A comunidade é pobre, ou como gostaria os politicamente corretos, é “economicamente vulnerável”. Aí precisa construir casas, mas não tem recursos. Arrecadam-se os materiais, mas falta a mão de obra para os trabalhos de fazer concreto e colocar tijolo sobre tijolo. Qual a solução paliativa para este problema? Fazer mutirões para erguer paredes e habitações.
O ex-Ministro da Saúde José Serra, quando assumiu o posto no governo Fernando Henrique Cardoso, percebeu o óbvio: parcela da população, em especial a mais carente, não tinha (e hoje pouco ainda tem!) acesso à atendimento básico. Qual solução emergencial foi adotada? Realizar mutirões de saúde em todo o país.
A população está endividada e o comércio precisa vender. Muitos consumidores inadimplentes querem ter acesso a crédito, mas estão com nome “sujo” na praça, não os “limpando” ou por falta de dinheiro para arcar com juros por vezes abusivos, ou por mero desconhecimento do trâmite necessário. Qual a solução mediana executada? Promover mutirões de retirada de nomes dos cadastros negativos como SPC.
Paliativo, emergencial, mediano.
Um mutirão é e deve ser exceção, não uma regra.
Um mutirão deve ser episódico, e não permanente.
Um mutirão tem que ser feito uma única vez a fim de que não mais precise mais ser feito.
Nunca mais!
É a praga do mutirão, “vendida” a todos nós como dádiva e benefício.
Pois bem, esta praga chegou a nosso Judiciário, nacionalmente.
O intuito de desafogar Varas e Comarcas e imprimir maior celeridade à Justiça alagoana é nobre, merece respeito, apoio e nossa acalorada contribuição. Que nosso Tribunal de Justiça conte conosco nesta luta!
E entre as ações que vem sendo feitas a fim de ser alcançar este ideal temos os mutirões.
Reforcemos: mutirão não deve ser constante. Por ser sinal de uma anomalia e de uma falta, e por ser indício de que algo não anda bem e precisa ser remediado, ele precisa ser executado somente como corretivo e remendo rumo à real correção do problema alvo.
Ora, o ideal é que tivéssemos uma Justiça tão seriamente rápida que dispensasse por completo a realização de mutirões.
O que queremos não é Justiça em migalhas. Queremos Justiça por completo.
E o pior é que entre os mutirões ofertados como “grande iniciativa” do Judiciário (em todo o país, ressalte-se), alguns em nosso estado alguns vêm pecando em termos de organização, de atendimento eficaz e justo, e de respeito às prerrogativas dos advogados. Alguns vêm prestando um desserviço à sociedade!
Que fique claro: não somos contra os mutirões do Judiciário alagoano e acredito que os advogados de Alagoas apóiam estas ações enquanto pontuais.
Mas a OAB/AL tem toda a razão quando pede a suspensão dos mutirões que o TJAL realiza para julgar processos dos Juizados Especiais.
E por que? Porque nestes mutirões ocorre uma série de afrontas à sociedade e à advocacia. Antes de trazer benefício, por vezes estes causam constrangimento e impedem o livre e fundamental império da Justiça.
Em alguns destes mutirões falta estrutura adequada para atendimento digno à população; as audiências são agendadas de forma nocivamente apressada e sem critério com advogados sendo intimados para dezenas de audiências em simultâneo; algumas destas audiências de instrução chegam ao absurdo de serem realizadas sem a presidência de um magistrado; e ainda há magistrados que “pressionam” as partes e os advogados para que não sejam arroladas testemunhas nem sejam feitas oitivas.
É “mole”?
Sem contar inúmeros flagrantes de desrespeito às prerrogativas dos advogados que chegam ao conhecimento de nossa Comissão de Defesa das Prerrogativas da OAB/AL.
Confiamos no honrado presidente do TJAL, Desembargador Sebastião Costa, e acreditamos que magistrado de conduta irretocável que é ele não compactuará com esta “metodologia” prejudicial de trabalho.
Na OAB estamos à disposição para colaborar e, inclusive, esta é a intenção de todos que compõem a Ordem representados por nosso presidente Omar Coelho. Queremos debater o assunto para encontrar saídas e melhorias.
Mas o que queremos, definitivamente, é fazer com que possamos atingir um nível que dispense qualquer forma de mutirão em nossa Justiça.
Queremos que os processos tramitem com imparcialidade, respeito e celeridade, sem precisarmos recorrer a soluções “tampão”. Mais ainda quando constatamos que estas violam direitos, imprimem uma sensação de justiça pela metade e revelam, sem realmente corrigir, a precariedade de nosso Judiciário.
Melhor seria termos casas construídas por operários bem remunerados, atendimento médico e universal para todos e um sistema de crédito menos punitivo e mais transparente para o consumidor.
Melhor seria termos Tribunais respeitosos quanto aos prazos, mais atentos quanto aos direitos básicos e mais preocupados com a qualidade, presteza e caráter social de seus serviços.
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