Quando se deu por si, já estava na estação do Conjunto Habitacional Brinquedo do Cão 69.

Ela toda de tubinho vermelho, salto alto preto, cabelão loiro do Tchan, “bundão” e “coxão”... irresistível!

Um colosso de gostosura estava a Zefinha!

Morava no conjunto que ficava depois do Benedito Bentes, depois do Selma Bandeira, depois do Carminha, depois do Luiz Pedro MCDXLIV, depois do aterro sanitário, depois da fazenda, depois da usina, depois do depois, depois “iapois”... lá era sua morada.

E era terreno de grota, “visse”! O conjunto foi feito num buraco tão grande e tão profundo que seu vizinho era um cara esquisito, todo vermelho, de rabo, chifrinho e garfão...

Achou estranha a estação de trem. Estranha demais!

Todo dia eram 3 horas de ônibus, quando conseguia pegar um. Isso para chegar às 7 horas na casa da patroa, na Ponta Verde. Tinha que acordar de madrugada e sofrer para percorrer, inteirinha, a (In)Fernandes Lima de ponta a ponta.

Mas naquele dia tinha uma estação de trem futurista na sua porta, com ar condicionado, escada rolante, TV de “prasma” gigante passando show do Amado Batista e tudo mais... estação folgada, limpa e cheirosa... era demais!

Foi até a plataforma passando pela catraca. Não precisava de dinheiro, nem de vale transporte. Era só olhar o sensor e deixá-lo reconhecer sua íris, no olho a olho, e a roleta era liberada.

Ainda era escuro, estava amanhecendo. Quando avistou vinha um trem gigante há uns 500 quilômetros por hora.

O condutor-maquinista era um senhor barbudo, de túnica branca e cabelo logo. Cara de piedade e ternura. Estava com a testa sangrando, com uma “tiara” de mandacaru, mas era “cada um na sua”, pensou a Zefa. O seu assessor era um velhote de cabeça branca e roupão preto, parecia uma batina!

Entrou no trem! Um luxo só!

Tinha até “vêéletêmoça”, como chamavam. Cafezinho, lanche, suco, leite quente, serviço de bordo que nem de novela.

Zefinha gostava mesmo era da “purinha”, de “meiota” com caju e cajanara. Nem acabou de pensar, já veio a “vêéletêmoça” com a garrafa de Pitu e os aperitivos amarelos, fresquinhos. Tomou uma de desjejum e jogou o resto no chão, para o santo!

Viajar de pé? Nem pensar. O trem tinha cama e tudo mais.

E como corria! Da estação do Conjunto Brinquedo do Cão 69 até a Fernandes Lima foram 3 segundos.

Mas ainda deu para ver “homens e máquinas” que davam “duro” madrugada afora instalando equipamentos no solo do canteiro da avenida, para mais uma linha do fantástico trem.

Viu também que o piloto do teste do veículo leve que andava sobre os trilhos era o Papai Noel com suas renas e tudo mais.

Que emoção! Era gamada no "bom velhinho"!

Era inacreditável, mas como estava “totosa” demais a sofrida mulher! Suas curvas chamavam atenção no vagão de primeiro mundo, parecia o salão da Estação Espacial Internacional.

Porém, não veio nenhum marmanjo com “mão boba”, nem esfregão, "rela rela", nem nada!

Até que a Zefinha estava afim de uma “amulegadazinha”, queria variar do bafo do Tião, seu “cumpanheiro” há 30 e poucos anos e incontáveis “manguaças”... mas todos nos trem estavam concentrados na viagem.

Num piscar de olhos estava na porta da patroa, em plena Ponta Verde. Nossa que, fantástico!

E não teve engarrafamento, nem atraso, nem nada! O vagão era geladinho, fofinho... Não tinha pedinte nem cobrador abusado!

Parecia coisa dos “istrangêro” mesmo.

Quando saiu do trem, o senhor de túnica branca fez uma aceno abençoado e o velhote de preto abanou um chapéu com sinal da cruz.

E mais, o trem era silencioso... não tinha auto-falante com ninguém falando lorota na rádio, nem ouvindo sertanejo, forró, Roberto Carlos... nada!

Uma “vêéletêmoça” lhe ofereceu um fone de ouvido e numa tela Zefinha poderia escolher o que ver e a que assistir durante o percurso. Passou o trajeto inteiro se deliciando com o CD dos “Mentirosos do Forró Volume 5”, ao vivo em Maribondo!

Deu três passos e tropeçou!

Caiu no chão!

Foi quando acordou!

Era tudo um sonho!

Morta de cansada ela estava e já eram 7 e meia da manha.

Ainda se encontrava parada em frente ao CEPA. O trânsito congelado, buzinaço e tudo mais.

Na verdade tinha cochilado em pé no ônibus da linha Benedito Bentes – Ponta Verde via Fernão Velho, Garça Torça e Conjunto Brinquedo do Cão 69. Iria chegar, de novo, atrasada.

Era esporro da patroa na certa!

O “busão” estava tão cheio que dava para dormir em pé, sem cair. Tinha uns 30 homens só “acochando” a pobre da diarista. E olha que a mulher, já na casa dos 50 anos, era uma mistura da “cantora” (?) Preta Gil com a judoca Ednancy Silva.

E o que a tinha despertado do sonho bom foi uma freada do motorista e um canivete de um ladrão, que apertava seus “quartos” pedindo sua carteira e seu celular "lanternight".

A (In)Fernandes Lima travada! O ônibus parecia uma sauna dentro do lixão! Tudo fedia e aquele cheirinho azedo subia quente nas "venta" da Zefinha.

Todo dia era assim!

Mas Maceió havia “mudado”.

Em nome de Jesus Cristo e do "Padim" Padre Cícero.
 

 

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