Não era regateano doente. Era regateano contagioso, epidêmico, viral.
“Morava” na Pajuçara, literalmente. Tinha casa na Ponta da Terra, mas passava mais tempo no estádio Estádio Severiano Gomes Filho do que no recesso caseiro.
Não perdia uma só apresentação do galo.
Só vestia vermelho.
Batizou o filho com nome de “cracasso” do time: Joãozinho Paulista da Silva.
Este era o Manoel da Silva.
Nome curto.
Coragem também.
Não é que dizem que era frouxo. Era mole mesmo. E Zuleica, a cônjuge, se “aproveitava” da “preguiça” de brios do marido.
E como se aproveitava a Zuleica!
Mané evitava ver e se esquivava de “polemizar”. Levava a vida assim, com medo de levar tromba de algum “amigo” da cara metade.
E na Série C, a esposa foi de A a Z na “costura para fora”.
Sim, porque CRB roxo, o Mané não perdia um jogo.
E era só ele sair de casa para assistir partida com a camisa da última participação do “galo” na Série A, em 1981, para a mulher se esbaldar em lhe colocar grandes e impiedosos pares de Série “G”.
De “gaia” mesmo.
Durante todo o campeonato, foi assim. Teve de tudo: do padeiro, ao açougueiro, ao quitandeiro. Haja eeeeeiro!
O cobrador da linha Santuário – Pontal também “marcou presença” em campo e dizem as más línguas que, em homenagem ao marido, até gandula do estádio se deu de bem.
Enquanto isso o Mané nada fazia. O versão extra oficial era de que sabia de tudo. Mas, molenga que era, dizia que tudo era “intriga de azulino recalcado”.
E foi assim o ano interinho da terceira divisão.
Paysandu, América, Luverdense, Joinville... cada avanço do galo era uma “ponta” nova na cabeça do Mané.
Isso perdurou até as etapas finais do "brasileirão". Até quando o “dream team” já estava classificadíssimo e já era quase “campeão”, se não para valer em real e oficial, já valendo na moral do futebol alagoano.
No sábado de treino do galo, um dos últimos antes que o time dos sonhos se desfizesse, o “Gatorade” foi trocado por cerveja entre os atletas. E como Mané era “de casa”, biritou até no vestiário em comemoração ao desempenho histórico do plantel.
Saiu da toca da Pajuçara já de noitinha. Foi para casa meio “trêbado”.
E quando entrou, viu o que não queria.
Na sala, de macacão todo azul, o Jorge Alicate, conhecido funcionário de empresa de telefone e TV a cabo e renomado em “gatonet” em todo o triângulo Poço – Jaraguá – Ponta da Terra, “instalava” um “ponto extra” no quarto da madame.
Jorge Alicate, de destemor alardeado na região, fama de batedor implacável, acostumado a dar desacerto, mestre em capoeira e com cara fechada de homem mau.
No quarto, a cena era óbvia: ela, de camisolinha transparente, ele, de macacão entreaberto, suado e cara de cansado.
Finalmente o Mané se deparara com a prova do crime. Se não com a prova, com indício forte!
Era a hora de lavar a honra de corno manso, de corno cuscuz. Daquele que sabe e “abafa” tudinho.
Mas o CRB era campeão, ou quase. O que importava a "presença" e o "serviço" do Jorge Alicate?
Quando abriu a porta e viu o casal já nos “finalmente” da “instalação”, Mané “pegou ar”.
Botou cara feia, franziu a testa, estufou o peito, fez anúncio de esporro de cabra macho “virado na bobônica serena da febre do rato”.
Até que enfim, iria dar cabo a uma revolta que já era coletiva em virtude de sua cornice silente.
Chutou a porta e deu um grito de ira e de revolta, sonoro, raivoso sanguinolento!
- Eeeeeitcha fardinha de cor saaaaaaafaaaadaaaaaaaaaaa!
Era o máximo de agressividade que sua covardia lhe permitia esboçar.
E ainda deu um abraço caloroso no Jorge, que nada entendeu da reação do marido traído. Aperto de alegria, logo depois explicado:
- Agora vou poder assistir a reprise de CRB e América Mineiro, CRB e Havaí na Série B do ano que vem, no quentinho do quartinho, juntinho com a minha “totosa”.
Saiu do quarto e foi para a cozinha.
Voltou com duas "latinhas" na mão.
Queria prosear e saber como contatar o call center da companhia para fazer a sugestão de trocar o tecido do fardamento da empresa de telefonia e televisão, hoje da cor do CSA.
- Por que não uma roupa toda em "encarnado", da cabeça aos pés? Perguntava com cara lisa.
Macacão vermelho todo de pastoril, de CRB... e do sangue que não lhe subia pelas veias.
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