Pampa do tétano, passear na areia da Praia da Sereia e, de carro, subir nos arrecifes para tomar umas e outras aos pés da Iemanjá de gesso, gigante.

Foi um labafero.

Banhistas correndo em fuga, bóias de câmaras de ar de caminhão cheias e lançadas para o alto em desespero, chuva de galeto e farofa pelos ares.

Desespero total de uma multidão em correria, para não ser atropelada pela Pampa malhada, com mais massa que parede de bombardeio, com mais remendo de tinta que cara de palhaço.

Ciço de Nazaré foi parar dentro da água, cheio de aguardente, quase morrendo afogado. Foi retirado do carro por salva-vidas e, da areia da praia, viu o carrinho submergir.

“Mosés” só tinha um em Alagoas. O mar do litoral norte só se abrira para o escolhido.

Cabavéio estava feliz. Tinha se igualado a seu mestre.

Saiu cambaleante pela AL 101 Norte, cantarolando “Locadora...” e “Muda Maceióóó...”

Na segunda foi capa de jornal, e motivo de chacota em toda a cidade.

Mas não estava nem aí.

Passaria a Pampa molhada para a frente porque, similar a seu idolatrado, já estava de olho numa Belina 87 transformada em utilitário na rua Cabo Reis.

E em homenagem ao “hômi”, a Jatiúca, a Ponta Verde e a Pajuçara que o aguardassem.

Afinal, quem estava no comando era Jesus Cristo.


 

 

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